22 Mai 2011
"Os ataques contra os cristãos que se sucedem no Egito são fomentados por grupos de seguidores de Mubarak ou por extremistas islâmicos que vêm da Arábia Saudita. Por trás disso, tem mais política do que religião...".
A reportagem é de Andrea Tornielli, publicada no jornal La Stampa, 22-05-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Joannes Zakaria (foto), 61, bispo copta católico de Luxor, é um dos líderes do pequeno rebanho de egípcios em comunhão com a Igreja de Roma, apenas 400 mil dos 8 milhões de cristãos coptas. Nos últimos dias, uma outra igreja tornou-se alvo e foi incendiada por alguns muçulmanos que saíam das orações na mesquita.
Eis a entrevista.
O que está acontecendo no Egito é uma guerra religiosa?
Não acredito nisso. Os muçulmanos salafistas que se tornaram protagonistas dos ataques são fomentados por fragmentos dos velhos serviços secretos de Mubarak, que primeiro os usava para combater os Irmãos Muçulmanos e hoje os usa para criar um clima de tensão. Trata-se de ações que têm um fim político, o de aumentar as tensões e fazer com que se sinta falta do antigo regime.
A matriz islâmica dessas ações contra os coptas, no entanto, é evidente...
É preciso considerar que, hoje, os salafistas, assim como os Irmãos Muçulmanos e os integralistas da Jihad, querem assumir as rédeas da revolta, liderá-la, conduzi-la. Mubarak havia banido os extremistas. Depois que o presidente foi para o exílio e foi reaberto o aeroporto, voltaram para o Egito cerca de 3 mil fundamentalistas egípcios que haviam se refugiado no Afeganistão, na Bósnia e até mesmo no Irã.
No momento do grande protesto popular que derrubou Mubarak, cristãos e muçulmanos estavam lado a lado. O que mudou?
É verdade, cristãos e muçulmanos estavam juntos. E na praça Tahrir, quando os muçulmanos rezavam, os cristãos se colocavam ao seu redor para protegê-los. Mas, agora que Mubarak caiu, cada grupo tenta se apropriar da revolução. Em outros países de maioria muçulmana, está muito difundida a identificação do cristianismo com o Ocidente. No Egito, isso é mais difícil. A nossa Igreja é muito antiga, "copta" significa egípcio, porém miséria e ignorância facilitam as simplificações, até mesmo entre nós. Também é preciso ter presente que os coptas estão comprometidos em um testemunho muito ativo, estão presentes na cena pública.
O senhor teme que, com verdadeira democracia, se possa chegar a um governo que imponha a sharia [lei islâmica] ao país?
Durante a revolta nas ruas, os egípcios lutaram pelos seus direitos, e até a voz dos cristãos foi importante. Ainda teremos dificuldades, mas estou confiante de que muitos intelectuais islâmicos começarão a reconhecer que a imposição da sharia tornou-se falimentar no Sudão como em todos os lugares. Certamente, no Egito, 90% da população é muçulmana. Nós, cristãos, somos uma minoria. Há o risco de que se difunda sempre mais a mentalidade segundo a qual o atraso do progresso no Egito teria sido causado pela má aplicação da lei islâmica. Mas nós, coptas, também somos a minoria mais consistente e ouvida do Oriente Médio. No novo Egípcio, cristãos e muçulmanos devem poder conviver com igual dignidade e direitos.
O que eles os países ocidentais deveriam fazer, segundo o senhor, para favorecer o processo democrático?
Seus líderes temem os extremistas islâmicos, pensam nos interesses dos seus respectivos Estados e no petróleo. Mas também seria preciso pensar nas populações que vivem na miséria, presa fácil do fundamentalismo. Esses processos são combatidos construindo escolas, hospitais e criando postos de trabalho.
Em sua experiência cotidiana, como é o relacionamento entre cristãos e muçulmanos no Egito de hoje?
Como as pirâmides: na base, mais ampla, tudo é menos complicado, há relações de fraternidade e de amizade muito bonitas. Os problemas começam assim que você sobe até o cume, com as autoridades. Cada responsável tem medo do outro. Falta a maturidade, a capacidade de diálogo. Há muita ignorância, e isso em todos os grupos.
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Uma análise da violência contra os cristãos coptas - Instituto Humanitas Unisinos - IHU