A laicidade francesa é "exagerada" como disse o papa? Artigo de Jean-Paul Willaime

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19 Mai 2016

Se é verdade que há certas expressões de laicidade exagerada, também há expressões religiosas de tipo integralista, fundamentalista, que exageram porque gostaria de pôr novamente em discussão as conquistas fundamentais da laicidade.

A opinião é de Jean-Paul Willaime, diretor emérito de estudos da École Pratique des Hautes Études (EPHE), seção Ciências Religiosas, na França, em depoimento a Claire Lesegretain, comentando a recente entrevista concedida pelo Papa Francisco ao jornal La Croix, 18-05-2016. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Eis o texto.

O papa começa confirmando que "um Estado deve ser laico", esclarecendo, assim, que não é a sociedade que deve ser laica. Do mesmo modo, ele lembra que "a abertura à transcendência deve ser um direito de todos". E eu acredito que, na França, esse direito deve ser respeitado: todas as formas de abertura espiritual – também para espiritualidades laicas – são acessíveis.

O papa insiste na liberdade de cada um de exteriorizar a própria fé, com tudo o que isso envolve de visibilidade do religioso no espaço público. Ora, é preciso distinguir o espaço público como espaço de regulamentação estatal e como sociedade civil com as suas ruas, as suas praças, a sua vida social... O espaço público não se reduz à regulamentação estatal.

Portanto, devemos reconhecer, na sociedade civil, uma plena autonomia, no respeito às leis e à ordem pública, a expressões religiosas e culturais diferentes. Vejo uma exemplificação dessa "laicidade exagerada" em relação às mães que usam véu na saída dos seus filhos da escola: de acordo como forem consideradas, como momentaneamente participantes do serviço público ou representantes da sociedade civil, a sua presença será aceita ou não. Pessoalmente, opto pela segunda resposta, e outra interpretação parece-me ser uma laicidade exagerada.

Outros exemplos de laicidade exagerada: quando um prefeito, como em Chalon-sur-Saône, se recusa a prever um menu alternativo nas cantinas escolares, nos dias em que se serve carne de porco. Então, eu compreendo essa frase do papa no contexto das polêmicas franco-francesas sobre a laicidade, em que alguns gostariam de fazer desaparecer todo sinal religioso da vida pública em nome de uma laicidade exclusiva que encerraria as expressões religiosas ao foro interno.

Nesse caso, é a sociedade que se quer tornar laica. Ora, mesmo que a sociedade francesa esteja mais ou menos secularizada, ela não deve ser necessariamente laica. É o que dizia Bernard Cazeneuve ao La Croix em janeiro, lembrando que "o valor cardeal da República é o respeito, e ele se expressa com a laicidade".

A sociedade, portanto, deve respeitar a liberdade de expressão das Igrejas e das diversas expressões religiosas, mesmo quando elas expressam pontos de vista que estão em contraste com a maioria. Esse respeito não deve ser de geometria variável.

Além disso, o papa lembrou que "a objeção de consciência é um direito e deve ser possível" em todos os lugares e para todos, também para os funcionários estatais.

Em suma, eu tendo a concordar com o papa. Mas acrescentando que, se é verdade que há certas expressões de laicidade exagerada, também há expressões religiosas de tipo integralista, fundamentalista, que exageram porque gostaria de pôr novamente em discussão as conquistas fundamentais da laicidade.