07 Novembro 2011
É necessária a consciência de que, se a desigualdade for muito elevada, apresenta-se um sério problema político de regressão da democracia.
Essa é a opinião do economista francês Jean-Paul Fitoussi, em artigo para o jornal La Repubblica, 06-11-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o artigo.
A desigualdade e o seu aumento inexorável são, ao mesmo tempo, causa e efeito da crise. Por que chegamos a este ponto? Nos países industrializados, viemos de 30 anos de crescimento da desigualdade em sintonia com a doutrina dominante, que, a partir da revolução conservadora do início dos anos 1980, gerou uma conversão ao liberalismo, ao livre comércio, à desregulamentação. O fenômeno é caricatural nos Estados Unidos, onde os 10% mais ricos viram a cota da renda nacional aumentar em 15%, enquanto o salário médio dos outros 90% conhecia uma estagnação.
Hoje, a desigualdade é mais forte do que na véspera da crise, e a razão é a seguinte: se há uma estagnação da renda da grande maioria da população, a demanda global é baixa. Para combater essa insuficiência, a política monetária torna-se expansionista. As pessoas que tinham dificuldade para chegar ao fim do mês fez empréstimos, e assim a dívida privada aumentou.
Por outro lado, há aqueles que tiveram benefícios com o aumento da desigualdade, isto é, os ricos, que viram a sua fatia da renda aumentar enormemente. Eles se encontraram novamente com um monte de dinheiro para gastar e compraram casas, títulos, ações. O que explica a bolha especulativa, agravada pelo atraso com o que se deram conta de que essa acumulação de riqueza era ilusória, porque os mercados estavam superestimando o valor dos ativos.
Enquanto acumulavam riqueza, os ricos acendiam empréstimos, que se somaram às dívidas de necessidade do resto da população. Quando as bolhas estouraram, todas as economias do mundo se encontraram diante de um excesso de dívida privada que fez ruir as economias. Esse colapso diminuiu as receitas fiscais e, assim, aumentou o déficit público. Os governos tentaram combater os efeitos da crise com planos de recuperação financiados com recursos públicos: houve uma substituição entre dívida privada e dívida pública.
O que contribuiu para o aumento da desigualdade foi a fé generalizada de que, para ganhar em competitividade em uma época de globalização, as coisas mais importantes eram diminuir o estado de proteção social, reduzir o custo do trabalho, não taxar os ricos para evitar que mudassem de país. Diminuiu-se a progressividade do imposto e foram aliviadas as taxas apenas sobre as empresas.
É urgente perceber, ao contrário, que o sistema capitalista só pode sobreviver em um contexto onde a desigualdade é mantida sob controle. Deve ser restaurado o princípio-base da democracia, que é "uma pessoa, um voto", e não como o mercado indica, "um euro, um voto". São necessários compromissos entre princípios contraditórios. O capitalismo conheceu seus períodos de glória quando alcançou esse compromisso, aumentando, por exemplo, a proteção social, fator crucial de estabilização. É necessária, em suma, a consciência de que, se a desigualdade for muito elevada, apresenta-se um sério problema político de regressão da democracia.
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Aumenta a desigualdade, diminui a democracia. Artigo de Jean-Paul Fitoussi - Instituto Humanitas Unisinos - IHU