Por: André | 11 Abril 2013
É a nós hoje que é confiada a missão de libertar mulheres e homens que são prisioneiros do mar. A cada um e cada uma de nós, o Senhor pergunta: Tu me amas mais do que a estes? Responder sim é exigente. (...) Meu Amor por Cristo deve ter a qualidade do Amor pelo outro, pelos outros; caso contrário, eu não posso amar verdadeiramente. É um Amor possível: é, ao mesmo tempo, humano e divino!
A reflexão é de Raymond Gravel, padre da arquidiocese de Quebec, Canadá, publicada no sítio Réflexions de Raymond Gravel, comentando o Evangelho do 3º Domingo de Páscoa (14 de abril de 2013). A tradução é do Cepat.
Eis o texto.
Referência bíblica: Jo 21, 1-19
Hoje, um outro relato de aparição, desta vez na Galileia, para onde os discípulos retornaram após a morte trágica de seu amigo e mestre, o Senhor Jesus. São João recupera o relato da pesca milagrosa que se encontra em outros evangelhos, para colocá-lo após a morte de Jesus, à luz pascal. Todo o capítulo 21 de São João é um acréscimo ao evangelho que foi escrito pelos anos 100-120 da nossa era. Trata-se, sem dúvida, de um discípulo do evangelista que quis reconciliar os cristãos que reconheciam Pedro como chefe da Igreja nascente com aqueles que preferiam o outro discípulo, este que Jesus amava e que está seguramente na origem do evangelho de João. Mas quais são as mensagens que podemos tirar deste relato de aparição?
1. Uma presença na ausência
Jesus está morto. Este foi, sem dúvida, um drama espantoso para as pessoas mais próximas, para os seus discípulos, que haviam posto toda a sua esperança nele. Após esses tristes acontecimentos, todos retornaram para suas casas, na Galileia, mas a ausência do mestre se faz sentir dolorosamente. São João nomeia sete discípulos, o número da perfeição para dizer a totalidade: “Estavam juntos Simão Pedro, Tomé chamado Gêmeo, Natanael de Caná da Galileia, os filhos de Zebedeu e outros dois discípulos de Jesus” (Jo 21, 2). Eles são a Igreja, num barco, no mar, no coração das forças do mal, pescando sem resultados... Eles estão na escuridão, porque o mestre está ausente: “Mas naquela noite não pescaram nada” (Jo 21, 3c).
Ao amanhecer, o Cristo glorificado estava na margem. Ao notar que Jesus estava na margem, o evangelista afirma que ele ressuscitou, glorificou, uma vez que está no mundo novamente, aí onde não há mais mar (Ap 21, 1). Como nos outros relatos de aparição, o Ressuscitado toma a iniciativa de se fazer ver, mas os discípulos não o reconhecem (Jo 21, 4). Assim que o Cristo se torna presente, as sombras desaparecem; é o novo dia que começa, dia da ressurreição, dia da nova criação. Além disso, ele se interessa pelos seus discípulos: “Rapazes, vocês têm alguma coisa para comer? Eles lhe respondem: Não!” (Jo 21, 5). Ao lhes pedir para que joguem as redes para o lado direito, eles os convida para se voltarem para Deus. Após o julgamento, os eleitos serão colocados à direita de Deus (Mt 25, 34). Os discípulos obedecem e é a abundância: a rede estava cheia de peixes. E é aí que o amor reconhece o Ressuscitado: “O discípulo que Jesus amava disse a Pedro: é o Senhor!” (Jo 21, 7a). O olhar do coração encontra necessariamente o olhar da fé. É o Amor que faz ver e crer (Jo 20, 8).
2. A conversão de Pedro
“Simão Pedro, ouvindo dizer que era o Senhor, vestiu a roupa, pois estava nu, e pulou dentro d’água” (Jo 21, 7b). É um tanto bizarro: vestir-se para pular na água! Isso que dizer o que exatamente? Pedro havia perdido sua confiança em Jesus que acabava de ser condenado à crucifixão. Era tão inaceitável para ele, que ele o havia negado três vezes. Agora que ele sabe que está vivo, ele se dá conta da gravidade da sua negação. Face à luz de seu Senhor, ele se descobre pecador; ele perdeu a sua dignidade... Está nu como Adão e Eva no jardim do Éden (Gn 3, 10). Vestindo-se, Pedro encontra novamente a sua dignidade; acredita novamente em Jesus, em seu amor e em seu perdão, e sabe agora que pode ir ao encontro do Senhor na margem, porque o mar não pode mais submergi-lo. Pedro está perdoado!
E para mostrar o lugar importante que Simão Pedro ocupa em toda a Igreja, na de João e dos outros evangelistas, três vezes Cristo pede a Pedro professar seu amor e sua fé: “Simão, filho de João, você me ama mais do que estes outros?” (Jo 21, 15a), e por três vezes Pedro responde: “Sim, Senhor, tu sabes que te amo” (Jo 21, 15b). E é a missão que lhe é confiado: “Tome conta das minhas ovelhas” (Jo 21, 15c), “Cuida das minhas ovelhas” (Jo 21, 17c). O que quer dizer que só o Amor é necessário para seguir o Cristo e para realizar a missão que consiste em amar, guiar, acompanhar e servir os outros como Jesus o fez antes dele. A autoridade de Pedro é serviço: serviço do Cristo e dos Outros. Aqui, Pedro representa todos os discípulos.
3. A participação dos discípulos
Na Igreja onde o Cristo se faz presente, todos os discípulos exercem um papel importante: eles participam da libertação das mulheres e dos homens prisioneiros das forças do mal, do mar. E são todas as mulheres e todos os homens que poder ser libertados: havia 153 peixes, isto é, todos os peixes, porque na época se conhecia 153 espécies de peixes. Assim, as forças do mal nada podem contra a Igreja; a rede não se rasgou (Jo 21, 11b). Além disso, significa a unidade na diversidade.
A ceia que tomam juntos os discípulos e Jesus ressuscitado lembra a Eucaristia. O pão e o peixe são os símbolos da celebração eucarística. Por outro lado, preparado pelo Cristo ressuscitado, na margem, portanto, no outro mundo, o da Páscoa, sobre um fogo de brasas que lembra o amor que reúne, essa refeição, portanto, convida à partilha e à comunhão: os discípulos são agora convidados a participar dela: “Tragam alguns peixes que vocês acabaram de pescar” (Jo 21, 10). Cada um é, portanto, convidado a dar e a receber. Todos sabem agora que Cristo está presente em sua Igreja, na celebração da Eucaristia, apesar de sua ausência física.
4. O discípulo que Jesus amava
Infelizmente, esta última parte do evangelho de João é um acréscimo (Jo 21, 20-25) e não faz parte do evangelho de hoje... Entretanto, a mensagem que aparece é que o discípulo que Jesus amava também tem um lugar privilegiado na Igreja de Cristo:
1) Está atrás de Pedro: “Pedro virou-se e viu atrás de si aquele outro discípulo que Jesus amava” (Jo 21, 20a). Ele o precede mesmo no Amor e na fé. Recordemos que na manhã da Páscoa, esse discípulo chega primeiro ao túmulo: “Então o outro discípulo, que tinha chegado primeiro ao túmulo, entrou também. Ele viu e acreditou” (Jo 20, 8).
2) Ele é aquele que estava apoiado sobre Jesus, na noite da última ceia: “O mesmo que estivera bem perto de Jesus durante a ceia e que havia perguntado: ‘Senhor, quem é que vai traí-lo?’” (Jo 21, 20b).
3) Ele é testemunho do Evangelho de João: “Este é o discípulo que deu testemunho dessas coisas e que as escreveu. E nós sabemos que o seu testemunho é verdadeiro” (Jo 21, 24). Podemos, portanto, dizer que se trata do próprio João.
Concluindo, é a nós hoje que é confiada a missão de libertar mulheres e homens que são prisioneiros do mar. A cada um e cada uma de nós, o Senhor pergunta: Tu me amas mais do que a estes? Responder sim é exigente; é dizer ao mesmo tempo: Sim, eu te amo através daquele que me faz sofrer, através daquele que me exaspera, através daquelas e daqueles que me fazem o mal. Meu Amor por Cristo deve ter a qualidade do Amor pelo outro, pelos outros; caso contrário, eu não posso amar verdadeiramente. É um Amor possível: é, ao mesmo tempo, humano e divino!
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Uma presença no e pelo Amor! (Jo 21,1-19) - Instituto Humanitas Unisinos - IHU