02 Mai 2011
"A democracia se estiola sem a participação ativa dos cidadãos na vida política. Em suma, a democracia é uma grande aventura na aventura da história", escreve o sociólogo e filósofo francês Edgar Morin, em artigo publicado no jornal Le Monde, 26-04-2011. A tradução é do Cepat.
Eis o artigo.
Na maioria dos países árabes se colocam os difíceis problemas da transição da aspiração democrática à realização da democracia.
Aqui devemos considerar não tanto as lições da história, mas as lições da reflexão sobre a história. A primeira lição é que a democracia tem sido frágil e temporária na Europa moderna. Na França, a Revolução de 1789 degenerou em terror, depois houve Termidor, e em seguida o Império, cuja queda provocou a restauração da monarquia; foi preciso esperar o final do século XIX para se instaurar a Terceira República que o desastre militar de junho de 1940 destruiu em prol de Vichy.
Lembremo-nos de que no século XX, o fascismo destruiu a democracia italiana, que o nazismo destruiu a democracia alemã; que o franquismo destruiu a democracia espanhola, que a União Soviética instaurou, até 1989, seu totalitarismo nos países europeus que ela subjugou.
Mas também devemos pensar que na França, Itália, Espanha, Alemanha, nas democracias populares e na União Soviética, mesmo as ideias de 1789 regeneraram e reinstalaram, embora de forma desigual, a democracia.
Assim, a primavera árabe de 2011 poderá sofrer desvios, asfixias, confiscos, mas a mensagem vai renascer e renascer: ela tornou-se uma força regenerativa e regenerativa da história (a menos que a história humana descambe numa catástrofe generalizada).
Princípio de liberdade
A segunda lição da história é a da ecologia da ação acima mencionada; assim as exacerbações ditatoriais podem provocar as insurreições revolucionárias e os impulsos revolucionários podem desencadear ditaduras reacionárias, como foi o caso da Espanha, em 1936. Acrescentemos que as profundas divisões na República espanhola, entre anarquistas, comunistas, liberais, contribuíram para a sua derrota.
Em certo sentido, a primavera árabe foi uma consequência do agravamento dos despotismos e de seu domínio sobre as riquezas de seus países. Mas há também uma preocupação de que a primavera, dividindo-se, fragmentando-se e dispersando-se, pode provocar uma nova reação.
A terceira lição da história é a dificuldade de enraizamento da democracia. Nós acabamos de indicá-lo para a Europa. Trata-se de reconhecer as causas:
1. A democracia se alimenta de conflitos de ideias mesmo quando não está enraizada na consciência dos cidadãos; o conflito de ideias pode induzir à vitória de um partido que aboliu a democracia (Alemanha, 1933) ou levar à guerra civil (Espanha, 1936).
2. A democracia deve tolerar a expressão da ideia anti-democrática, mas poderia ser esmagada por um partido antidemocrático; até o ponto, até o momento em se deve manter a tolerância, uma vez que o princípio de "nenhuma liberdade para os inimigos da liberdade" tende a sufocar a liberdade.
3. A democracia é submetida ao jogo competitivo das verdades opostas, mas não há outra verdade que seu princípio de liberdade, e o sufrágio universal não está imune ao erro.
4. A democracia se estiola sem a participação ativa dos cidadãos na vida política. Em suma, a democracia é uma grande aventura na aventura da história.
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Da aspiração à realização democrática. Um artigo de Edgar Morin - Instituto Humanitas Unisinos - IHU