26º domingo do tempo comum – Ano B – Fazer o bem, viver e praticar os sinais do Reino de Deus

27 Setembro 2024


A reflexão é de Simone Furquim Guimarães, leiga, teóloga. Ela é mestre em teologia bíblica pela Faculdades EST. É assessora e coordenadora do Cebi-Planalto Central.

Leituras do dia

1ª leitura: Nm 11,25-29
Salmo: Sl 18 (19), 8.10.12-13.14 (R. 8a,9b)
2 leitura: Tg 5,1-6;
Evangelho: Mc 9,38-43.45.47-48

Eis o texto.

Queridos irmãos e irmãs, as leituras bíblicas deste domingo podem ser lidas numa perspectiva ecumênica e também do cuidado nas relações humanas.

O Evangelho de Marcos (Mc 9,38-43.45.47-48) inicia o texto dizendo que João proibiu alguém que não pertence ao grupo dos discípulos de expulsar demônios em nome de Jesus; isto porque, para João, somente os seguidores de Jesus tinham autoridade para fazer milagres. Mas Jesus reage, trazendo a Boa Nova que serve para nós também, na nossa realidade enquanto igreja; pois a reação de Jesus pode ser lida numa perspectiva de abertura e de respeito à diversidade cristã. Ele vai dizer: “Não o impeçais, pois não há ninguém que faça milagre em meu nome e logo depois possa falar mal de mim. Porque quem não é contra nós é por nós” (cf. v.40).

Lendo essa passagem para iluminar os dias de hoje, o que importa para Jesus não é se a pessoa faz ou não faz parte da comunidade cristã, mas sim se ela faz o bem que a comunidade deve realizar. O importante é viver neste mundo os sinais do Reino de Deus, resgatar a dignidade dos necessitados e o caminho da justiça.

Fazer o bem é dever de todos nós, filhos e filhas de Deus, assim nos ensina Moisés na primeira leitura: “Quem dera que todo o povo do Senhor fosse profeta e que o Senhor infundisse o seu Espírito sobre eles!” (cf. Nm 11,29). Isto porque Josué também tinha uma perspectiva exclusivista (assim como João), entendendo que só quem poderia profetizar eram os 72 anciãos que estavam na Tenda sagrada. Esse pequeno trecho nos interpela, assim como a nossas igrejas, pois quase sempre somos tentados a querer monopolizar o Evangelho.

Nesse sentido, o evangelho nos ensina e abre os nossos corações, pois a preocupação de Jesus não é com quem está promovendo cura, mas sim é com aqueles que desviam a fé dos pequenos; ou seja, afastam as pessoas do plano de salvação de Deus. Por isso, no texto de hoje, Jesus se coloca do lado dos pequenos, dos excluídos e assume em sua defesa. Ele vai dizer: “Se alguém escandalizar um destes pequeninos que crêem, melhor seria que lhe prendessem ao pescoço a mó que os jumentos movem e o atirasse ao mar”. Na tradição judaica “escândalo” é entendido como uma ação ou pensamento que desvia da fé em Deus. Escandalizar os pequenos é ser motivo pelo qual os pequenos se desviam e perdem a fé. E os responsáveis pelo Templo e pela Lei, com suas doutrinas rigorosas, afastavam e excluíam muitas pessoas de Deus.

Em nossas igrejas, devemos nos perguntar se nosso jeito de viver a fé, de ler e interpretar os textos bíblicos estão excluindo as pessoas do plano de Deus. Retomando a frase pastoral de Papa Francisco: “não podemos nos tornar fiscais de alfandega na igreja”. Nosso papel, nas relações dentro da comunidade cristã é de acolher, de cuidar, sobretudo dos mais pequeninos (os excluídos na sociedade).

Por causa dos escândalos cometidos pelas autoridades religiosas e por muitos cristãos e cristãs, Jesus usa de um tom profético, amaldiçoando aqueles que estão escandalizando os pequenos. Para isso, ele usa elementos do corpo para comparar com qual tipo de escândalo se refere: se for sua mão ou pé ou seu olho o motivo de escândalo é melhor cortar. Essas frases são duras, mas não podem ser tomadas ao pé da letra. Na simbologia judaica, os olhos, mãos e pés têm significado expressivo na Bíblia.

Os pés expressam o caminho, conforme o Salmo 26,12: “O meu pé está posto em caminho plano; nas congregações louvarei ao Senhor”. Aqui o Salmista procura levar seus pés a um caminho plano, isto é, agradável ao Senhor. “Quão formosos os pés dos que anunciam o evangelho de paz; dos que trazem alegres novas de boas coisas” (cf. Rm 10,15).

As mãos exprimem atividades, trabalho, também domínio e poder. As mãos podem ser usadas para curar, ajudar, servir. Dar a mão sempre significou paz, amizade e confiança (cf. 2 Rs 10,15).

O olho está relacionado com conhecimento interior e sabedoria. Em Lucas, Jesus diz: “A candeia do corpo é o olho. Sendo, pois, o teu olho simples, também todo o teu corpo será luminoso; mas, se for mau, também o teu corpo será tenebroso” (cf. Lc11,34-35).

Conhecendo bem essa simbologia, Jesus as usa de forma alegórica para ensinar como deve ser as relações humanas. Traduzindo para os dias de hoje, podemos reler as advertências de Jesus assim:

– Se nossos pés (simbolizando o lugar, o caminho) estão fincados nas instâncias de poder que domina e oprime os pequeninos de hoje, melhor cortá-los; caso contrário, trilharão caminhos de opressão e injustiças sociais.

– Se nossas mãos (que simboliza poder, ação) trabalham para escravizar, excluir, ameaçar os pequeninos, melhor cortá-las; caso contrário, esse tipo de poder só destrói a vida e dignidade de vida das pessoas.

– Se os nossos olhos (que significa conhecimento) estiverem direcionados para produzir cultura e ensinamentos excludentes, violentos e de ódio, melhor cegá-los; caso contrário, produzirão violência, intolerância e morte.

Na segunda leitura, (g 5,1-6) Tiago, numa linguagem profética e num tom de maldição nos mostra quem são aqueles que escandalizam os pequeninos, pois se desviaram do caminho de Deus, construíram as injustiças sociais com suas riquezas e poderes de dominação e exclusão.

Nesta celebração da Páscoa do Senhor, toda igreja se volta às Palavras que produzem ensinamento e vida. Devemos então, usar nossos dons para trilhar o caminho do Senhor, usando do poder serviço para fazer o bem, iluminados pela Palavra que cura, pois devemos ser curadores pela Palavra Sagrada.

Que nossas comunidades cristãs, nossas igrejas, busquem o caminho do Seguimento de Jesus, estejam a serviço do Evangelho e, com sabedoria, iluminem e orientem para construir um mundo melhor. Que invés de dispersar e escandalizar, possamos congregar, sermos o “sal da terra” (cf. v.50). Amém!

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