14 Setembro 2012
A disputa trabalhista que toma conta das minas da África do Sul se espalhou na última quarta-feira (12), com distúrbios levando a maior produtora de platina do mundo a suspender a produção em várias de suas minas no país e os seguranças a dispararem gás lacrimogêneo contra os trabalhadores manifestantes em uma grande mina de ouro.
A reportagem é de Lydia Polgreen, publicada no jornal The New York Times e reproduzida pelo Portal Uol, 13-09-2012.
A inquietação se espalhou por todas as regiões produtoras de ouro e platina que cercam Johannesburgo desde que a polícia matou 34 trabalhadores em uma mina de platina no mês passado, em Marikana, a 130 quilômetros a noroeste daqui, em um esforço para conter uma greve ilegal e violenta por trabalhadores exigindo um grande aumento salarial. A disseminação da violência está desestabilizando um dos setores mais importantes da maior economia da África.
Em um discurso para os trabalhadores em greve em uma mina de ouro, Julius Malema, o ex-líder agitador da Liga Jovem do Congresso Nacional Africano (CNA), pediu por uma greve nacional no setor de mineração, até que os salários de todos os trabalhadores sejam aumentados para cerca de US$ 1.500 por mês, aproximadamente o dobro ou triplo do que ganham agora.
"Onde estão nossos líderes?" esbravejou Malema, vestindo uma camisa branca bordada com o logo do CNA, do qual foi expulso, e uma boina preta. "Nossos líderes venderam a África do Sul! Nossos líderes estão dormindo com o capital!"
Em meio à turbulência, a Anglo American Platinum, que diz produzir cerca de 40% da platina recém-extraída do mundo, anunciou a suspensão de suas operações de mineração perto de Marikana, devido às ameaças contra seus trabalhadores.
"Diante da atual situação volátil na área de Rustenburg, onde nossos funcionários, que querem trabalhar, estão sendo impedidos de fazê-lo e estão sendo intimidados por ameaças de violência, a Anglo American Platinum decidiu suspender suas operações", disse a empresa em uma declaração.
Na quarta-feira (12), seguranças dispararam gás lacrimogêneo contra os trabalhadores em greve na mina de ouro em Carletonville, a 80 quilômetros a sudoeste de Johannesburgo. No domingo (9), cerca de 15 mil trabalhadores interromperam os trabalhos na mina, que é operada pela Gold Fields.
A mina em Marikana onde ocorreram as mortes, que é de propriedade da Lonmin de Londres, está fechada há mais de um mês, desde que os operadores das perfuratrizes da empresa, que realizam alguns dos trabalhos mais difíceis e perigosos no subsolo, entraram em greve para exigir aumento salarial.
Muitos dos mineiros em greve eram membros de um sindicato radical separatista e expressaram insatisfação com o maior sindicato do país, a União Nacional dos Mineiros, que faz parte da Confederação Sul-Africana de Sindicatos (Cosatu), a central sindical aliada do partido CNA do governo.
Até o momento, a inquietação não afetou muito a economia da África do Sul. Nem o mercado de ações e nem sua moeda, o rand, sofreram em consequência das greves. Inquietações trabalhistas são comuns na África do Sul, apesar de geralmente não serem tão violentas, disse Frans Cronje, um analista do Instituto Sul-Africano de Relações Raciais, um instituto de pesquisa que aconselha investidores.
"A África do Sul tem um histórico de conflito, instabilidade e violência", disse Cronje. "Ao olhar apenas para a criminalidade, os sul-africanos são muito blasé a respeito das coisas."
Mas as greves têm ressaltado os problemas profundos que o país enfrenta: o nível mais elevado de desigualdade em qualquer grande economia, segundo algumas estimativas; taxas de desemprego que chegam a 50% entre os jovens negros; e um sistema de educação que forma profissionais despreparados para os poucos empregos disponíveis. O CNA, que se rotula como protetor dos pobres, passou a ser visto por muitos aqui como mantendo relações estreitas demais com os donos do capital.
"O mundo empresarial ainda não percebeu a seriedade das desigualdades sociais e econômicas que o país enfrenta", disse Cronje. "Com muita frequência ele sente que suas ligações políticas são um seguro que pode resgatá-lo de qualquer problema. Mas o maior eleitorado é o de pessoas que não votam. Logo, não ajuda ter um membro do CNA no seu conselho diretor."
Malema, que foi expulso do CNA neste ano por semear a discórdia dentro do partido, tem visitado os mineiros em greve, no que é amplamente visto como uma tentativa de reforçar sua popularidade e ajudar a remover o presidente Jacob G. Zuma da presidência do partido.
Famoso por seus pronunciamentos radicais defendendo a nacionalização das minas do país e o confisco das fazendas dos brancos sem indenização, Malema é alvo de múltiplas investigações de corrupção devido à sua vasta fortuna obtida de modo misterioso.
Malema teve uma recepção calorosa dos mineiros de ouro em greve, que acenavam clavas cerimoniais, marchavam e cantavam canções em seu louvor. Um até mesmo ergueu um cartaz dizendo "Juju para Presidente", usando o apelido de Malema. Mas outros trabalhadores estavam céticos.
"Ele diz que os chefes das minas estão nos usando, que os políticos estão nos usando", disse Vusi Tshomela, um mineiro de ouro de 28 anos. "Eu acho que ele também está nos usando."
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Inquietação de trabalhadores no setor de mineração piora na África do Sul, mas ainda não afeta economia do país - Instituto Humanitas Unisinos - IHU