24 Março 2013
O Papa Bergoglio em comparação com a herança do Papa Bento XVI: eu havia prometido que não escreveria mais sobre o Papa Francisco por alguns dias. Há um risco de saturação que deve ser evitado. Devo dizer, porém, que esse homem é verdadeiramente surpreendente.
A opinião é do cientista político e leigo católico italiano Christian Albini, em artigo publicado no blog Sperare per Tutti, 22-03-2013. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Nessa sexta-feira, de fato, ele deu um passo que, a meu ver, ele deveria enfrentar um pouco depois. No entanto, com uma certa audácia, ele se confrontou com o magistério do seu antecessor justamente sobre um dos nós mais espinhosos, aquela "ditadura do relativismo" que Joseph Ratzinger havia evocado desde a homilia da missa Pro Eligendo Pontefice do dia 18 de abril de 2005 e que foi um dos temas importantes do seu pontificado, quase como um manifesto.
É uma expressão em torno da qual se desencadearam muitas polêmicas, que remonta ao cardeal Giuseppe Siri e que entusiasmou os católicos militantes e os ateus devotos, que viram nela o repúdio de qualquer visão de mundo alternativa à católica e à civilização ocidental.
A acusação de relativismo foi usada por muitos como arma de deslegitimação, pela qual toda discordância com certas posições ético-religiosas eram rotuladas desse modo. Um uso que, a meu ver, excedeu as intenções de Bento XVI, mas que, infelizmente, contribuiu para limitar o debate na Igreja Católica e o confronto sereno com outros assuntos.
Por isso, eu fiquei surpreso ao constatar que, nessa sexta-feira, o Papa Francisco a empregou no discurso aos diplomatas credenciados junto à Santa Sé, colocando sob dura prova a sua imagem de pontífice de abertura. Devo dizer que a prova foi superada brilhantemente, porque Bergoglio deu uma leitura diferente do relativismo, que ele qualificou como "pobreza espiritual" (e se pode pensar que, no futuro, ele continuará empregando essa expressão), entendida como o ver a si mesmo e o próprio bem independentemente dos outros.
É uma leitura muito próxima do conceito de philautía (o amor exclusivo a si mesmo), próprio da tradição patrística, com a qual o Papa Francisco opera uma passagem do plano teórico ao espiritual. Ele retira daí, assim, um convite ao diálogo e à fraternidade com relação às outras religiões – e não por acaso ele citou o Islã – e aos não crentes. Instâncias que também estão no coração de Joseph Ratzinger, mas nem sempre expressadas de um modo que facilitasse o encontro.
Parece-me ver nesse modo de pensar, se não me engano, uma ênfase na pessoa (o verdadeiro bem inegociável), mais do que nos valores. Mas deixo espaço aqui para as palavras do Papa Francisco.
* * *
Como vocês sabem, há vários motivos pelos quais eu escolhi o meu nome pensando em Francisco de Assis, uma personalidade que é bem conhecida para além das fronteiras da Itália e da Europa, e também entre que não professam a fé católica. Um dos primeiros é o amor que Francisco tinha pelos pobres. Quantos pobres ainda há no mundo! E quanto sofrimento essas pessoas encontram! A exemplo de Francisco de Assis, a Igreja sempre tentou cuidar, defender, em todos os cantos da Terra, aqueles que sofrem pela indigência, e eu penso que, em muitos dos seus países, vocês poderão constatar a generosa obra daqueles cristãos que se empenham para ajudar os doentes, os órfãos, os sem-teto e todos aqueles que são marginalizados, e que assim trabalham para edificar sociedades mais humanas e mais justas.
Mas há ainda outra pobreza! É a pobreza espiritual dos nossos dias, que afeta gravemente também os países considerados mais ricos. É o que o meu antecessor, o caro e venerado Bento XVI, chama de "ditadura do relativismo", que deixa cada um como medida de si mesmo e põe em perigo a convivência entre as pessoas. E assim chego a uma segunda razão do meu nome. Francisco de Assis nos diz: trabalhem para edificar a paz. Mas não há verdadeira paz sem verdade! Não pode haver paz verdadeira se cada um é a medida de si mesmo, se cada um pode reivindicar sempre e somente o direito próprio, sem se importar ao mesmo tempo do bem dos outros, de todos, começando pela natureza que é comum a todos os seres humanos sobre esta terra.
Um dos títulos do bispo de Roma é pontífice, isto é, aquele que constrói pontes, com Deus e entre as pessoas. Desejo justamente que o diálogo entre nós ajude a construir pontes entre todos os homens, de tal modo que cada um possa encontrar no outro não um inimigo, nem um concorrente, mas sim um irmão a acolher e abraçar! As minhas próprias origens, além disso, me levam a trabalhar para edificar pontes. De fato, como vocês sabem, a minha família é de origem italiana; e assim sempre está vivo em mim esse diálogo entre lugares e culturas distantes entre si, entre um extremo do mundo e outro, hoje cada vez mais próximos, interdependentes, necessitados de se encontrar e criar espaços reais de autêntica fraternidade.
Nessa obra, também é fundamental o papel da religião. Com efeito, não se pode construir pontes entre as pessoas esquecendo Deus. Mas o contrário também vale: não se pode viver verdadeiros laços com Deus ignorando os outros. Por isso, é importante intensificar o diálogo entre as várias religiões; penso sobretudo no diálogo com o Islã; e eu apreciei muito a presença, durante a missa de início do meu ministério, de tantas autoridades civis e religiosas do mundo islâmico. E também é importante intensificar o diálogo com os não crentes, para que nunca prevaleçam as diferenças que separam e ferem, mas, mesmo na diversidade, vença o desejo de construir verdadeiros laços de amizade entre todos os povos.
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Francisco e o novo nome do relativismo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU