27 Junho 2011
Comissão Episcopal espanhola nega o "nihil obstat" ao constatar uma série de "ambiguidades" e ensinamentos opostos ao magistério da Igreja.
A reportagem é de Pedro Ontoso, publicada no jornal Diario Vasco, 27-06-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
A Comissão Episcopal para a Doutrina da Fé da Espanha negou "nihil obstat" (nada a objetar) ao segundo livro de José Antonio Pagola sobre os Evangelhos, intitulado El camino abierto por Jesus. Marcos, por considerar que, em certos pontos, "o ensinamento do texto se opõe a afirmações explícitas do magistério da Igreja" e por causa da acumulação de uma série de "ambiguidades".
O primeiro volume superou, em novembro passado, a barreira da censura eclesiástica, o que alertou os detratores de Pagola, em espera da chegada do segundo. O manuscrito acabou sobre a mesa da Secretaria Geral da comissão, liderada por José Rico Pavés, um velho conhecido do teólogo basco, ao qual já desacreditou com a obra Jesus. Uma aproximação histórica.
Rico Pavés assinou, naquele tempo, um duro artigo contra o Jesus de Pagola, que depois se converteu em uma extensa nota de esclarecimento – não de condenação – da Doutrina da Fé sobre a obra de pesquisa histórica. Quase cinco anos depois, o ex-vigário de a San Sebastián volta a sofrer um calvário por parte do mesmo órgão episcopal.
Rico, que figura em muitas apostas como candidato à mitra, é o perito da comissão presidida agora pelo bispo de Almería, Adolfo González , e da qual são membros Manuel Urueña, arcebispo de Saragoça, Alfonso Carrasco Rouco, bispo de Lugo, Juan Antonio Reíg Plá, titular de Alcalá de Henares, Luis Quinteiro, bispo de Tuy-Vigo, e Enrique Benavent, prelado auxiliar de Valência.
Apesar do sigilo do "caso Pagola", este jornal teve acesso ao relatório doutrinal sobre o manuscrito do teólogo basco, uma duro alegação de 15 páginas recheadas com uma linguagem desqualificadora em que se fala de formulações "pouco felizes", afirmações " confusas" ou "ambiguidade" constante. O relatório apoia seus argumentos em textos recolhidos da própria Congregação vaticana para a Doutrina da Fé – como o documento Dominus Jesus sobre a unicidade da Igreja Católica como religião verdadeira –, o Catecismo da Igreja, a Dei Filius – constituição dogmática sobre a fé do Vaticano I –, o Credo do Povo de Deus, a encíclica Veritatis Splendor de João Paulo II e até se remonta ao Concílio de Trento. Também invoca pronunciamentos que foram feitos contra teólogos proeminentes que foram castigados com o silêncio, como Leonardo Boff, Roger Haight ou Jon Sobrino, estes últimos dois jesuítas.
O parecer oferece apenas uma concessão positiva aos "mérito indubitáveis" do autor, como o fato de ter obtido uma "exposição simples e próxima, que é lida com facilidade e convida à reflexão". Desde a primeira página, os censores já encontram "uma série de ambiguidades a respeito de ensinamentos básicos da fé cristã e até mesmo afirmações que não é possível ver como podem ser compatíveis com determinados pronunciamentos da Igreja".
Na análise sobre "O seguimento de Cristo, fé e religião", o relatório estabelece que a proposta de Pagola "é incompatível com a fé católica", quando, entre outras afirmações, escreve que "a primeira tarefa da Igreja não é celebrar o culto, elaborar teologia, pregar moral, mas sim curar, libertar do mal, tirar do abatimento, sanar a vida, ajudar a viver de uma maneira saudável". O relatório adverte sobre o perigo de redução da verdade à práxis, que já era abordado no primeiro documento da Doutrina da Fé sobre a teologia da libertação. Ele acrescenta que "uma consequência do que é afirmado por Pagola ao não sublinhar adequadamente a confissão de fé em prol da práxis é o risco de resvalar para propostas próprias do pluralismo religioso".
Na seção sobre a "Identidade de Jesus Cristo e o mistério de Deus", o relatório constata a "relativização das fórmulas dogmáticas em razão da práxis". Os sensores relacionam a posição do autor com a mantida por Jon Sobrino, "em que a confissão de fé cristológica ficava redimensionada pela práxis libertadora até o ponto de serem consideradas `perigosas` as fórmulas dogmáticas. Sem chegar a esses extremos de Jon Sobrino – continua –, para José Antonio Pagola parece que a confissão da verdade sobre Cristo é bastante irrelevante para a vida cristã, para o qual a única coisa que importa é atividade libertadora, que parece se reduzir ao mero alívio das misérias terrenas".
O demônio existe
Uma questão que os censores apresentam como "exemplo de ambiguidade" é a afirmação de que, na Igreja, deve-se superar a dominação masculina "sem especificar nunca em que consiste". "Em muitos leitores, dado o ambiente cultural – escreve – se entenderá que a maior `discriminação` da mulher na Igreja é que ela não pode receber a ordem sacerdotal". "Pretende-se dizer que se deve admitir as mulheres ao sacerdócio ministerial, opondo-se assim a um ensinamento infalível?". O parecer se refere, por último, à "permanente ambiguidade" sobre o pecado, assim como aos textos em que aparecem os possessos e os exorcismos para concluir que Pagola "silencia verdades de fé, como a existência do demônio".
Pelo que se sabe, Pagola respondeu a todas as acusações da Comissão da Doutrina da Fé. Cansado, mas em um estado de espírito que não tem nada a ver com a anterior, quando somatizou um caso que tem muito a ver cada vez mais com uma busca pessoal.
Enquanto isso, os executivos editoriais buscam um selo no qual se possa republicar o trabalho de Pagola, que já se tornou, apesar dele, em um ícone do pensamento eclesiástico livre.
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Comissão doutrinária da Espanha impede publicação de livros de José Pagola - Instituto Humanitas Unisinos - IHU