24 Julho 2013
O discurso do Papa Francisco, voando para o Brasil, sobre os jovens e trabalho tem um valor de fé e pastoral que teólogos e especialistas católicos ião aprofundar. Mas, paralelamente, tem uma relevância para a economia e para o desenvolvimento das nossas sociedades, que todos podemos considerar.
A reportagem é de Gianni Riotta, publicada no jornal La Stampa, 23-07-2013. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Diz o papa: "Corremos o risco de ter uma geração inteira que nunca encontrou trabalho...". Aqueles trabalho do qual "vem a dignidade pessoal de se ganhar o pão... A crise mundial não faz coisas boas com os jovens, visto que, no mercado, um desempregado tem sempre mais dificuldade para obter um emprego".
Considerem esse raciocínio à luz da pesquisa que o New York Times publicou no dia 19 de julho: os graduados depois da grande crise financeira, de 2009 a 2012, nos Estados Unidos, país que cria postos lentamente, mas com maior vigor do que a média da União Europeia, e muito mais rapidamente do que a Itália, custam a trabalhar, porque as empresas penalizam os seus dois, três anos de desemprego, preferindo jovens "frescos" graduados em 2013.
Um posto em um bar, o trabalho de vendedor para pagar o aluguel, não só não comovem os recrutadores, mas, paradoxalmente, os deixam desconfiados. O desemprego é considerado causa de frustração, decepção, confusão pessoal. Melhor dar chance a quem sai da universidade ainda cheio de entusiasmo. Ainda mais que, demonstram as análises da agência Ernst & Young, nenhuma grande empresa oferece trabalho mais por anúncios diretos, preferindo selecionar o pessoal por recomendação privada ou entre aqueles que já fizeram, quase sempre graças a amigos da família, estágio junto à empresa.
O papa disse com simplicidade aquilo que as mais sofisticadas análise de mercado comprovam: o desemprego é uma armadilha, areia movediça onde uma geração e milhões de jovens não só correm o risco de perder o seu próprio futuro, mas encontram solidão pessoal difícil de superar. A ideia de que essa é uma condição humana a ser delegada aos cidadãos individuais, talvez dando-lhes conselhos justos sobre o curso de pós-graduação a escolher, as línguas a aprender, as habilidades a se dotar, e não, ao contrário, uma emergência global para as economias desenvolvidas e os países novos é perigosa e levará a instabilidades, no Cairo e Istambul, em Detroit e Pequim, em Roma e Paris.
Sintetiza Justin Wolfers, economista da Universidade de Michigan: "Criamos uma economia em que os jovens formados buscam trabalhos desenvolvidos antigamente pelos pós-graduados. Os pós-graduados se contentam com postos para aqueles que não estudaram, e aqueles que não estudaram continuam como trabalhadores precários".
O Papa Francisco denuncia a cultura da degradação do trabalho, que certamente não será corrigida com propostas de lei ad hoc, mas recriando novos postos de trabalho e não se iludindo. O diretor Calabresi escreveu há alguns dias para se "defender" um status quo que se dissolve sem parar, sem que empresários e sindicalistas possam deter a realidade: "Estamos acostumados a essa cultura do descarte: com os idosos se faz isso muitas vezes, e é uma injustiça, porque os deixamos de lado, como se não tivessem nada para nos dar, e, ao invés, eles nos transmitem a sabedoria e os valores da vida, o amor pela pátria, o amor pela família: todas coisas de que precisamos. Mas agora também os jovens são descartados... Devemos cortar esse hábito de descartar as pessoas", propondo "uma cultura da inclusão, do encontro, e um esforço para trazer a todos para a sociedade".
A organização industrial clássica do século XX não bastará para salvar a geração dos sem trabalho, nem no Ocidente, nem nos países do novo desenvolvimento, e quem se obstina a afirmar isso trai os desempregados, e não os ajuda. As autoridades do Rio de Janeiro proibiram o uso de toda máscara tradicional nos encontros do papa, temem que os protestos que sacudiram o país se reverberem ao longo da viagem do pontífice.
Francisco não parece compartilhar essas preocupações e antecipa o tema social antes mesmo de pôr os pés no Brasil. "Questão de credibilidade", explica o teólogo Ramon Luzarraga. "As pessoas agora acreditam mais nos exemplos do que nas mensagens. Quando João Paulo II pregava contra o totalitarismo, ele era crível, porque tinha sofrido isso na Polônia. Francisco viu a pobreza nas paróquias de Buenos Aires e, se fala dos excluídos, as pessoas comuns o ouvem".
O papa também sabe que a crise não é apenas econômica, que em 1970 92% dos brasileiros se professavam católicos, buscando abrigo na fé contra opressão e pobreza, devastantes em regiões como o Nordeste. Hoje, 62% dos brasileiros se dizem católicos, mas faltam nesse apelo milhões de fiéis que passaram aos pentecostais e aos seus ritos apaixonados, de comunidades capaz de envolver os excluídos.
País com mais católicos do mundo, o Brasil vê, portanto, a sua Igreja mudar. O padre Marcelo Rossi adota ritmos, músicas, cerimônias desencadeadas pelos pentecostais, oferecendo uma alternativa aos fiéis. Milhões de discos e livros vendidos, milhões de fiéis reunidos nos estádios fazem da Renovação Carismática Católica de Rossi uma realidade inesperada.
O papa argentino sabe disso, mas também sabe que os ritos sozinhos não mudam as realidades. Ele lança, na sua primeira viagem para a Jornada Mundial da Juventude, uma mensagem que não vai ressoar apenas nos lugares de culto. Ele fala aos líderes políticos, aos homens das empresas e das finanças, aos sindicalistas, aos técnicos. No século XXI, é possível trabalhar em uma economia "inclusiva", livre e capaz de produzir inovação e riqueza, sem, contudo, deixar para trás – como se fossem grãos de areia perdidos – os seres humanos que, na ampulheta do presentes, deslizam hoje para a esfera inferior.
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Uma economia inclusiva é possível. O discurso de Francisco - Instituto Humanitas Unisinos - IHU