25 Julho 2012
Na Itália, um campo de concentração canino foi fechado e levantou a polêmica sobre a indústria da vivissecção, em que as experiências estão em crescimento, porque, dizem alguns cientistas, não há alternativa.
A reportagem é de Margherita D'Amico, publicada no jornal La Repubblica, 24-07-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
"Nenhum objetivo é tão alto a ponto de justificar métodos tão indignos", disse Albert Einstein. Em 2006, quase um século depois, Thomas Hartung, consultor científico da União Europeia e diretor do ECVAM (o centro europeu de validação dos métodos alternativos), escreveu na revista Nature: "Os testes com animais são ciência de má qualidade. Da sua substituição. depende a vida de milhões de seres humanos".
No entanto, ainda hoje, uma semana depois do sequestro de Green Hill [em que ativistas libertaram os cachorros, que seriam destinados para estudos científicos], a empresa da Bréscia onde se criam cães beagles destinados aos laboratórios de vivissecção, a lei internacional pende claramente em favor da experimentação com animais, considerada indispensável pelas empresas químico-farmacêuticas e por uma grande parte do mundo da pesquisa.
Na Itália e outros países, debate-se a respeito de uma diretriz europeia (a 63 de 2010) já próxima da implementação. Um procedimento muito contestado por ter desatendido as garantias basilares da proteção das cobaias e por ter desiludido aqueles que esperavam um substancial passo à frente com relação à normativa em vigor, datada de 1992, acerca da obrigação de recorrer a métodos alternativos à vivissecção. O descontentamento dos animalistas é forte em toda a parte, também na Itália.
Crueldade
Mesmo que nos últimos anos, na Itália, tenha sido registrada uma leve inflexão, de cerca de 5%, e o número dos exemplares utilizados nos experimentos tenha passado de 2.735.887 no triênio 2004-2006 para 2.6003.671 entre 2007 e 2009, registra-se, porém, um grande aumento das autorizações em derrogação: "São 30% a mais no último biênio, e trata-se de experimentos mais invasivos e cruéis, muitas vezes executados sem anestesia. Obtivemos esses dados de um refratário Ministério da Saúde, depois de uma disputa legal", explica Michela Kuan, responsável do setor antivivissecção da Liga Antivivissecção (LAV).
"Mais de 73% dos animais são usados para os estudos biológicos de base, pesquisa e desenvolvimento de produtos, e equipamentos para medicina humana e veterinária. Eles seguem os testes para a produção e o controle de qualidade para produtos e equipamentos (16%) e as investigações toxicológicas, os diagnósticos de doenças e a formação. Também está em aumento o uso de animais vivos e depois suprimidos para fins didáticos. Entre nós, os laboratórios de animais são cerca de 600. É difícil fazer uma avaliação do número dos criadouros, porque muitos laboratórios também produzem cobaias próprias, e muitas já geneticamente modificadas".
"Consideramos os animais como um gasto. Um sujeito geneticamente modificado é difícil de obter e pode custar até 5.000 euros. A experimentação com eles abrange 30% das nossas atividades. Os 70% restantes ocorrem in vitro, e eu acho que essa proporção vale mais ou menos para toda a atividade nacional", diz Giuseppe Remuzzi, coordenador de pesquisa do Instituto Mario Negri, de Bérgamo.
"Nós usamos apenas camundongos e ratos: no total das nossas três sedes, em 1990, contavam-se 33.832. Dez anos depois, tornaram-se 22.362 e, em 2010, 16.485. Mas certamente não somos os únicos que os usam. Quantos políticos nos dizem que são favoráveis à vivissecção, mas, para obter consensos, declaram o contrário".
Até mesmo no Ifom, a área de pesquisa experimental ligada ao Instituto Europeu de Oncologia de Umberto Veronesi, desde sempre inclinado em defesa dos direitos dos animais, faz-se vivissecção. "Segundo o ministério, os laboratórios de animais italianos acolhem 550 mil camundongos, mil cães em 2007, e 600 em 2009, 3.500 porcos em 2007, e 2.500 em 2009, 30 mil peixes agora reduzidos pela metade: usam-se os peixe-zebra, fáceis de manipular geneticamente", continua Remuzzi. Quanto às novidades que estão prestes a chegar à Europa, eles diz: "Eu não entendo certas contestações: a experimentação com animais de rua que deve ser introduzida não é praticada em nenhum laboratório de animais do mundo".
Rebate Vanna Brocca, diretora do Voce dei Senza Voce, periódico da associação Leal: "Nos EUA, os animais de rua são usados, e como. São comercializados pelos Class B Dealers, previstos pelo Animal Welfare Act, que operam com uma licença regular. Na Itália, felizmente, a lei 281 de 1991 proíbe isso. Mas eu me pergunto: se os laboratórios dizem que não precisam dos animais de rua, por que o artigo 11 da diretriz é totalmente dedicado à possibilidade de submeter cães e gatos de rua a testes em caso de 'ameaças ao ambiente ou à saúde humana ou à saúde animal?'".
Inutilidade
A objeção à vivissecção não se baseia apenas nas crueldades – porcos cujos pulmões são lesionados para efetuar longas respirações assistidas, antes de suprimi-los; implantes dentários inseridos nas patas de coelhos; cães cujos dentes são arrancados; camundongos de patas queimadas sobre placas elétricas são algumas das práticas descritas por um interessante dossiê realizado pela Nemesis Animale acerca dos laboratórios de animais da Lombardia –, mas sim na sua perigosa inutilidade.
As estimativas do Escritório dos Consumidores da União Europeia (BEUC) referem 197 mil cidadãos mortos a cada ano por causa dos efeitos colaterais dos medicamentos, enquanto na Itália o número de reações adversas apenas aos antibióticos seria igual a 1.643, contra 1.303 de 2008. Entretanto, os métodos alternativos, como testes in vitro, culturas celulares capazes de reconstruir órgãos de origem humana, métodos bioinformáticos que criam interações de moléculas no computador ou as pesquisas epidemiológicas, custam a decolar porque não são apoiados pela legislação. "Há um desperdício extraordinário de tecido humano que, ao contrário, seria muito precioso para a pesquisa", observa Michela Kuan. "Ao invés de criar e matar animais, se poderia utilizar órgãos removidos ou amputados, cordões umbilicais que são descartados e não se recuperam senão mediante prévia burocracia absurda".
"Testes gratuitamente cruéis? Eu nunca os autorizei", afirma Rodolfo Lorenzini, diretor do Serviço Biológico e de Gestão da Experimentação Animal do Instituto Superior de Saúde da Itália, que sugere: "Seria possível destinar parte dos fundos a estudos que não preveem o uso de animais. Seria uma abertura importante". Enquanto o médico e senador do Partido Democrático Ignazio Marino diz: "A indústria farmacêutica na Itália faturou 25 bilhões de euros, e 10% é reinvestido na pesquisa: se as empresas não veem a possibilidade de operar segundo as regras internacionais, elas se recusam".
Mas se trata de um progresso verdadeiro ou, ao contrário, de um favor à indústria sobre a pele dos inocentes? "Os vivissectores utilizam a experiência chamada DL 50: a Dose Letal para 50% dos animais utilizados. Isso consiste em alimentar à força um grupo de animais com uma substância particular até que a metade delas morra. Se considerarmos, por exemplo, a digitoxina (fármaco para a insuficiência cardíaca), essa substância apresenta nos camundongos uma DL 50 670 vezes superior do que nos gatos: como podemos sabemos qual valor pode ser significativo para o ser humano"?, lembra o biólogo Gianni Tamino. "Autorizam-se experimentos absurdos: por exemplo, levar camundongos à exaustão em uma roda muito rápida para depois fazê-los cair ao extremo das forças em um alçapão onde são decapitados: daí, examinam-se os fenômenos de deterioração dos tecidos. Tudo isso para um estudo sobre os esportistas", explica Marco Mamone Capria, professor de matemática da Universidade de Perugia e presidente da Fundação Hans Ruesch (nome do autor de Imperatriz nua, texto crucial do movimento antivivisseccionista na Itália).
"A lei de 1993, sobre a objeção de consciência à vivissecção" – acrescenta – "é sistematicamente boicotada pelas universidades italianas. Continua-se impedindo que os estudantes sejam informados como previsto pela lei que lhes permite se isentarem nos seus percursos formativos". E depois: "E a transparência nos laboratórios. Durante seis anos, fui membro do Comitê de Ética da minha universidade e pedi para entrar nos laboratórios de animais universitários: impossível". Sim: os órgãos responsáveis pelo controle do bem-estar animal nos laboratórios de animais são as ASL [Agência de Saúde Local], mas a lei não as obriga aos controles.
Fabrizia Pratesi, coordenadora do Comitê Científico Equivita, observa: "As próprias estatísticas indicam visivelmente que o que vale para uma espécie não é indicativo para outra, e as coincidências favoráveis também não exoneram da experimentação com cobaia humana. Sem falar em contradições clamorosas: as multinacionais química não produzem medicamentos, mas também pesticidas, herbicidas, transgênicos, fungicidas. Todos produtos testados em animais. É uma pena que quando se verifica algum desastre com efeitos sobre a saúde humana, as empresas se isentem das suas responsabilidades, dizendo que os testes com animais têm baixa confiabilidade".
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As experiências científicas na pele dos animais - Instituto Humanitas Unisinos - IHU