26 Julho 2016
A demonstração de força organizada não foi capaz de barrar o retrocesso em conquistas históricas dos movimentos sociais negros e feministas. Assim, continuamos em marcha.
A reportagem é de Djamila Ribeiro, publicada por CartaCapital, 25-07-2016.
Em 25 de julho é comemorado o Dia Internacional da Mulher Negra Latino Americana e do Caribe. Em 2016, a data será marcada por outra Marcha das Mulheres Negras, em diversos estados.
Eis o manifesto:
O Brasil - como os demais países latino-americanos de tradição escravocrata e colonialista – segue enfrentando as mazelas do racismo estrutural e estruturante de nossa sociedade.
Apesar dos frágeis regimes democráticos instaurados no continente americano após período escravocrata, nunca se assegurou aos negros condições de igualdade com os não-negros. Por isso, lutamos há séculos em condições desiguais para sobreviver e conquistar a cidadania.
Depois de 300 anos de seu assassinato, finalmente em 1995 Zumbi foi oficialmente reconhecido como um herói nacional pelo governo brasileiro.
Desde então, os movimentos sociais feministas e antirracistas reivindicavam a criação de órgãos de governo que tratassem de políticas específicas para essa parcela que representa mais da metade da população brasileira. Mas só em 2003 conquistamos a criação da Secretaria de Política para as Mulheres (SPM) e da Secreta ria da Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR), ambas com status de ministérios.
No cenário da atual crise financeira internacional, o capitalismo evidencia seu descontrole e avidez por mais e mais lucros, buscando jogar nas costas dos que estão na base da sociedade o alto custo da crise causada pela ciranda financeira.
No quadro social brasileiro, ainda temos uma baixa qualidade de vida da mulher negra, verificada em cada indicador econômico ou social produzido pelo Estado brasileiro. Essa situação tem provocado, de maneira preocupante, o êxodo de mulheres negras, indígenas e afro indígenas, imigrantes e refugiadas, devido ao “progresso” da demarcação de terras pela elite agrária brasileira, além de crises sócio econômicas e culturais ao redor do mundo.
A violência nas sociedades afetadas pelo racismo patriarcal heteronormativo atinge de maneira desproporcional as populações negras, com forte marca do sexismo e das fobias LGBT.
Apesar do empenho nas últimas décadas em ações de diminuição das desigualdades sociais e de enfrentamento da violência contra a mulher, essas não impediram o aumento de 54.2% em assassinatos de mulheres negras entre 2003-2013, o aumento do encarceramento feminino e a continuidade das violações de direitos das mulheres negras, em conflito armado e guerras civis não declaradas.
O recrudescimento do racismo e o modelo de desenvolvimento social e econômico no Brasil e no mundo impactam profundamente a vida das mulheres negras, indígenas e afro indígenas, imigrantes e refugiadas.
[...]
Casos como o de Luana Barbosa dos Reis, vitimada pelo Estado por ser uma mulher negra e lésbica, assim como o da haitiana ferida em atentado xenofóbico contra imigrantes negros, em agosto de 2015, na Baixada do Glicério (região central de São Paulo), demonstram o quanto o genocídio da nossa população se aprofunda de diversas formas: machismo, LBTfobia, xenofobia e racismo andando de mãos dadas no Brasil.
Nós, mulheres negras, temos participado dos grandes momentos da luta antirracista em nosso país. Estivemos presentes na Marcha Zumbi dos Palmares – contra o Racismo, pela Igualdade e a Vida, que reuniu cerca de 30 mil pessoas em Brasília, e nas duas outras realizadas para comemorar a vitoriosa Marcha Zumbi dos Palmares, levando nossas reivindicações específicas enquanto mulheres e negras.
Em 2015, passados vinte anos do reconhecimento de Zumbi dos Palmares e da morte da grande liderança feminina negra Lélia Gonzalez, as mulheres negras brasileiras tomaram para si a ação política sob a forma de presença organizada nas ruas.
E no dia 18 de novembro de 2015 realizaram, em Brasília, a Marcha das Mulheres Negras – Contra o Racismo, a Violência e pelo Bem Viver, que reuniu cerca de 50 mil mulheres de todos os recantos do Brasil.
Em São Paulo, em 25 de julho de 2014, Dia Internacional da Mulher Negra Latino Americana e Afro Caribenha e Dia Nacional de Teresa de Benguela, mulheres negras de diferentes segmentos da sociedade se juntaram e realizaram o lançamento oficial da Marcha das Mulheres Negras 2015.
[...]
Marchamos pela retomada da luta por cotas nas universidades estaduais paulistas, como política de reparação histórica.
Lutamos contra a morte da juventude negra por parte da polícia militarizada.
Denunciamos o higienismo social e a omissão, que sobretudo no inverno, atinge principalmente a população de rua, causando mortes.
Estamos em marcha.
No dia 25 de julho de 2016 voltamos a ocupar as ruas:
• Em defesa da democracia e contra o Golpe: Fora Temer!
• Pela luta intransigente contra o racismo e a discriminação, independentemente da raça, etnia e/ou nacionalidade;
• Pelo fim do machismo, do racismo, da lesbofobia, da transfobia, da intolerância religiosa, da xenofobia, e do preconceito e discriminação de qualquer natureza;
• Pelo fim da pobreza;
• Contra a retirada de direitos e a precarização ainda maior do trabalho, por mais emprego, melhores salários e igualdade salarial para as mulheres negras;
• Contra a exploração sexual das crianças e adolescentes;
• Contra todas as formas de violência, racista e machista e homofóbica: física, verbal e psicológica;
• Contra o genocídio da juventude negra e periférica;
[...]
• Pelo empoderamento das mulheres negras, indígenas e afro indígenas;
• Contra o higienismo social e a gentrificação
• Por mais poder político para as mulheres negras, indígenas e afro indígenas, imigrantes e refugiadas;
[...]
Leia a noticia completa aqui
Os filhos de Israel gemiam sob o peso da escravidão, e clamaram;
e do fundo da escravidão, o seu clamor chegou até Deus.
Deus ouviu as queixas deles e lembrou-se da aliança que fizera com Abraão, Isaac e Jacó.
Deus viu a condição dos filhos de Israel e a levou em consideração.(Ex 2, 24-25)
Leia-o e deixe que ele ecoe em você.
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Manifesto pelo Dia Internacional da Mulher Negra - Instituto Humanitas Unisinos - IHU