01 Mai 2013
Ativistas dos direitos das mulheres do Femen chegaram à Alemanha, e estão com o patriarcado na mira. Elas estão fazendo sessões de treinamento para mulheres jovens, ensinando-as a escapar da segurança nos protestos – enquanto mostram os seios em nome do feminismo.
A reportagem é de Fabian Reinbold, foi publicada na revista alemã Der Spiegel e reproduzida pelo portal Uol, 28-04-2013.
Josephine Witt pega o homem desprevenido. Seu primeiro soco o atinge no rosto, então ela ataca repetidamente sua barriga e bate em suas costelas. A jovem de 19 anos força seu oponente a ficar na sua frente, e ele esquece de bater de volta por 10 a 20 segundos. "Mantenha-a ocupada, Sven!", grita o treinador. As lutas de boxe de Witt se movem no ar. Uma coroa de girassóis adorna seu cabelo. Bem vindo ao treino de boxe com o Femen.
As ativistas que fazem topless pelos direitos das mulheres chegaram à Alemanha. Jovens mulheres fundaram filiais em Berlim e Hamburgo, segundo o exemplo da fundadora do Femen, a ucraniana Anna Hutsol. As militantes feministas tomaram o distrito da luz vermelha de Hamburgo, protestaram contra o Partido Nacional Democrático, de extrema direita, em Berlim, e mais recentemente gritaram contra o presidente russo Vladimir Putin na feira industrial de Hanover.
As auto-intituladas "sextremistas" têm treinamentos para esses tipos de protestos, incluindo um numa academia de boxe Hamburgo. "Queremos aprender a cair corretamente, saber como se esquivar rapidamente do pessoal de segurança", diz Irina Khanova, que nasceu na Rússia e mora em Hamburgo. Até mesmo transeuntes já atacaram as mulheres. "Precisamos conseguir passar nossa mensagem pelo maior tempo possível." O treinador concorda com um aceno de cabeça. "Você tem que tirar a maquiagem. A guirlanda de flores pode ficar."
A missão do Femen é atacar o patriarcado alemão. Mas todas as suas atividades levantam algumas questões: qual é exatamente a "mensagem" dos protestos seminus? As imagens de mulheres jovens e seminuas gritando chegam facilmente às manchetes, e o tom áspero ("Foda-se o islamismo", por exemplo) é provocativo. O grupo é perfeito para dominar o jogo da mídia. Mas será que isso é o novo feminismo, ou meramente um truque sensacionalista?
No dia de treinamento no sábado, a máquina de relações públicas do Femen estava presente o tempo todo. Uma equipe de câmera da emissora pública alemã NDR, do norte do país, ficou ali o dia inteiro. No início do dia, nos estúdios da TV, sete mulheres jovens – a maioria delas estudantes universitárias - pintaram seus slogans de luta uma na outra.
Witt tem a frase "Foda-se Ditador" pintada em seus seios, como no recente protesto anti-Putin. Hellen, 23 , escolheu "A Primavera das Mulheres está chegando", enquanto a parte superior do corpo de Anne diz "Abaixo a indústria do sexo". Khanova, que aos 33 anos é a mais velha do grupo, dá ordens: abram mais suas pernas, coloque o punho para cima, mantenha as guirlandas de flores paralelas às lentes da câmera. Um fotógrafo registra tudo – a página do grupo no Facebook é atualizada diariamente com novas fotos.
Então, as mulheres saem em direção à principal praça de Hamburgo, onde se despem e gritam para as câmeras de TV: "Feeeeemeeennn" Pedestres começam a pegar suas próprias câmeras, alguns deles sorrindo. "Ah, as ucranianas. Elas estão lutando pelas mulheres de lá", diz um homem.
Falso, caro senhor. A luta do Femen está acontecendo na Alemanha, também. "O patriarcado na Alemanha também tem de ser derrubado", diz Khanova. "Fazemos parte de um movimento mundial, e queremos resolver os problemas globais na Alemanha", acrescenta Witt.
Críticas de muçulmanos e feministas
O grupo recebeu o seu quinhão de críticas. Depois de um protesto em uma mesquita de Berlim como parte do "Dia da Topless Jihad", as mulheres muçulmanas acusaram o Femen de menosprezá-las. E depois que elas pintaram o famoso slogan nazista "O trabalho vos libertará" no portão para a Herbertstrasse, uma das principais ruas de prostituição de Hamburgo, em protesto contra a prostituição forçada, houve desaprovação dos setores convencionais da Alemanha e uma crítica cáustica por parte da cena feminista. A atitude foi rejeitada e considerada ridícula e sem sentido na melhor das hipóteses, e condenada como algo no limite do antissemitismo e islamofobia, na pior delas.
As próprias ativistas não entendem a enxurrada de críticas. "As mulheres muçulmanas merecem a mesma liberdade que nós temos", diz Witt, estudante de filosofia. Não há planos para parar com os protestos da "Topless Jihad". E sim, elas acham que a exploração na indústria do sexo é de fato comparável ao trabalho forçado dos judeus. "A cena está levando a uma discussão teórica", acrescenta Witt. "Estamos trazendo de volta o ativismo."
O curto manifesto do Femen é o seguinte: o patriarcalismo se apoia na tirania política, na indústria do sexo e na religião. Em outras palavras, Putin, Herbertstrasse e a mesquita.
Sua ideologia também foi resumida num post do Facebook: "a nudez feminina, livre do sistema patriarcal, é o coveiro deste sistema, como uma declaração militante e um símbolo sagrado de libertação das mulheres". Além disso, ninguém ouvia as mulheres quando elas estavam vestidas. O grupo ucraniano tentou protestar dessa maneira por dois anos, sem grande sucesso. Desde então, os sutiãs vêm caindo.
Mulheres gordas e mais velhas são proibidas?
Durante os grandes debates sobre o sexismo, o racismo e o antissemitismo na Alemanha este ano, o Femen estava presente. Para um punhado de mulheres que querem provocar, não se trata de uma conquista pequena. Mas será que tudo isso servirá para promover a igualdade de direitos?
Uma acusação é de que as ativistas estão jogando com a objetificação sexual e os ideais dominantes de beleza. Na prática, as integrantes do Femen são quase que exclusivamente jovens e magras. Isto se tornou um tópico de discussão dentro do grupo, também. Muitas temem que elas estejam assustando as outras mulheres. Khanova diz que todas são convidadas a participar, mas as mulheres mais velhas normalmente acham o ativismo do Femen muito ultrajante.
Tudo o que você precisa fazer é conseguir gritar. Após a sessão de treinamento de boxe, o Femen ensaia sua forma de protesto. Um tapete de ginástica azul serve como arena para a luta contra o patriarcado. Witt aproxima-se com velocidade, e no momento em que coloca os dois pés firmemente plantados no tapete, levanta o braço e ruge "Foda-se Putin!" para todo o ginásio, tão alto que o grito parecia ser capaz de chegar até Moscou. Quatro outras pessoas fazem o papel de seguranças. Eles agarram Witt, ela se contorce e luta e continua gritando alto. Sete, oito, nove vezes "Foda-se Putin" – para os padrões do Femen, aí está um ótimo protesto.
Khanova a elogia, e repete que elas precisam espalhar a mensagem pelo maior tempo possível. Ela admite que não sabe quanto tempo o método do Femen vai funcionar. "A sociedade está dessensibilizada, temos de ser cada vez mais provocadoras", diz ela. Mas ela não quer se preocupar com isso. "Isso continuará existindo pelo tempo que for."
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Em treinamento, Femen busca resistência para enfrentar equipes de segurança nos protestos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU