A irmã dominicana Nancy Murray, cujo irmão Bill Murray estrelou no filme Caça-Fantasmas (“Ghostbusters”) original, é ela própria uma atriz consagrada, tendo interpretado a vida de figuras importantes do catolicismo como a Irmã Catarina de Siena e a Irmã Dorothy Stang.

A reportagem é de Mark Zimmermann, publicada por Crux, 16-07-2016. A tradução é de Isaque Gomes Correa.

Quando for assistir o novo filme do Caça-Fantasmas, a irmã dominicana Nancy Murray planeja vestir uma jaqueta dos caça-fantasmas.

Esta irmã não é apenas mais uma fã nem será uma jaqueta qualquer que ela vestirá, pois Murray é a irmã mais velha de Bill Murray, ator que interpretou um dos caçadores de fantasmas original na comédia clássica de 1984; ela planeja vestir uma jaqueta dada ao elenco e aos demais membros envolvidos nas gravações do original, peça que o seu irmão acabou lhe presenteando.

Entrevistada pelo sítio eletrônico Crux pouco antes do lançamento do filme em 15 de julho, a Irmã Murray disse que estava ansiosa para ver o elenco de quatro mulheres engraçadas assumido os papéis principais dessa vez, além de tecer algumas reflexões sobre a versão original.

“Eu adorava a música, a história é simplesmente sensacional”, disse, brincando ela às vezes ficava um pouco nervosa no começo das comédias de seu irmão famoso. O filme daqueles quatro investigadores paranormais de fantasmas penetrou na casa da irmã não porque aí tinham espíritos habitando, mas por causa do ânimo que havia em seu agregado familiar.

“Eu pensei: esta cena se parece com a nossa mesa de jantar”, disse ela.

Murray descreveu as discussões e as brincadeiras entre os personagens do filme de 1984 como se estivesse rememorando histórias dos jantares que tinham em família, com o pai, Edward Murray, vendedor de madeira, a cortar a carne e passando purê de batatas e outros pratos às nove crianças sentadas ao redor da mesa e, em seguida, presidindo o que acabaria sendo uma rodada de comédia em família.

De acordo com a irmã, sua mãe Lucille Collins Murray, a que colocava ordem na casa, certificava-se de que as crianças mais introvertidas tivessem voz e vez para se manifestar, juntamente com os extrovertidos.

“Aquela mesa de jantar foi o nosso primeiro palco”, disse Murray, um dos cinco irmãos cujo trabalho de vida gira em torno da atuação cenográfica. 

A Irmã Murray entrou para as Irmãs Dominicanas (“Adrian Dominican Sisters”) a 50 anos atrás. Ela própria é uma atriz consagrada, tendo viajado os EUA e o mundo apresentando um espetáculo baseado na vida da Santa Catarina de Siena.

O seu irmão mais novo, Bill Murray, e o seu irmão mais velho, Brian Doyle-Murray, estrelaram no famoso clube de comédia de Chicago conhecido como Second City, depois ganharam a fama como participantes do programa [televisivo de comédia] “Saturday Night Live”, e estrelando também em comédias como Clube dos Pilantras, Os Fantasmas Contra-atacam e Feitiço do Tempo. Os irmãos mais novos, John e Joel Murray, também atuaram em inúmeros filmes e programas de tevê.

A mesa de jantar dos Murray serviu de laboratório para os futuros comediantes e atores da família, disse a irmã, notando que o pai “não contava piadas. Ele fazia mais piadas práticas. Ele imitava a gente fazendo beiço, ou choramingando…”. 

O irmão Brian também era um grande contador de histórias.

Aquelas refeições em família sempre duravam, no mínimo, uma hora, entre começar e conversar. Segundo a religiosa, as crianças do bairro ficavam olhando às vezes pela janela para ver quando os seus amiguinhos ali dentro, os cinco Murray, sairiam para brincar.

Os Murray tinham um motivo prático para se alongar nas refeições, disse ela, observando que “se alguém quisesse ser o primeiro a se levantar da mesa, teria de ser o primeiro a começar a lavar os pratos”. 

O fato de a Santa Catarina de Siena ser de grande família também ajudou com que Murray contasse a sua história nos palcos. Santa Catarina, membro leiga da ordem dominicana, era o 24º filho de seus pais, na Itália do século XIV.

A santa não tinha educação formal, mas a profundidade de seus escritos espirituais a levou a ser considerada Doutora da Igreja. Ela também ficou conhecida por servir pacientes em estado terminal e prisioneiros no corredor da morte. Convenceu o papa a trazer o papado de volta a Roma depois de décadas existindo na França.

A peça de teatro chama-se “Catherine of Siena: A Woman for Our Times” [Catarina de Siena: uma mulher para os nossos tempos]. Segundo Murray, a vida da santa demonstra que “Deus tem o poder de transformar as pessoas”.

“A vida de Santa Catarina também apresenta uma lição importante para as famílias de hoje”, acrescentou a religiosa, notando que o fato de ela crescer numa família deu à futura santa “um campo de treinamento para a vida. Isto vale para todos nós (…). Todos os santos começaram com uma família, e não houve ninguém perfeito”.

Ela espera que a peça de teatro dê às pessoas a esperança de encontrar a bondade em suas próprias famílias.

A religiosa disse que a forma como a santa desafiou os líderes eclesiásticos de seu tempo traz um exemplo de liderança que, segundo ela, o Papa Francisco tem demonstrado. 

“Não deixar o ego ficar no caminho do serviço”, disse. “Se somos chamados a ser líderes, é para estarmos a serviço, não exercendo um poder sobre as demais pessoas, mas para elas, capacitando-as a serem o melhor de si mesmas”.

Murray é fã do Papa Francisco, quem, em sua exortação apostólica recente sobre o matrimônio e a vida familiar, Amoris Laetitia, exaltou a importância das refeições em família, valor que os Murray compartilham.

“Ele vem sendo um exemplo para todos os filhos de Deus (…) Ele realmente quer caminhar com o povo”, disse ela, acrescentando que o papa “está adaptando de fato a cultura do século XXI” através do emprego das mídias sociais para difundir o Evangelho de Jesus no mundo de hoje.

Murray vem tentando fazer o mesmo em sua vida de religiosa, porém utilizando a arte dramática em seu ministério. Ela já fez quase 800 apresentações da peça sobre Santa Catarina, em auditórios paroquiais e escolares, universidades, igrejas e em outros ambientes em todo os EUA, e em quatro continentes, incluindo em espanhol para 1.500 pessoas num teatro em Madri durante a Jornada Mundial da Juventude.

Ela tenta fazer cada performance diferente das anteriores, pesquisando algo sobre o público que irá assisti-la de forma que os presentes possam notar o quão suas vidas se parece com a vida de Santa Catarina.

“Sou da Ordem dos Pregadores. Vejo este ministério como uma nova forma de pregação”, afirma a irmã dominicana.

Enquanto estudava teatro na Barry University, instituição pertencente à sua ordem religiosa localizada em Miami, na Flórida, a religiosa apresentou a peça “Fiddler on the Roof” [Violinista no telhado]. Depois de “me formar na faculdade, pensei que iria ser professora de teatro pelo resto de minha vida”.

Mais tarde, conquistou o título de mestre em estudos pastorais pela Universidade Loyola, em Chicago, e incorporou a arte cênica e a teologia em seu ministério enquanto irmã dominicana, inclusive quando serviu durante 15 anos como agente pastoral e ministra jovem numa paróquia predominantemente latina em Chicago, a Paróquia de St. Sylvester, onde deu início ao VIVA El Teatro, programa de teatro voltado aos jovens, e para onde trazia atores do Second City para trabalhar com os adolescentes e jovens.

Nos últimos anos, Murray já apresentou cerca de 50 vezes uma peça de teatro sobre a vida da Irmã Dorothy Stang, irmã da Congregação de Notre Dame de Namur, assassinada em 2005 na floresta amazônica em sua porção brasileira, onde lutava pelos direitos dos pobres e para evitar a destruição do ecossistema. Estes dois temas são centrais na encíclica papal de 2015 intitulada Laudato Si’ (Sobre o cuidado da casa comum).

“Estamos todos conectados”, disse Murray sobre o trabalho destas irmãs em proteger o meio ambiente e a servir os pobres. Ela também se aproxima da Irmã Stang porque esta também veio de uma família de nove filhos.

Quanto ao novo Caça-Fantasmas, Murray disse concordar com o seu irmão, que participou do “Ghostbusters” original, em que aquelas quatro mulheres assumindo os papéis principais – Melissa McCarthy, Kristen Wiig, Kate McKinnon e Leslie Jones – são todas ótimas comediantes dignas de reprisar o filme, que já é um clássico.

E mais: Murray está feliz ao ver mulheres emancipando-se em papéis de liderança, exatamente da mesma forma como fizeram as religiosas pioneiras que ela interpreta no palco. Nesse sentido, o famoso refrão da música-tema dos Caça-Fantasmas vem a calhar: “Quem você vai chamar?”