18 Abril 2018
[Nota de Crux: O Irmão Jesuíta Guy Consolmagno é diretor do Observatório do Vaticano, fundado no século XVIII e refundado em sua forma atual em 1891. Consolmagno é visto por muitos como uma referência em como o Vaticano, discute regularmente a relação entre fé e razão. A Fundação do Observatório do Vaticano também tem um blog. Recentemente, Consolmagno fez uma palestra no Sheen Center, em Nova York, chamada 'Jesuítas e Jedi: ciência e espiritualidade na era de Star Wars'. Após o evento, ele conversou com Charles Camosy.]
A entrevista é de Charles C. Camosy, publicada por Crux, 17-04-2018. A tradução é de Luísa Flores Somavilla.
No evento no Sheen Center, aprendi um pouco sobre sua história e descobri como o senhor acabou se tornando o "astrônomo do Papa". Poderia contar um pouco desse background aos leitores do Crux?
Daria um livro! (O nome do livro é “Brother Astronomer”…)
Cresci em uma família católica comum dos anos 50 e aprendi ciência e religião com as Irmãs de Caridade de Nossa Senhora Rainha dos Mártires. Fui para o colégio jesuíta da Universidade de Detroit, pensei em ser padre, mas percebi que não tinha a personalidade certa para isso e acabei no MIT, principalmente por causa da biblioteca de ficção científica!
Aos trinta, minha fé entrou em crise; não a fé na minha religião, mas na ciência. Então, em vez de "perder tempo" estudando as luas de Júpiter, entrei no Corpo de Paz. Mas meus alunos no Quênia eram fascinados por ciência, e o entusiasmo deles me lembrava que a astronomia é um alimento para a alma que nos deixa como vacas muito bem alimentadas.
Depois de lecionar numa pequena universidade - uma delícia - entrei para os jesuítas como irmão, pensando que poderia lecionar em algum colégio jesuíta. Mas me mandaram para Roma para continuar na astronomia... e em 2015 o Papa Francisco me nomeou diretor do Observatório.
O senhor disse que estudar o cosmos é um ato de adoração. Poderia dizer mais sobre o que quer dizer com isso?
Adoração é uma maneira de chegarmos mais perto de Deus; e é isso que fazemos quando estudamos o cosmos. Não preciso que a Bíblia me dê as respostas às minhas perguntas científicas, mas dependo da autoridade das Escrituras para ter certeza que essas respostas podem ser encontradas e que vale a pena buscá-las.
Me inspiro, em particular, no salmista que escreveu que "Os céus manifestam a glória de Deus” e por São Paulo, que nos lembra de que "as coisas invisíveis, desde a criação do mundo, se entendem e claramente se veem pelas coisas que estão criadas”. Conhecemos a personalidade de Deus ao nos familiarizarmos com seu modo de criação... um modo elegante, racional e cheio de alegria!
Há muitos mal-entendidos sobre a relação da ciência e da Igreja Católica, sobretudo historicamente. Quais mal-entendidos acha que é particularmente importante corrigir?
Quando as pessoas dizem que a Igreja vai contra a ciência, respondo "cite três", pedindo três exemplos. Elas sempre começam com Galileu, que normalmente significa que não sabem nada sobre Galileu... sua vida e sua época, seus argumentos ou a natureza da oposição contra ele. Nunca leram o que ele escreveu nem o que seus companheiros e inimigos escreveram. Alguns podem mencionar Giordano Bruno. Uma olhada rápida na página da Wikipédia sobre ele geralmente já abre um pouco seus olhos. E não conseguem pensar num terceiro exemplo. (A Igreja nunca condenou a evolução, por exemplo; e dois papas, Pio XII e João Paulo II, especificamente, endossaram a ideia).
Enquanto isso, a lista de cientistas importantes que eram católicos vai de Alberto Magno a Roger Bacon, Ampere, Volta, Pasteur, Mendel e Lemaître... e também Copérnico e Galileu! Novamente, é possível ver na Wikipédia uma lista de ganhadores católicos do Prêmio Nobel.
Uma das partes de que mais gostei no evento no Sheen Center foi a exposição de seus pensamentos sobre inteligência artificial. O senhor acha que é possível que tal máquina chegue a ser considerada uma pessoa?
Em princípio, por que não? Na prática, temos muito tempo pela frente antes de que algo que produzimos com metal e semicondutores possa dar conta do recado. Minha suspeita - e posso estar errado! - é que os computadores digitais em si nunca serão capazes de replicar o cérebro humano; pelo estilo errado, acredito. Lembro da piada que diz que o cérebro humano ainda é o computador mais sofisticado a que temos acesso e, além disso, é o único que pode ser produzido por trabalhadores não qualificados.
O senhor escreveu um livro entitulado Você batizaria um extraterrestre? (em inglês, Would You Baptize an Extraterrestrial?). O senhor batizaria?
Só se ele pedisse.
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Astrônomo do Vaticano diz que estudar o cosmos é uma forma de 'adoração' - Instituto Humanitas Unisinos - IHU