14 Setembro 2006
O governo Luiz Inácio Lula da Silva amargou uma das mais contundentes derrotas da sua política externa ao ser surpreendido nesta semana, pela segunda vez em cinco meses, por mais uma medida unilateral do seu aliado Evo Morales, da Bolívia. Depois de dois dias cozinhando uma reação, o Palácio do Planalto conseguiu ontem estancar a iniciativa de Evo de passar o controle das refinarias da Petrobrás para a estatal Yacimientos Petrolíferos Fiscales de Bolívia (YPFB) e adiar a discussão sobre as pendências bilaterais no setor do gás para depois das eleições. Mas o estrago já estava consumado.
í€ noite, ao detalhar a decisão extraída do presidente em exercício da Bolívia, ílvaro García Linera, de congelar a aplicação da resolução que permitia a absorção das refinarias pela YPFB, o assessor da Presidência para Assuntos Internacionais, Marco Aurélio Garcia, reconheceu o peso eleitoral do episódio sobre a campanha de reeleição do presidente Lula.
"Se tivesse levado em consideração (o período de eleições), o governo boliviano não teria tomado essa decisão unilateral".
A publicação da resolução do Ministério de Hidrocarbonetos, sob clara ordem de Evo Morales, deixou o Planalto atônito. A Petrobrás Bolívia e a embaixada do Brasil em La Paz souberam da medida quando a viram publicada nos jornais bolivianos, na manhã terça-feira.
Enquanto o presidente Lula e o ministro das relações Exteriores, Celso Amorim, dedicavam-se naquele dia à visita do primeiro-ministro da índia, Manmohan Singh, a Petrobrás analisava o texto e concluía que sua dimensão era a pior possível: estatização das refinarias.
Na quarta-feira, ambos estiveram às voltas do mais celebrado evento da chamada Cooperação Sul-Sul antes das eleições de outubro, a Cúpula do Fórum Ibas (índia, Brasil, ífrica do Sul), que deu ao presidente a alavanca para atacar os críticos de sua política terceiro-mundista.
Na noite de quarta, Lula determinou que Rondeau suspendesse sua viagem para La Paz, onde comandaria a rodada de negociações agendada durante a visita de García Linera. Amorim embarcou para Havana, onde participou ontem do encerramento da Cúpula do Movimento dos Não-Alinhados - no qual Evo foi uma das estrelas - e deixou o tema nas mãos do secretário-geral das Relações Exteriores, embaixador Samuel Pinheiro Guimarães. Ontem, entretanto, o Itamaraty não emitiu nenhuma posição sobre o episódio, que acabou contornado por Marco Aurélio Garcia.
O recuo boliviano começou a ser armado às 11 horas de ontem, quando Marco Aurélio telefonou para García Linera para argumentar que a medida unilateral não correspondia ao acerto traçado em Brasília. Recém-chegado dos Estados Unidos, García Linera igualmente fora surpreendido pela iniciativa de seu chefe e pediu tempo. Ambos conversaram várias vezes. De Cochabamba, García Linera ligou para Marco Aurélio por volta das 18h30 e, com a devida autorização de Evos, informou que o governo boliviano decidira "congelar" a medida, ou seja, suspender sua aplicação por tempo indefinido e agregá-la ao pacote de negociações com o Brasil.
"Nos surpreendeu que essa medida tenha sido tomada às vésperas da chegada, em La Paz, de uma missão de alto nível do governo brasileiro para negociar as pendências na área de energia. Foi muito desagradável", afirmou Marco Aurélio.
Segundo ele, o governo brasileiro acompanhou com "muito cuidado" o episódio e estava preparado para enfrentar qualquer atitude de La Paz. Mas continua a confiar na administração de Evo Morales.
"Se não desse para ter confiança, teríamos tomado outra posição. Quero ressaltar que houve recuo do governo boliviano"
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"Evo Morales não levou em conta reeleição de Lula", afirma Marco Aurélio Garcia - Instituto Humanitas Unisinos - IHU