09 Mai 2016
"Conferiu-se um novo rumo ao país. Lula presidente teve que fazer concessões neoliberais para assegurar a mudança de rumo, mas abriu-se ao mundo dos pobres e marginalizados. Conseguiu montar políticas sociais, algumas inauguradas anteriormente de forma apenas inicial", escreve Leonardo Boff, escritor, teólogo e filósofo.
Eis o artigo.
Sou um dos poucos que tem dito e repetido que a ascensão do PT e de seus aliados ao poder central do estado, tem significado a verdadeira revolução pacífica brasileira que, pela primeira vez, ocorreu no Brasil. Florestan Fernandes escreveu sobre “A revolução burguesa no Brasil” (1974) que representou a absorção pelo empreendedorismo pós-colonial de um padro de organização da economia, da sociedade e da cultura, com a universalização do trabalho assalariado, com uma ordem social competitiva e com uma economia de mercado de bases monetárias e capitalistas (cf.em Intrpretes do Brasil, vol 3, 2002 p. 1512).
Se bem repararmos, no ocorreu propriamente uma revolução, mas uma modernização conservadora que alavancou o desenvolvimento brasileiro, mas no teve, o que decisivo para se falar de revolução, de uma mudança do sujeito de poder. Os que sempre estiveram no poder, sob várias formas, continuaram e aprofundaram seu poder. Mas no houve uma mudança de sujeito do poder como agora.
Pois isso, que a meu ver, ocorreu com o advento do PT e aliados com a eleição de Lula a presidente. O sujeito no mais formado pelos detentores de poder, tradicional ou moderno e sempre conservador, mas pelos sem-poder: os vindos da senzala, das periferias e dos fundes de nosso país, do novo sindicalismo, dos intelectuais de esquerda, da Igreja da libertação com suas milhares de comunidades de base. Todos esses, num longo e penoso processo de organização e articulação conseguiram transformar o poder social que haviam acumulado num poder político-partidário. Via PT operaram analiticamente uma autêntica revolução.
Superemos a viso convencional de revolução como um processo de mudança ligado violência armada. Assumimos o sentido positivo dado por Caio Prado Jr. em seu clássico “A revolução brasileira” (1966,p.16): “transformações que reestruturam a vida de um país de maneira consentânea com suas necessidades mais gerais e profundas, e as aspirações da grande massa de sua população que, no estado atual, no só devidamente atendidas, algo que leve a vida do país por um novo rumo”.
Pois foi isso que efetivamente ocorreu. Conferiu-se um novo rumo ao país. Lula presidente teve que fazer concessões neoliberais para assegurar a mudança de rumo, mas abriu-se ao mundo dos pobres e marginalizados. Conseguiu montar políticas sociais, algumas inauguradas anteriormente de forma apenas inicial, mas agora oficiais como políticas de estado. Elas “atenderam as necessidades mais gerais e profundas que no haviam sido antes devidamente atendidas” (Caio Prado Jr.).
Enumeremos algumas de todos conhecidas como a Bolsa Família, Minha Casa Minha Vida, Luz para Todos e as inúmeras universidades e escolas técnicas, o FIES e os diversos regimes de cotas para o acesso universidade. Ninguém pode negar que a paisagem social do Brasil mudou. Todos, também os banqueiros e os endinheirados (Jessé de Souza) saram ganhando.
Logicamente, herdeiros de uma tradição perversa de excluso e de desigualdades gritantes, muita coisa resta ainda por fazer, particularmente no campo da saúde e da educação. Mas houve uma revolução social.
Por que nos referimos a todo esse processo? Porque está em curso no Brasil uma antirrevolução. As velhas elites oligárquicas nunca aceitaram um operário como presidente. Relacionada à crise econômico-política (que devasta a ordem capitalista mundial), uma direita conservadora e rancorosa, aliada a bancos e ao sistema financeiro, a investidores nacionais e internacionais, imprensa empresarial hostil, a partidos conservadores, a setores do judiciário, da PF e do MP sem excluir a influência da política externa norte-americana que não aceita uma potência no Atlântico Sul ligada aos BRICS, esta direita conservadora está promovendo a antirrevolução. O impeachment da presidenta Dilma um capítulo dessa negação. Querem voltar ao estado anterior, democracia patrimonialista, de costas para o povo, pela qual se enriquecem como no passado.
Além de defender a democracia e desmascarar o impeachment como golpe parlamentar contra a presidenta Dilma, importa assegurar a revolução brasileira, para qual esperamos por séculos. Repito o que escrevi e vi num twitt: “Se os pobres soubessem o que estão armando contra eles, às ruas do Brasil seriam insuficientes para conter o número de manifestantes que protestarão contra”.
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O impeachment como uma antirrevolução - Instituto Humanitas Unisinos - IHU