16 Outubro 2014
O cardeal Péter Erdö se defende pela relatio intermediária: "Espero que o texto final possa ser aceito pela grande maioria". Estes são os dias dos círculos menores. O grupo italiano pede a gratuidade da nulidade das núpcias religiosas.
A reportagem é de Giovanni Cedrone, publicada no jornal La Repubblica, 15-10-2014. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
No Sínodo extraordinário sobre a família, convocado no Vaticano pelo Papa Francisco, busca-se uma mediação depois da ofensiva dos bispos conservadores que atiraram à queima-roupa contra a Relatio post disceptationem do cardeal Erdö.
Foram tantas as polêmicas depois da síntese da primeira semana de trabalhos sinodais que, segundo alguns, teriam sido censuradas as posições mais tradicionalistas sobre a Comunhão aos divorciados, casais de fato e uniões gays.
A Sala de Imprensa da Santa Sé, nessa terça-feira, divulgou uma nota em que se lembra que o relatório é apenas um "documento de trabalho". E nessa quarta-feira chegaram dos círculos menores os primeiros pedidos de modificação ao relatório, como explicado pelo arcebispo de Barcelona, cardeal Lluis Martinez Sistach.
Entre as demandas, surgiu a de "enfatizar mais a beleza e a importância do modelo da família cristã". O próprio cardeal, sobre as divisões dentro da assembleia, explicou que "da diversidade pode surgir a luz".
Nessa quarta-feira, o cardeal Péter Erdö, arcebispo de Budapeste e relator-geral da cúpula, tentou aplacar os ânimos. Ele reiterou que "há pontos de vista diferentes", mas não há nenhuma divisão em "facções no sentido de partidos políticos que lutam pelo poder".
O cardeal acabou sob acusação por causa da relatio intermediária e esclareceu: "Eu acho que o interesse da mídia mundial é tão grande que, talvez, viram em alguns parágrafos mais do que realmente foi dito. Por isso, penso que, durante esta semana, será possível chegar também a uma maior clareza, que não deixe nenhum equívoco nos capítulos individuais".
E defendeu o relatório que, na sua opinião, "contém ao menos os temas principais da discussão". "Esperamos chegar – desejou Erdö – a um relatório final que possa ser aceito pela grande maioria. Ainda mais que esse texto não era nem um texto votado, mas um texto intermediário para o trabalho posterior".
Nessa terça-feira, o cardeal alemão Gerhard Müller, prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé (o ex-Santo Ofício), definira o relatório como "indigno, vergonhoso, completamente equivocado", e ele não tinha sido a única voz crítica da frente conservadora.
O cardeal Camillo Ruini, ex-presidente da Conferência Episcopal Italiana, também interveio sobre um dos temas mais candentes da cúpula, o da Comunhão aos divorciados em segunda união, e alertou contra a tentativa de "mudar o direito divino".
Ruini lembrou que a prática da Igreja está fundamentada nas Sagradas Escrituras, e a norma que veta os divorciados em segunda união de ter acesso à Eucaristia é uma norma de "direito divino".
Aberturas
Aos purpurados mais tradicionalistas, a resposta vem do cardeal alemão Walter Kasper, promotor no Sínodo de uma abertura à possibilidade de conceder, em alguns casos e depois de um caminho penitencial, a Comunhão aos casais de divorciados em segunda união.
Segundo Kasper, há uma "maioria" dos padres sinodais a favor da sua tese, mas ele prevê que, sobre o tema, será o Sínodo ordinário convocado para 2015 que irá expressar uma opção. O cardeal alemão defende que o papa, para promover algumas grandes mudanças, "quer uma maioria do episcopado com ele", porque "ele não pode agir contra a maioria do episcopado".
Essa quarta-feira foi o dia dos círculos menores, cujo relatório será entregue nesta quinta-feira à Congregação Geral, para a elaboração posterior da Relatio synodi, o documento final que deverá ser apresentado e aprovado no próximo sábado. Os círculos menores trabalham, cada um, na língua das suas próprias Conferências Episcopais e dioceses, e fornecem o material de discussão ao Sínodo, depois da Relatio ante disceptationem, da Disceptatio e da Relatio post disceptationem, todos passos dados na Aula do Vaticano na presença do Papa Francisco, que, na manhã dessa quarta-feira, na Audiência geral, convidou os fiéis a rezarem pelo Sínodo.
O Papa Bergoglio – que nessa quarta-feira se encontrou com os parentes de alguns desaparecidos argentinos – enviou uma mensagem ao bispo de Ávila, Dom Jesús García Burillo, por ocasião da abertura do Ano Jubilar Teresiano pelo quinto centenário do nascimento de Santa Teresa de Jesus. "Como eu gostaria, nestes tempos, de comunidades cristãs mais fraternas", escreveu o pontífice, que convidou a "ir na verdade da humildade que nos liberta de nós mesmos, para amar mais e melhor aos outros, especialmente os mais pobres".
Nulidades gratuitas
Coube a Dom Rino Fisichella, presidente do Pontifício Conselho para a Nova Evangelização, explicar o trabalho do círculo menor em língua italiana. O purpurado especificou que "não votaria" no relatório intermediário, como foi apresentado pelo cardeal Erdö, e também comentou o plano do executivo Renzi sobre as uniões civis entre pessoas do mesmo sexo no modelo das parcerias civis alemãs: "A sociedade deve abordar temáticas desse tipo com método democrático, com um debate parlamentar, sem isolar nenhuma posição que não se encaixe no common understanding".
Para o ex-capelão da Câmara dos Deputados italiana, será fundamental ver qual solução será encontrada, e só então a Igreja poderá expressar uma opinião favorável ou crítica. Nos últimos dias, Dom Bruno Forte, secretário-especial da cúpula, destacou a necessidade de chegar a uma legislação a respeito, definindo-a de "um ato de civilidade".
Quanto à questão da Comunhão aos divorciados, Fisichella destacou a demanda dos círculos menores de língua italiana de encontrar uma fórmula que leve à gratuidade da nulidade das núpcias religiosas, para que "não se levante a menor suspeita sobre o fato de que a Igreja intervém nessas causas de nulidade dos matrimônios canônicos com outras finalidades", como às vezes se acusa em relação ao trabalho da Sacra Rota.
Um pedido ao qual logo se somou o grupo de língua espanhola, moderado pelo cardeal Lluis Sistach. "A crise da fé está na origem da crise da família. Onde a fé é forte, a família não é submissa a propostas atraentes, mas efêmeras, da cultura contemporânea", acrescentou Fisichella, que, sobre as coabitações, convida a distinguir: "Não são todas iguais, existem diferenças. Há as coabitações abertas ao matrimônio religioso ou ao civil, e as coabitações em que não se encaixam e não se encontram os critérios da estabilidade e da fidelidade. Há elementos positivos em todas as realidades, mas estamos falando de uma família?".
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''Como eu gostaria de comunidades cristãs mais fraternas'' - Instituto Humanitas Unisinos - IHU