20 Mai 2016
"No abraço de despedida e no abraço de chegada dessa delegação, uma emoção muito forte, energia dos lutadores e guerreiros na resistência e na esperança. Quando a gente sente eles falando "Jamo'i" (idoso com o acumulo de sabedoria vivencial) tem a certeza de que lutar ao lado dese povo vale a pena e a vitória, mais dia, menos dia virá. Eles tem a consciência da enorme luta que terão ainda pela frente, mas os nhanderu (rezadores) os animam na luta. Que Tupã e todos os espíritos dos guerreiros acompanhe esse povo, todos os povos indígenas e os lutadores da terra e da justiça", escreve Egon Heck, do secretariado nacional do Conselho Indigenista Missionário, ao enviar o artigo que publicamos a seguir.
Eis o artigo.
Os mbaraká, Takuara e Memby, instrumentos essencialmente religiosos, usados nos rituais e manifestações culturais pelos Kaiowá Guarani, voltaram a soar forte em Brasília.
Representantes desses povos vieram novamente a Brasília, para tomar posições e defender os direitos dos povos indígenas do Brasil, novamente ameaçados, agora por anunciadas revisões dos processos de terra assinados pela presidente Dilma em seus diversos escalões.
Foto: Laila Menezes/Cimi |
Em carta da Grande Assembleia da Aty Guasu ao Ministro da Justiça afirmam: “Soubemos recentemente que há interesse de revogar e de anular decretos e avanços nas demarcações de nosso território conquistados no ultimo período... Revogar os processos de nossas Terras é humilhar nosso povo, pisar em nossos antepassados e violar o tumulo de nossos guerreiros. Isso não vamos permitir. Se acontecer, muitos de nossos velhos adoecerão de novo e teremos que partir para nossas retomadas”.
Depois de mais de uma hora em ritual em frente ao Ministério da Justiça (MJ), aguardando uma posição do Ministro ao pedido de ouvir e dialogar com os Kaiowá Guarani, a resposta que obtiveram é de que um assessor do assessor poderia recebe-los. Seria alguém que entende de índio.
Frustrados e decepcionados, a delegação decidiu falar em coletiva à imprensa, amanhã, tudo que gostariam de poder dizer diretamente ao novo Ministro da Justiça.
Foto: Laila Menezes/Cimi |
Nosso koatiá (documento) é nosso grito
Na carta encaminhada ao Ministro da Justiça lembram os ataques que sofreram nos últimos anos, meses e dias, de grupos paramilitares, de jagunços e fazendeiros. Denunciam mais uma vez a situação de confinamento e massacres a que estão submetidos:
“Vivemos um genocídio conhecido e reconhecido mundialmente. Morre mais gente assassinada de nosso povo do que em países em guerra... Diante desse quadro que está entre as piores situações de povos originários no mundo, manifestam a sua decisão diante da única alternativa que lhes resta. Se este Ministério e o Governo revogar estes decretos, não teremos outra alternativa se não partir para nossas retomadas. Recuperar nossos territórios que já estão estudados e demarcados por nós mesmos. Não queremos ter mais mortos e nem empilhar nas costas do Executivo Brasileiro mais cadáveres para serem contados no exterior. Mas não teremos escolha. Um sinal como este de rever nossos direitos deverá ser entendido por nós e por todos os povos do Brasil como um deboche e como um anuncio de Guerra”.
Foto: Laila Menezes/Cimi |
Justiça seja feita
Na carta, lembram as incontáveis vezes que deixaram suas famílias e comunidades para vir a Brasília exigir justiça e respeito a seus direitos. Quase sempre foram enganados com falsas promessas. Como fica a questão de nossas lideranças assassinadas e outras constantemente ameaçadas?
Apesar de tudo, mais uma vez estão aqui clamando por Justiça Verdadeira. Justiça que respeite a Constituição que ajudamos construir. A lei maior que tantas vezes foi rasgada, como no caso da demarcação de todas as terras indígenas, até 1993.
Desta vez tem também motivos de comemorar alguns resultados das lutas, no reconhecimento de algumas terras e ações judiciais contrárias ao “marco temporal”. Não é nenhum favor, são resultados de décadas de luta, sofrimento e mortes, que acabaram também criando uma grande solidariedade nacional e internacional.
Ainda na semana passado a liderança Kaiowá Guarani de Kurusu Ambá, Eliseu Lopes, falou no Fórum Permanente da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre a questão indígena. “Não queremos mais que o sangue de nossas famílias regue plantações de soja, cana ou sirva para o gado. Não vamos desistir de nossos territórios”, disse o líder indígena Kaiowá Guarani Eliseu Lopes, em discurso na semana passada diante de mais de mil indígenas de todo o mundo.
No final da carta ao ministro da Justiça, os indígenas clamam por justiça: “O senhor tem duas escolhas. Fazer justiça e cumprir a constituição, e então terá nosso respeito, ou vender a justiça para os poderosos e manter o esbulho de nossas terras matando nosso povo e então teremos que combater e denunciar este governo. Mesmo com coração aflito pedimos ao senhor que pense, sinta e aja pelo Justo”.
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Kaiowa Guarani - recado dado - Instituto Humanitas Unisinos - IHU