20 Abril 2013
Com direção de Camilo Tavares, filho de Flávio Tavares, jornalista, o filme O Dia que Durou 21 Anos segue em cartaz nos cinemas com recepção positiva de público e crítica. O longa aborda um capítulo nebuloso no golpe que derrubou o presidente João Goulart, em 1964, e colocou o Brasil sob a ditadura militar: a ação direta do governo dos EUA para tirar Jango do poder, interferência que o filme comprova com documentos e gravações então inéditas garimpadas em arquivos de Washington. Ex-preso político que viveu por anos exilado, Tavares assina a produção do filme.
A entrevista com Flávio Tavares é de Marcelo Perrone e publicada pelo jornal Zero Hora, 20-04-2013.
Eis a entrevista.
Algumas sessões do filme em Porto Alegre se encerram sob aplauso do público. A que o senhor atribui essa reação?
Isso tem sido comum também em outras cidades, como São Paulo, Brasília e Rio de Janeiro. Acho que o filme reflete o interesse que todos nós temos em buscar a verdade. E a grandeza do filme está em revelar essa verdade. Os aplausos não são só de quem viveu aquele período, mas também de jovens. Posso explicar essa reação no fato de as novas gerações não saberem o que representou o golpe. Uma coisa é saber que uma bofetada dói. Outra coisa é levar uma bofetada. O filme é uma bofetada, e o público agradece, no sentido de ser despertado.
Um dos elogios que se faz ao documentário é de apresentar o outro lado da história e dar voz a golpistas, entre eles o polêmico general Newton Cruz. O senhor mesmo realizou as entrevistas. Eles sabiam com quem falavam?
O filme não faz nenhum tipo de apologia, apenas apresenta documentos. O Newton Cruz é um sujeito expansivo, com aquele jeitão de – entre aspas – “maluco”. Ele me disse depois da entrevista: “Então quer dizer que você era subversivo?”. Disse que tínhamos coisas em comum, pois ele também é um crítico do governo americano. Daria para fazer um outro filme só com o Newton Cruz. Quando ele viu o filme, disse que não sabia desse envolvimento dos EUA no golpe, o que não é improvável na lógica da hierarquia militar, em que poucos sabiam da articulação. O Jarbas Passarinho representa aquele tipo de intelectual, o bonzinho. Disse que me conhecia como jornalista e ficou surpreso quando falei que ele tinha assinado o documento da minha extradição. Segundo ele, o documento foi preparado pelo Conselho de Segurança Nacional e era comum ele assinar papéis daquele órgão sem ter pleno conhecimento do conteúdo.
Quais foram outras descobertas importantes além dos documentos?
Nos primeiros momentos do golpe aparecem imagens raras de Porto Alegre, que descobrimos nos arquivos americanos. Pouca gente percebe isso no filme. Tem uma cena de repressão a militantes no Mercado Público. Aparece o Lincoln Gordon desembarcando na Capital em um avião da força aérea americana, ele numa homenagem no Palácio Piratini com o Ildo Meneghetti, na prefeitura, quando ainda estava no cargo de prefeito o Sereno Chaise, e até num churrasco em Uruguaiana. Dez dias após o golpe, o Lincoln Gordon veio ao Estado como se fosse para tomar posse, observar a olho nu que o território fora conquistado, pois o Estado era o bastião mais temido. E como bastião mais temido aparece citado nas centenas de documentos da CIA e da embaixada dos EUA que manejamos.
Camilo disse em entrevista a ZH que planeja realizar ainda um documentário sobre o Serviço Nacional de Informação (SNI) do governo militar e outro sobre o papel da União Nacional dos Estudantes (UNE) durante a ditadura. O senhor vai participar?
Sim. Esse sobre o SNI está mais adiantado. Quando começamos o projeto de O Dia que Durou 21 anos trabalhamos nos arquivos no SNI, mas desviamos o foco quando encontramos os documentos secretos nos arquivos americanos.
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O Dia que Durou 21 Anos. “Este filme é uma bofetada” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU