09 Abril 2012
O design moderno e os amplos espaços da casa situada no número 87 da Fasanenstrasse, em Berlim, destoam das construções históricas do tradicional bairro de Charlottenburg, na capital alemã. Semelhante a um bloco de vidro, a residência, que abriga desde o começo do mês uma família de quatro pessoas, é o mais novo projeto do governo alemão para tentar aliar construção civil e mobilidade a um estilo de vida mais sustentável.
A reportagem é de Renata Miranda e publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, 08-04-2012.
A Casa Eficiente Plus com Eletromobilidade - como foi batizada - foi concebida para produzir toda a energia que consome e ainda gerar um excedente que pode ser usado para abastecer carros elétricos ou ser devolvido à rede energética da cidade. A casa também foi construída apenas com materiais que podem ser reciclados, caso sua estrutura precise ser modificada.
"A gestão responsável dos recursos e a proteção do meio ambiente estão, sem dúvida, entre as missões mais importantes da política e da sociedade, sendo a questão da eficiência energética um ponto determinante", afirmou o ministro Peter Ramsauer, do Ministério dos Transportes, Obras e Planejamento Urbano da Alemanha, órgão responsável pelo projeto.
De acordo com o governo alemão, a construção e o transporte desempenham um papel fundamental neste cenário, na medida em que estes dois setores são, conjuntamente, responsáveis por cerca de 70% do consumo final de energia e por aproximadamente 40% da totalidade das emissões de CO2.
"No setor da construção, a manutenção de edifícios novos de impacto neutro no ambiente já deverá ser possível a partir de 2019", explicou Ramsauer. "Queremos criar possibilidades de combinação de edifícios eficientes com a eletromobilidade. A Casa Eficiente consegue tornar essa determinação em realidade de uma forma exemplar."
Diretriz
O projeto do governo alemão atende a uma reformulação da diretiva comunitária para o desempenho energético dos edifícios da União Europeia que exige que, a partir de 2021, as casas só consumam energias que possam ser produzidas com base em materiais energéticos renováveis.
"Os padrões para consumo energético na Alemanha são renovados a cada três anos, sempre exigindo um consumo menor de energia por parte dos cidadãos", explicou ao Estado o arquiteto Dieter Blome, do Centro para Energia, Construção, Arquitetura e Meio-Ambiente (Zebau, na sigla em alemão), em Hamburgo. "Acredito que daqui dez anos teremos a Casa Eficiente Plus como padrão para as construções residenciais na Alemanha."
Segundo ele, o projeto da casa também faz parte da estratégia do governo alemão de desligar todas as suas usinas nucleares até 2022. Em maio do ano passado, a chanceler Angela Merkel disse que esperava que a Alemanha se tornasse um "exemplo internacional", sendo possivelmente a primeira nação industrial a passar da era nuclear à era das energias renováveis. "É uma maneira de pensarmos na produção de energia fora do âmbito nuclear", afirmou Blome.
Futuro
Mais de 130 famílias alemãs se inscreveram para morar durante 15 meses na casa sustentável de Berlim. A família vencedora foi escolhida no fim de dezembro por meio de sorteio feito pelo governo. "Os valores e o comportamento da sociedade alemã estão mudando", disse Blome. "Hoje as pessoas ficam com peso na consciência se estão escovando os dentes e esqueceram a torneira ligada. Estamos vivenciando uma mudança no estilo de vida alemão."
A casa ficou aberta para visitação do público de 8 de dezembro a 29 de fevereiro para ver como a população interagiria com esse novo tipo de tecnologia. "É uma oportunidade para vermos se conseguimos nos adaptar a esse estilo de vida", disse a estudante de Planejamento Urbano, Malin Praktiknjo, de 23 anos, que conduzia visitas guiadas pelo projeto. "Temos o dever de reduzir nossa necessidade de consumo energético e, se as legislações necessárias forem aprovadas, o universo apresentado nesta casa pode ser o nosso futuro."
'No futuro, prédio poderá ser reciclado no fim de sua vida útil'
O projeto da Casa Eficiente Plus com Eletromobilidade foi escolhido por meio de concurso, vencido pela equipe do arquiteto Werner Sobek, da Universidade de Stuttgart.
Envolvido na primeira parte do projeto, o arquiteto e pesquisador Christian Bergmann, do Instituto de Estruturas Leves e Design Conceitual (Ilek, na sigla em alemão), da mesma instituição de ensino, disse que o setor de construção civil precisa cada vez mais se adaptar a padrões sustentáveis para tentar parar o aquecimento global. "A sustentabilidade é a chave para o futuro", disse Bergmann.
Eis a entrevista.
Qual é a relevância de um projeto como esse na construção de um estilo de vida que seja mais sustentável?
O design proposto demonstra o potencial de acoplar os fluxos energéticos de veículos elétricos e construções civis. O projeto não apenas ilustra a possibilidade de construir residências familiares que gerem um excedente significante de energia, mas também demonstra como os prédios do futuro podem ser projetados e construídos para permitir uma reciclagem completa no fim de seu ciclo de vida útil. A abordagem usada pela equipe que projetou a casa em Berlim leva o conceito de "design sustentável" para um outro nível.
O fato de os veículos elétricos não liberarem emissões e precisarem de uma infraestrutura de abastecimento entre as cidades está fazendo com que o estilo de vida do futuro e os conceitos de mobilidade cresçam cada vez mais de maneira interligada.
Esta casa é apenas mais um exemplo do envolvimento do governo alemão com projetos sustentáveis. Por que, na sua opinião, há tanto investimento nesta área na Alemanha?
Eu não posso falar pelo governo alemão, mas no mundo inteiro já é reconhecido que a sustentabilidade, em seu sentido mais amplo, é a chave para o futuro. O setor de construção tem um importante papel nesta discussão, já que é o responsável por cerca de 35% do consumo total de energia e 35% das emissões de dióxido de carbono. Por isso, planejar e construir casas de eficiência energética é um passo importante para atingir os objetivos europeus de redução das emissões de dióxido de carbono para parar o aquecimento global.
Desde o início do mês, uma família de quatro pessoas está vivendo na casa sustentável de Berlim. Se essa experiência der certo, podemos esperar no futuro mais projetos como este?
Ter uma família morando no projeto faz parte do processo de pesquisa que desenvolvemos. O projeto está sendo monitorado com centenas de sensores que recolhem informações importantes para otimizar todos os parâmetros possíveis para futuras ideias.
Além disso, também servirá para descobrir como as pessoas utilizam a casa e seus veículos elétricos e como certos fluxos de energia estão se comportando durante o dia e a noite e durante o inverno e o verão.
O projeto deve fomentar o debate da sustentabilidade no setor de construção e, esperamos, também inspirar pessoas a investirem nessa área. Tanto no setor público quanto no privado, tenho certeza de que podemos esperar mais projetos de energia eficiente no futuro.
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Berlim constrói primeira casa sustentável - Instituto Humanitas Unisinos - IHU