Por: Cesar Sanson | 01 Fevereiro 2016
"A inteligência coletiva pretende levar o trabalho em equipe a um nível mais eficiente. Graças à tecnologia, os indivíduos podem pensar juntos e encontrar soluções", constata Anita Williams Woolley, pesquisadora da Carnegie Mellon University, e publicada por El País, 30-01-2016.
Eis o artigo.
Quando se trata de avaliar o trabalho de uma empresa, um Governo ou qualquer outra organização, em geral se destaca a figura do líder, carismático, inteligente e criativo (no melhor dos casos). Mas a realidade é que a maioria das decisões tomadas no cotidiano, desde a estratégia comercial do Google até os objetivos de uma comunidade de moradores, é fruto do trabalho em equipe.
No caso da inteligência individual, os psicólogos sabem há um século que existem pessoas mais inteligentes que outras; por exemplo, os que obtêm boas pontuações nas provas de quociente intelectual costumam ter melhor rendimento acadêmico, ganhar mais dinheiro, tomar melhores decisões e até viver mais tempo. O mesmo acontece no caso dos grupos? Têm uma inteligência própria?
Essa foi a pergunta que, anos atrás, motivou meus colegas Thomas Malone e Christopher Chabris e a mim a investigar o tema da inteligência coletiva. Em nossos dois primeiros estudos, publicados na revista Science, recrutamos quase 700 participantes e os agrupamos em equipes de dois a cinco membros. Cada um deles trabalhou várias horas para executar uma série de tarefas rápidas, selecionadas para representar os diferentes tipos de problemas que os grupos devem resolver no mundo real e que os obrigaram a colaborar de diversas maneiras. Algumas exigiam criatividade, outras raciocínio verbal ou moral, negociação ou planejamento.
Obtivemos provas sólidas de que existe uma inteligência geral nas equipes, como acontece com os indivíduos. Nós a chamamos de inteligência coletiva. Aqueles que faziam bem um trabalho tendiam a fazer bem outros. Em outras palavras, alguns grupos eram mais inteligentes que outros. Depois pedimos que executassem uma tarefa mais complexa, uma prova de critério. A pontuação de inteligência coletiva que tínhamos calculado com base em sua tarefa anterior permitiu predizer muito bem seu comportamento na tarefa de critério, enquanto outros fatores, como as pontuações individuais em provas de quociente intelectual, não.
O mais útil de estudar esses comportamentos em grupos reduzidos é que oferece pistas sobre o funcionamento em grande escala de colaborações virtuais e comunidades online. Nossas conclusões básicas se repetem tanto no caso de grupos presenciais como em grupos na Internet, em grupos de alunos de mestrado e em projetos de informática ao longo de um semestre, em grupos de jogo online ou multiculturais.
Também nos perguntamos o que distinguia as equipes mais inteligentes das outras, e as respostas nos surpreenderam. Em primeiro lugar, descobrimos que não eram necessariamente aqueles grupos cujos membros tinham maiores quocientes intelectuais individuais. Tampouco eram os que tinham pessoas extrovertidas, nem aqueles com os indivíduos mais satisfeitos com seu trabalho.
As equipes mais inteligentes tinham três características principais. Primeiro, as que contavam com mais mulheres funcionavam melhor que as equipes com mais homens. Segundo, os membros das equipes mais inteligentes tiravam melhor pontuação em uma prova chamada “Ler a mente no olhar”, que mede até que ponto uma pessoa é capaz de fazer deduções com base em fotografias dos olhos de outros. Por último, nas equipes mais inteligentes, os membros contribuíam de forma mais distribuída às discussões em grupo, em vez de deixar que fossem dominadas por uma ou duas pessoas.
A reflexão sobre esses fatores nos levou a pensar como poderíamos fomentar a inteligência coletiva em grupos mais amplos, talvez comunidades de pessoas dispersas ou especialistas do mundo inteiro que trabalham com problemas similares. É muito provável que, ao reforçar os processos críticos, a tecnologia possa impulsionar a inteligência coletiva a novos patamares. Se voltarmos a recorrer ao que conhecemos sobre a função cognitiva individual, sabemos que os indivíduos necessitam de memória, atenção e capacidade de resolução de problemas para funcionar bem. Como se observou em pessoas que trabalham em condições extremas como no espaço sideral ou no alto de uma montanha, uma diminuição de qualquer uma destas funções fundamentais pode ter consequências desastrosas.
As pesquisas mostram que os grupos necessitam dessas mesmas funções cognitivas de maneira coletiva. Os grupos precisam desenvolver sistemas de atenção para fixar-se coletivamente no entorno, sistemas de memória para armazenar e recuperar informação e sistemas de solução de problemas para coordenar as ações dos diferentes indivíduos a fim de alcançar o objetivo ou solucionar o problema.
Hoje vemos, cada vez mais, ferramentas tecnológicas que ajudam os indivíduos, e pouco a pouco os grupos, a realizar essas funções. Há muito tempo vimos utilizando a grande capacidade de memória informática como depósito de conhecimento e a comunicação intensificada para ajudar na coordenação e na solução de problemas. No entanto, essas tecnologias ao mesmo tempo facilitam e dificultam a atenção; muitas vezes, a possibilidade de acessar a informação armazenada em uma imensa memória na nuvem e de nos comunicar com qualquer um praticamente em qualquer lugar divide nossa atenção.
As novas ferramentas para filtrar o correio eletrônico e nos avisar de acontecimentos em nossa agenda ajudam a centrar nossa atenção, mas esses são recursos concebidos para ajudar indivíduos, e não grupos. Contudo, à medida que essas ferramentas evoluírem e prestarem melhor serviço aos grupos, nos tornaremos mais capazes de usar todas as tecnologias que ampliam nossas capacidades cognitivas coletivas e ser, todos, mais inteligentes.
Outro aspecto que é preciso levar em conta ao misturar os seres humanos com a tecnologia para melhorar a inteligência coletiva é a extraordinária necessidade que as pessoas têm de relacionar-se. Podemos ter capacidade de executar uma série de atividades, mas também temos de querer fazê-las. Nossa relação com as pessoas envolvidas em um projeto influem enormemente na motivação. Em nossos primeiros estudos não tínhamos em conta a importância da coesão dos membros da equipe nem a qualidade das relações interpessoais. Mas em trabalhos mais recentes vimos que, para obter objetivos mais a longo prazo, as equipes precisam das duas coisas: inteligência coletiva e relações de qualidade.
Em outras palavras, as equipes cujos membros se dão bem, mas carecem de inteligência coletiva, não trabalham bem, e tampouco as equipes com grande inteligência coletiva, mas sem boas relações interpessoais. Por exemplo, os grupos de alunos de um MBA em uma das principais escolas de negócios dos Estados Unidos precisaram combinar a inteligência coletiva e boas relações interpessoais para aprender e melhorar com rapidez em uma série de trabalhos atribuídos a eles durante um semestre. Em outro estudo realizado recentemente com Miriam Erez e seus colaboradores no Technion, o Instituto Tecnológico de Israel, descobrimos que as equipes multiculturais espalhadas pelo mundo necessitavam de inteligência coletiva e de um entorno de comunicação psicologicamente seguro para fazer um bom trabalho em um projeto de longa duração.
Como podemos cultivar essas relações de qualidade necessárias para que as equipes possam pôr em prática a inteligência coletiva? Várias pesquisas começaram a tratar dessa questão. Laura Dabbish, Robert Kraut e seus colegas do Carnegie Mellon estudaram como a comunicação influi na natureza das relações que se desenvolvem através da Internet. Sua conclusão é que os tipos de comunicação que cada um recebe de outros influenciam muito na satisfação e no interesse de continuar atuando nesses grupos da Internet.
Teremos de continuar desenvolvendo nossa capacidade de fomentar relações interpessoais produtivas na Internet, além de tecnologias que ajudem a melhorar a inteligência coletiva. E, quando unirmos essas ideias, poderemos começar a pensar em organizações virtuais muito mais amplas — e muito mais inteligentes — que as que existiram no passado.
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