13 Julho 2016
"O catolicismo continua sendo, ao menos no Ocidente, o adversário mais forte e de maior autoridade contra a inclusão dos homossexuais na cidadania democrática."
A opinião é do sociólogo italiano Marco Marzano, professor da Universidade de Bérgamo, em artigo publicado no jornal Il Fatto Quotidiano, 11-07-2016. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
De retorno da Armênia, questionado por uma jornalista que lhe pediu para comentar uma afirmação do cardeal Reinhard Marx, o papa voltou a falar sobre a atitude da Igreja para com os homossexuais, repetindo, com um pouquinho de consciência autocomplacente, a feliz frase: "Quem somos nós para julgar?" e acrescentando que a instituição religiosa da qual ele é o chefe deveria pedir perdão aos homossexuais.
O objeto e a modalidade do perdão não foram definidos com precisão. Em compensação, o papa, nada menos do que duas vezes, como muitas vezes acontece em ocasiões semelhantes, fez referência ao Catecismo católico, para assinalar implicitamente que essas frases que pareciam, a quem o ouvia, como novidades sensacionais, na realidade, derivavam diretamente da tradicional doutrina católica.
Se formos ler o Catecismo promulgado por João Paulo II em 1992, descobrimos que, ao tema em questão, são dedicados os artigos 2.357, 2.358 e 2.359. No primeiro, a homossexualidade é definida como um fenômeno cuja "gênese psíquica continua em grande parte por explicar", as relações entre pessoas do mesmo sexo são julgadas como "atos intrinsecamente desordenados", "contrários à lei natural", que "fecham o ato sexual ao dom da vida", que "não procedem de uma verdadeira complementaridade afetiva sexual" e que, em caso algum, podem ser aprovados.
No posterior (e é precisamente a este que o papa se referia na conversa com os jornalistas), lê-se que "um número considerável de homens e de mulheres apresenta tendências homossexuais profundamente radicadas. Essa propensão, objetivamente desordenada, constitui, para a maior parte deles, uma provação. Devem ser acolhidos com respeito, compaixão e delicadeza. Evitar-se-á, em relação a eles, qualquer sinal de discriminação injusta. Essas pessoas são chamadas a realizar na sua vida a vontade de Deus e, se forem cristãs, a unir ao sacrifício da cruz do Senhor as dificuldades que podem encontrar devido à sua condição".
O artigo 2.359, por fim, convida os homossexuais a se absterem categoricamente da vida sexual.
Como era previsível, o papa tinha razão: no Catecismo, encontra-se uma referência precisa aos conceitos evocados na coletiva de imprensa. Mas eles devem ser retamente entendidos. A compreensão, o respeito, o acompanhamento pastoral e até mesmo o perdão pelas "injustas discriminações", que, de acordo com Francisco, devem prevalecer dentro da Igreja em relação aos homossexuais não são acompanhados, de modo algum, pelo reconhecimento de qualquer legitimidade às suas tendências sexuais.
Em outras palavras, a homossexualidade, no Catecismo aprovado por Karol Wojtyla e referido por Jorge Mario Bergoglio, é uma espécie de doença, uma condição dolorosa e, por sua natureza, infeliz, merecedora de se tornar objeto de tratamento, de ser olhada pelos pastores católicos com compaixão e respeito, com toda a piedade que deve ser usada para com indivíduos afligidos por um distúrbio pelo qual não são responsáveis, por um mal do qual não têm culpa.
Nessa visão, um gay ou uma lésbica pode até se tornar um herói ou uma heroína, se se mostrasse capaz de manter longe e de reprimir todo desejo sexual, de domar, com a castidade absoluta, aquela vocação ao erro e ao pecado que, infelizmente, por razões misteriosas, coube-lhe por destino.
Os pastores católicos, de acordo com a doutrina da Igreja e de acordo com o papa, que a segue fielmente, podem e devem ajudá-los nisso (a sufocar os próprios anseios carnais) e certamente não a viver serena e felizmente a própria sexualidade.
Nada de novo sob o sol do catolicismo: nada que contradiga o claro fechamento aos homossexuais do recente Sínodo da família, nada que invalide a maciça mobilização contra os direitos civis de gays e lésbicas realizada pela hierarquia e por uma parte do povo católico de todas as latitudes.
O catolicismo continua sendo, ao menos no Ocidente, o adversário mais forte e de maior autoridade contra a inclusão dos homossexuais na cidadania democrática. O Papa Francisco, favorecendo uma tendência profunda do seu pontificado, busca ressaltar os aspectos compassivos, de cuidado, por assim dizer, afetuosos do magistério católico, sem nunca negar explicitamente a validade ou, melhor, às vezes, até confirmando-a, de todos aqueles que permanecem na sombra: o julgamento severo, a condenação, a inferiorização e a exclusão.
Mudar de linha nesse campo exigiria da Igreja uma enorme coragem, porque a forçaria, em primeiro lugar, a fazer as contas com as tendências sexuais de uma boa parte do clero, como nos contou novamente nesses dias o ex-monsenhor Krzysztof Charamsa, com as razões do celibato e de uma homofobia tão difundida quanto perfeitamente funcional ao governo da organização. Mas esse é outro assunto.
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A Igreja de Francisco não renuncia à homofobia. Artigo de Marco Marzano - Instituto Humanitas Unisinos - IHU