15 Outubro 2014
Desde o início do ano, o "layoff", mecanismo da legislação trabalhista que permite afastar operários da produção por até cinco meses, tem sido uma das principais ferramentas das montadoras para administrar o excesso de mão de obra e segurar empregos enquanto atravessam a zona de turbulência. Até o mês que vem, contudo, mais de 2 mil operários de linhas da Volkswagen e da Mercedes-Benz têm retorno ao trabalho previsto sem que o mercado tenha dado sinais consistentes de recuperação. Isso forçou as empresas a retornar às mesas de negociação com sindicatos para manter seus funcionários longe da produção por mais algum tempo.
A reportagem é de Eduardo Laguna, publicada pelo jornal Valor, 14-10-2014.
Na fábrica da Volkswagen em São José dos Pinhais, no Paraná, a saída foi fazer um rodízio de trabalhadores em "layoff". Ontem, uma nova turma, de 422 funcionários, teve contratos de trabalho suspensos, em substituição a outro grupo de 400 operários que acaba de voltar à produção, informa o sindicato dos metalúrgicos da região. Procurada pelo Valor, a Volks confirmou o novo programa de "layoff", mas sem abrir número de funcionários envolvidos. O objetivo, diz, é "adequar a produção à demanda de mercado".
Já na fábrica da Mercedes-Benz em São Bernardo do Campo, no ABC, mais de mil operários voltariam do "layoff" no fim do mês que vem, mas a montadora de caminhões já fechou acordo trabalhista para manter esses trabalhadores em licença remunerada até abril.
Mais de 4 mil operários estão hoje afastados das montadoras em esquema de "layoff", incluindo 930 empregados da General Motors (GM) em São José dos Campos (SP) que tiveram contratos suspensos no mês passado. A adoção dessa ferramenta no parque industrial da GM em São Caetano do Sul, no ABC, também está em discussão, conforme informações do sindicato local, não comentadas pela empresa. Ao mesmo tempo, negociações estão em curso entre o sindicato dos metalúrgicos do ABC e a Volkswagen sobre o que fazer com a volta prevista para a próxima segunda-feira de quase 800 operários afastados, desde maio, da fábrica de São Bernardo.
Além da nova rodada de "layoffs", as empresas também estão concedendo férias para ajustar o ritmo das linhas. Ontem, Renault e Volks iniciaram as férias coletivas - de dez e vinte dias, respectivamente - de suas fábricas no Paraná. Na Renault, 10 mil veículos e 12 mil motores deixarão de ser produzidos. Já na fábrica da Volks, a parada envolve o primeiro turno de produção. O sindicato dos metalúrgicos de Curitiba, porém, adianta que há planos da montadora de também dar dez dias de férias ao segundo turno a partir de 3 de novembro.
Enquanto o país não encontra soluções mais flexíveis de proteção ao emprego, as férias e os "layoffs" estão entre as alternativas adotadas pelas empresas contra demissões em massa, mas não evitaram o corte de 9,3 mil vagas nas montadoras desde o início do ano. Acrescentando nessa conta as demissões na cadeia de suprimento, mais os "layoffs", as vagas eliminadas na indústria automobilística e de materiais de transporte chegam perto de 25 mil postos, mostra o Caged, onde estão registradas as contratações e demissões do mercado de trabalho formal.
A ocupação nas montadoras já cai há onze meses seguidos (veja gráfico), numa crise que irradiou à indústria de autopeças, cujo faturamento cai 13,5% neste ano e a ociosidade nas fábricas passa de 32%, de acordo com o Sindipeças, entidade dos fabricantes de componentes automotivos. A Cummins, por exemplo, demitiu na última semana 80 funcionários da fábrica de motores a diesel em Guarulhos, na Grande São Paulo. Outra fabricante de propulsores, a MWM, cortou 179 postos de trabalho na fábrica de Canoas, no Rio Grande do Sul, segundo informações de sindicato. Nenhum porta-voz da MWM foi encontrado para comentar as demissões. A produção de veículos caiu quase 17% entre janeiro e setembro, como resultado do recuo de 9% do mercado e de 38,5% das exportações.
A indústria de veículos espera dar nas próximas semanas dois passos decisivos para poder vislumbrar um futuro mais promissor do que se mostra a triste conjuntura atual, marcada por queda de dois dígitos na produção e cortes em postos de trabalho. O primeiro vai na direção da urgente diversificação da pauta de exportações do setor, com a apresentação de uma proposta de abertura comercial com a Colômbia.
Desde o fim de agosto, a Anfavea, entidade que representa as montadoras instaladas no país, se lançou a um périplo por países com potencial de consumir veículos brasileiros para costurar novos acordos comerciais e, dessa forma, reduzir a dependência das frequentemente tensas relações com a Argentina.
O ponto de partida das "missões" da Anfavea é justamente a Colômbia. Representantes da indústria automobilística do Brasil já tiveram dois encontros com a iniciativa privada colombiana para discutir avanços num acordo comercial entre os países que estacionou no corte de metade da alíquota de importação de 35%. A ideia é encaminhar no mês que vem uma proposta aos governos.
A partir daí, a entidade vai buscar mais acordos do tipo com outros países da América do Sul, como Uruguai, Equador e Peru, além da África, para onde pretende expandir as exportações de tratores agrícolas.
No meio do caminho, também há uma negociação com o México, com quem as montadoras querem restabelecer o comércio livre de cotas, já que o acordo que colocou um teto para as transações comerciais com os mexicanos isentas do imposto de importação vence em março, após três anos. Nesse caso, contudo, mais do que expandir as exportações, o maior interesse das montadoras é poder importar novamente sem restrições os veículos produzidos por fábricas de suas multinacionais no México.
O segundo passo previsto pelo setor está relacionado à recuperação do mercado doméstico. Em entrevista coletiva à imprensa na semana passada, o presidente da Anfavea, Luiz Moan, disse aguardar até a primeira semana de novembro a aprovação do projeto de mudança no Código Civil que vai facilitar a recuperação dos veículos de consumidores inadimplentes.
A modernização da legislação para agilizar os processos de retomada do bem - hoje os bancos levam até sete meses para recuperar carros, isso quando conseguem - é tida como fundamental para melhorar o apetite das instituições financeiras pelos financiamentos a automóveis ao minimizar custos, burocracia e riscos dessa operação. A ideia é que os consumidores passem, em contrato, a autorizar os bancos a pegar de volta veículos financiados nos casos de calote.
Por enquanto, as medidas lançadas pelo governo desde julho para irrigar o mercado de crédito, com liberação de depósitos compulsórios e flexibilização nas exigências de capital dos bancos no financiamento ao consumo, mostram efeitos limitados no intuito de aquecer o consumo de veículos.
Apesar de algumas leituras positivas sobre o avanço de quase 9% do mercado na passagem de agosto para setembro, as vendas de carros no mês passado ficaram aquém das expectativas da indústria e num ritmo diário ainda baixo. A média inferior a 13 mil automóveis e utilitários leves licenciados por dia útil praticamente manteve a toada dos três meses anteriores, o que incluí um período fortemente abalado pelo esvaziamento das concessionárias com a realização da Copa do Mundo.
Em relatório publicado após a divulgação dos resultados de setembro pela Anfavea, o banco UBS avaliou que, embora a indústria dê sinais de que está perto do fundo do poço, sua recuperação deve se dar de forma apenas gradual - ou seja, não esperem grandes saltos.
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Montadoras fazem rodízio de 'layoff' - Instituto Humanitas Unisinos - IHU