Por: André | 06 Abril 2016
A uma semana das eleições presidenciais, Mendoza briga pelo segundo lugar nas pesquisas com o economista neoliberal Kuczynski. Ela propõe uma mudança de modelo que “ultrapasse a lógica do arremate indiscriminado dos nossos recursos naturais”.
Fonte: bit.ly/1qrIfuV |
A reportagem é de Carlos Noriega e publicada por Página/12, 04-04-2016. A tradução é de André Langer.
A uma semana das eleições, as pesquisas colocam a candidata da esquerda, Verónika Mendoza (foto), jovem congressista de 35 anos, carismática e clara na exposição de suas ideias, com grandes possibilidades de passar para o segundo turno e disputar a presidência com Keiko Fujimori, filha do ex-ditador Alberto Fujimori, atualmente preso. As últimas pesquisas publicadas no final de semana – a lei proíbe a divulgação de pesquisas a partir da segunda-feira – dão um empate técnico no segundo lugar entre Verónika Mendoza e o veterano economista neoliberal e ex-ministro Pedro Pablo Kuczynski, mas com uma tendência à subida da primeira e a um estancamento do segundo.
O significativo crescimento nas pesquisas da candidata da esquerda tornou-a alvo de uma implacável guerra suja – com os grandes meios de comunicação jogando contra ela – que busca desacreditá-la com ataques que vão desde chamá-la de chavista ao extremo de acusá-la de terrorista.
“Eu sinto que a nossa visão de mudança está sintonizando com a população. Nós representamos a única verdadeira alternativa de mudança e isso está sendo avaliado pela população. A guerra suja não nos atinge”, disse Verónika Mendoza em uma coletiva de imprensa com correspondentes estrangeiros.
Mendoza questiona a desigualdade e os problemas sociais alimentados pelo modelo econômico neoliberal e coloca a ênfase em remarcar que um eixo central de um governo da esquerda seria a mudança deste modelo, imperante no país há mais de 25 anos.
Assinala que a Frente Ampla quer “ultrapassar a lógica com que se veio operando nos últimos governos, que foi a do arremate indiscriminado dos nossos recursos naturais sem pensar no médio prazo, sem pensar na geração de empregos, nem na sustentabilidade ambiental”.
Ela acrescenta que um aspecto chave da sua proposta econômica é diversificar a economia que acabe com a dependência do país da exportação de matérias-primas e seus preços internacionais, especialmente minerais, promovendo e apoiando a partir do Estado outros setores econômicos, como a indústria, a agricultura, o turismo, o que, precisa, não significa abandonar a mineração, mas impulsionar estes outros setores econômicos como “novos motores da economia” em tempos de queda dos preços dos minerais. Ela precisa que estes outros setores econômicos que um governo seu promoveria são importantes geradores de emprego.
A candidata da Frente Ampla esclarece que não propõe a estatização dos recursos naturais ou de empresas, mas “a recuperação da soberania dos nossos recursos naturais”. “Neste momento, o Estado peruano – aponta – não pode decidir o que será feito com os nossos recursos. Por exemplo, as empresas que exploram o gás podem fazer com esse gás o que querem, exportar tudo sem que o Estado possa se manifestar. Assim são feitos os contratos. Por isso, agora não podemos garantir que esse gás sirva para abastecer o mercado interno. Nós vamos recuperar a soberania sobre os nossos recursos naturais para que o Estado decida o que será feito com eles, e assim garantir que o gás sirva em primeiro lugar para o mercado interno, para as residências peruanos, a serviço de uma indústria petroquímica. Para isso vamos renegociar os contratos de exploração do gás”.
Entre as medidas para reativar uma economia estancada, a Frente Ampla também propõe um impulso significativo dos investimentos públicos, a queda das taxas de juros, o aumento do salário mínimo (atualmente é de 850 soles mensais, cerca de 250 dólares. El propõe um aumento para mil soles, cerca de 300 dólares). Mendoza insiste em esclarecer que não propõe uma economia estatizada, e tampouco um controle de preços nem da taxa de câmbio.
A defesa do meio ambiente, dos direitos dos povos indígenas, dos direitos trabalhistas, uma luta frontal contra a corrupção, são, diz a candidata da esquerda, outros aspectos centrais da sua proposta. Ela também propõe a mudança da Constituição fujimorista de 1993 para, entre outras coisas, conceder ao Estado “um papel ativo na economia como planejador e promotor”, algo que a atual Constituição nega.
O problema para a esquerda é que, se conseguir chegar ao governo, não teria maioria no Congresso e deveria governar com um Parlamento muito provavelmente dominado pelas forças da direita, com uma forte presença fujimorista, o que dificultaria a implementação das mudanças e reformas que propõe.
“Para além do número de congressistas que tivermos, o que nos garante poder impulsionar as reformas que estamos propondo é a consistência da nossa futura bancada parlamentar. Buscaremos acordos, eventualmente alianças, com outras forças políticas democráticas que estão dispostas a implementar algumas destas reformas”, disse a candidata da Frente Ampla.
– Com que forças políticas acredita que podem chegar a acordos para implementar suas reformas, se, exceto a Ação Popular do candidato socialdemocrata Alfredo Barnechea, todas as outras forças que estarão no Congresso, e que, segundo todas as pesquisas, juntas terão maioria, são de direita e se opõem a essas reformas? – perguntou Página/12.
– É bastante difícil responder a isso. Minha experiência no Congresso me fez constatar que quem chega ao Congresso representando uma determinada força política não necessariamente compartilha uma mesma visão e um programa comum, e uma vez no Congresso em muitos casos as bancadas se dissolvem, recompõem, reacomodam, em função das afinidades mais pessoais dos congressistas. Então, isso dependerá da composição concreta do Congresso não somente em termos de forças políticas, mas também de indivíduos que forem eleitos. O fundamental é assegurar que a população esteja plenamente envolvida, informada, das políticas e das reformas que queremos implantar. Algumas das principais reformas iremos impulsionar desde o primeiro momento com a legitimidade que a população nos der.
Sobre Keiko Fujimori, que lidera todas as pesquisas e seria sua segura rival no segundo turno, caso a esquerda conseguir ficar em segundo lugar, Verónika Mendoza assinala que “a senhora Fujimori sempre fez vista grossa à corrupção. Ela foi a primeira dama no governo de seu pai e nunca se indispôs com a corrupção que se institucionalizou nesse governo, com as violações dos direitos humanos, com a esterilização de milhares de mulheres camponesas contra a sua vontade”.
“Aquilo que Keiko Fujimori e os líderes do atual fujimorismo chamam de erros foram, na verdade, claramente crimes. E seus problemas de corrupção não são apenas do passado. Agora compram votos com o clientelismo. Recentemente, uma congressista fujimorista foi condenada por enriquecimento ilícito, seu secretário-geral e tesoureiro da campanha é investigado por lavagem de dinheiro”, disse a candidata da Frente Ampla. E arremata: “O governo de Fujimori foi um dos mais nefastos da história recente e não queremos que isso se repita”.
Em política internacional, a Frente Ampla propõe uma mudança na prioridade que agora tem a relação com a Aliança do Pacífico (formada por Peru, Chile, Colômbia e México, como um grupo de países de economias neoliberais e próximos a Washington), que passaria a um segundo plano, para priorizar a integração na Comunidade Andina e na Unasul e buscar uma maior relação com o Mercosul e outros espaços de integração regional, para a partir dessa integração regional melhorar as condições de inserção internacional e de relações econômicas com o mundo e procurar ter um mercado ampliado em nível regional.
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Eleições no Peru. A carta jogada pela esquerda peruana - Instituto Humanitas Unisinos - IHU