Por: Jonas | 29 Julho 2014
Susana Saulquin (foto) é uma dessas pessoas que deixam pegadas porque vão abrindo caminho. Estudou sociologia na Universidade de Buenos Aires, mas sempre foi uma espécie rara, muito bem vestida para esse ambiente. Foi assim até que entendeu que a sua questão estava em unir a paixão pelo vestir com a que tem pela sociologia, naquilo que ela própria batizou como análise sociológica da moda. Nesse caminho, em 1986, cria e dirige o Instituto de Sociologia da Moda, dedicado à consultoria, ensino e pesquisa do universo têxtil, da indumentária e das modas. Participou na criação da carreira de Design de Indumentária e Têxtil, na Faculdade de Arquitetura, Design e Urbanismo, da UBA (FADU). E, em 2012, criou e atualmente dirige a pós-graduação em Sociologia do Design, FADU-UBA. Além disso, é professora na graduação e pós-graduação em diferentes universidades do Chile, Brasil e Argentina.
Fonte: http://goo.gl/jaEvpA |
Além da docência, sua outra grande paixão é escrever. Seu último livro: ‘Política de las apariencias. Nueva significación del vestir em el contexto contemporáneo’ (Paidós, Entornos 23). Também publicou ‘Historia de la moda argentina’ (Emecé) e ‘La muerte de la moda, el día después’, entre outras publicações.
As novas tendências do design caminham para uma produção que supere o massivo, que implica em exploração, consumismo e depredação do planeta. É assim que enxerga Susana Saulquin, uma socióloga que dedicou o seu estudo ao vestir. Aqui, explica a razão da sociedade já não ser disciplinar nesse terreno, mesmo que continue sendo controladora, é mais complexa, disse.
“A moda não é tolerância, a moda é autoritarismo”, disse Susana Saulquin, socióloga de pensamento original, que há várias décadas reflete sobre o vestir e as tendências da moda. Em seu novo libro, ‘Política de las apariencias. Nueva significación del vestir en el contexto contemporáneo’ (Paidós, Entornos 23), afirma que o design do futuro se baseará em “séries curtas, no comércio justo e, sobretudo, o mais importante, em trabalhar em cooperativas”. “Somente o design independente, em pequenas séries, pode chegar a ser sustentável”, e neste século, onde a ética será um valor fundamental, desenvolver indumentária sustentável prevalecerá. Fica para trás o massivo porque “o seriado segue unido à exploração, ao consumismo e é depredador do planeta”.
Nesta entrevista, Saulquin aborda esta e outras questões, desde o uso político do vestir, o tão comentado luto da Presidente [Cristina Kirchner] (“a vestimenta é uma ferramenta política”), até a relação das mulheres com sua imagem, seu corpo e a moda: “Quando você tem quilos a mais, você é você, ao passo que se é muito magra, [fica como] são todos os corpos, esqueléticos, iguais, as mulheres até se parecem. De alguma forma, os quilos dão identidade para você”, afirma.
A entrevista é de Sonia Santoro, publicada por Página/12, 28-07-2014. A tradução é do Cepat.
Eis a entrevista.
Como e quando você despertou o interesse pela moda?
A minha mãe gostava muitíssimo de se vestir, ia aos desfiles. Não comprava muito, mas gostava de estar sempre bem vestida, então, desde pequena sempre dei muita importância para isso. Era uma época onde a elegância tinha um peso muito importante e também a aspiração em se vestir e estar elegante como sua mãe. Nada a ver com os anos 1960, que é quando se faz a ruptura, e justamente a elegância e a distinção era algo totalmente fora de contexto. Buscava-se a funcionalidade e o estar juvenil. Ter uma atitude juvenil, sendo que a década anterior era o contrário: ter uma atitude elegante. Depois, o bom gosto e a elegância saem completamente de contexto. Inclusive, Pierre Bourdieu escreve ‘A distinção’, no ano de 1961, e nos anos 1960 começa uma etapa totalmente diferente. Nessa época, eu inicio a faculdade.
E como se vivia isso?
Eu estudava sociologia na UBA, em Filosofia e Letras. Em uma aula de Ciência Política, um companheiro me disse que eu não podia opinar porque estava muito bem vestida. Eu disse, uau, que importante deve ser isto, se é que eu não posso ter uma opinião por estar supostamente bem vestida. Eu não estava vestida com os parâmetros dos alunos de sociologia, que estavam vestidos de acordo com o existencialismo, que havia se dado 20 anos atrás. Todos se vestiam de preto. Havia uma atriz que se chamava Julie-tte Gréco, que também se vestia de preto e todos adotavam esse estilo: colarinhos altos, suéter negro, saias longas e justas, cabelo preto. Nada a ver comigo, que era loira... não tinha o ‘physique du rôle’ das sociólogas da época.
Como foi da sociologia à moda?
Eu tive que fazer sozinha, porque eu estudei sociologia. A teoria dos grupos e como os grupos lidam com suas relações de poder sempre me interessavam. Em uma época em que se falava dos movimentos de libertação, é claro. Isto foi anterior à Revolução Cultural de Mao. Então, um professor, Manolo Mora y Araujo, disse-me que as minhas hipóteses não correspondiam a uma socióloga. Eu já construía as minhas hipóteses e falava da imagem e a aparência. Sempre me interessou ver como as pessoas se vestiam para determinadas coisas. Sempre fui uma outsider, uma pensadora independente.
Nesses espaços, pensar na moda era um escândalo...
Mas, por favor, estava totalmente depreciado, era a frivolidade. O preconceito é tão grande. Sendo professora de Sociologia, nunca pude fazer minha carreira nas Ciências Sociais. Tive que fazer minha carreira na Faculdade de Arquitetura, Design e Urbanismo, porque eram mais amigáveis com a minha posição. Aí, constituí a carreira de Design e Indumentária. Depois fui subdiretora e diretora. E recentemente, há sete anos, tenho uma quantidade de sociólogas que se aproximaram de minha cátedra. Então, não havia onde estudar o que eu queria. Em meu primeiro livro, ‘Historia de la moda en la Argentina’, trabalhei em tudo indo aos museus e ao Arquivo da Nação. Não havia nada escrito. Fiz muitíssimas entrevistas. Terminei em 1987, antes que se constituísse a carreira.
Você gostava das revistas de moda?
Não muito. Eu gostava de ver o que as pessoas usavam. Depois, em minha mesa havia mais revistas de tecnologia do que de moda. Não dava importância para isso, mas, sim, ao que as pessoas vestiam na rua, nos eventos. Não se pode esquecer que na época da ditadura ser sociólogo era suspeitoso. Eu abri, nesta casa, o que nessa época se chamava uma boutique. Comecei a vender roupa. Produzia e vendia porque havia feito um curso que, nessa época, não se chamava design, não gosto da palavra corte e confecção... era fazer roupa. Então, até o ano de 1982 tive este negócio e fazia os desfiles. Vendia muitíssimo.
O que aconteceu?
Divorciei-me e fechei tudo. Dediquei-me a escrever. Minha primeira nota saiu em 1983, na revista ‘Para ti’, e depois não parei mais de escrever.
Também dirigiu revistas.
Vogue e Glamour, mas somente dois anos, na época da crise, e não gostei porque vinha tudo enlatado. Foi em 2000 e 2001.
Como a relação das mulheres com a moda mudou, nos últimos anos?
A moda e os modos de vestir sempre são o reflexo do acontecer social. Nos anos 1930, era a época conservadora, com a juventude mudou o sentido do vestir e vieram as minissaias. Após o ano 2000, seja pela nossa terrível crise, seja pela queda das Torres, crise nacional e internacional, começa uma nova etapa. Uma nova ideologia que serve de base ao novo século. Esta nova ideologia se baseia nos recursos humanos, nos recursos do planeta. Nada a ver com o consumismo do século XX, que foi um século onde a estética, a moda, o consumo e o seriado eram importantes. Com a crise e uma nova ideologia baseada na sustentabilidade, com uma nova matriz de desenvolvimento diferente, mais atravessada pela funcionalidade, é outra forma do vestir. Então, aparece um novo discurso do vestir. Já não importava tanto a roupa, a famosa moda, mas, sim, a atitude juvenil que já vinha dos anos 1960, mas, principalmente, a perfeição estética, o corpo começou a talhar muito mais do que o vestido. Então, há como uma alternância.
Isso seria nos anos 1990?
Sim. Que, ao mesmo tempo, é quando se produz uma hiper-realização da moda e o consumo. Porém, quando se exagera muito algo, marca-se a contra-tendência. E a contra-tendência, somada à crise econômica, mas também à crise de sentido, faz com que a relação das mulheres com o vestir mude. Inicia a importância da funcionalidade e da liberdade. Da tolerância em relação ao vestir. A moda não é tolerância, a moda é autoritarismo. Então, a mulher quer ser livre para se vestir como quer. Isso somado à chegada das redes sociais, que dinamitaram todo o campo do discurso social.
Em seu último livro, ‘Política de las apariencias’, você fala muito da ética.
Porque eu acredito que o século XXI é o século que, como disse Francesco Morache, sem deixar de lado a estética, é o século da ética. E Michel Maffesoli sempre fala da importância de ter uma ética pessoal. No momento, você não recorre à sociedade sobre o que deve fazer, não é uma sociedade disciplinar. É controladora? Sim, mas é uma sociedade complexa.
Você disse que estas roupas “éticas” são incompatíveis com a produção de massas. Há um novo paradigma, mas no qual nem todos entram?
Há um novo paradigma. O que é massivo é economicamente acessível, mas está relacionado ao consumismo e como disse (Jean) Baudrillard, cada etapa histórica faz o que precisa fazer para a sua sobrevivência e a sociedade também. Nossa sobrevivência atual não pode estar presa ao consumo de massas. Quer dizer que é um novo consumo elitista? Sim. Porém, haverá outras formas que podem ser trocas, em que o acessível economicamente chegue a muitas pessoas que se ligam aos princípios da sustentabilidade. Então, o massivo não tem espaço, porque implica o que é seriado, e o seriado é depredador do planeta. É todo um sistema que com coerência muda. E o que as pessoas de menores recursos fazem? É claro que é preciso mudar, principalmente, o sistema... todo o capitalismo como sistema estava preparado para o século XX e agora precisa rever as bases sobre as quais estava sustentado.
Como a exploração nas fábricas clandestinas...
Por isso é que estou dizendo que um novo século, onde a ética tem um valor importantíssimo, não coincide com o massivo e o seriado. Sabemos o que ocorre com a exploração das pessoas diante do massivo e do seriado. De fato, vimos isso em Bangladesh...
Aqui também.
Sim. Este seriado, então, segue unido à exploração nas fábricas clandestinas.
Existem formas de produzir roupa acessível, que não venha da exploração?
É muito difícil porque é cara. Essa é a grande armadilha que o design tem. O que se pode fazer? Somente o desenho independente, nas pequenas séries, pode ser sustentável e ter oficinas. Isto se dá com uma roupa que tenho o privilégio de chamar “limpa”, porque é perfeita e deve ser mais duradoura. É totalmente outro conceito. Não é que fiquem pessoas fora do sistema. Não. Já não se trata de comprar e jogar, comprar e jogar, mas, sim, de ter uma boa roupa e poder fazê-la. Envolve também o produzir roupas. Isso é novo, novo. Outra vez, os moldes, o fazer as roupas. Incrível. Por que envolve? Porque tudo está relacionado. Então, o seriado segue unido à exploração, ao consumismo e é depredador do planeta. Como posso fazer? Séries curtas, o comércio justo e, sobretudo, o mais importante, trabalhar em cooperativas. Acredito que isto é a chave do design do futuro.
Você fala de um novo conceito de luxo.
Claro, está ligado a isto. O luxo não é uma pele, um brilhante, já não é mais. Porque também os brilhantes são extraídos por sistemas escravistas, exploradores. E o que dizer do mercúrio, que é um veneno... O novo luxo é a limpeza em relação aos sistemas de produção. Ter uma roupa eticamente boa. Parece um disparate, mas avançará no século e teremos que nos adaptar a este novo discurso. E, depois, o novo luxo é um pôr do sol, ter água cristalina e pura. E, sobretudo, as cooperativas. O design em cooperativas é uma maneira interessante de proteger os trabalhadores e os clientes e de se fazer um consumo consciente. É um novo paradigma. É preciso observar como resistem os grupos econômicos dominantes, que trabalham precisamente a partir deste esquema.
Você também disse que o principal esbanjamento se produz no uso das roupas, ao lavar e ao passar.
Sim. Por isso, a última [novidade] agora são umas bolinhas que são esfregadas para não usar água na lavagem e não usar sabão, tudo o que não é sustentável. Ou seja, para minimizar o uso da água e do sabão. Isto é novo, mas irá demorar muito. A água é um luxo, é o novo luxo. Por isso, por exemplo, os Emirados Árabes têm uma linha que leva a Dubai uma água que parece ser a mais pura do planeta, que está nos Andes. Esse é o novo luxo, ter essa água, não os sinais tradicionais do luxo, como a pele. As novas gerações não passarão roupa. Ao ligar o ferro sabe-se a energia que consome. Temos que começar a economizar.
O vestir e a identidade
Qual é a relação da roupa, ou a imagem, com a construção da identidade das pessoas?
A roupa ou a aparência sempre estiveram muito relacionadas com a formação da identidade. Para mim, a identidade se forma a partir do que você é, quem é, por isso, na medida em que você conhece mais a si mesmo, a identidade é mais forte; como os demais a veem, e o que aspira ser. Quando essas três marcas de sua identidade coincidem, a identidade é muito forte e geralmente produz a cópia da gente. Você se torna um líder visual e as pessoas o copiam. Porém, é um processo de construção que dura toda a vida. É um problema complicado no momento atual, porque tudo está configurado pelos outros. Antigamente, havia um ser, as pessoas eram; em seguida, veio a importância do ter, tinha que ter.
Walter Benjamin disse que no século XIX começou a importância dos objetos, porque tinham que dinamizar o consumo. E apareceram os estojos. Havia os óculos, mas apareceram os estojos para os óculos. Apareceram as vitrines. Começou uma multiplicação de objetos, onde o ser começou a não ser importante e o objeto começou a ocupar um lugar importante. A partir também desse ter, iniciou-se, na metade do século XX, a importância do parecer, a cultura visual. Era preciso ser jovem ou parecer; era necessário ter dinheiro ou parecer que tinha. As aparências eram totalmente enganosas. Aparência vem de aparentar, mas eu a tomo no sentido de como você se mostra para o outro. Com sua aparência você também pode mostrar autenticidade. Então, agora, que passamos do ter e parecer, podemos lentamente ir afirmando nosso ser para ter nossa identidade.
Quais são as motivações das pessoas para se vestir de acordo com a moda ou escolher uma maneira de se vestir?
As motivações são várias. Em primeiro lugar é muito forte o olhar e o ser olhado. Há uma compulsão em olhar o outro para a comparação. E o ser olhado: você gosta de ser visto e gosta de olhar. É um mecanismo psicológico que joga muito na escolha do vestir e a moda. Também há outros. A concorrência: geralmente você quer competir com o outro, igual a você. É uma necessidade de competir pela beleza, pelo corpo, com o igual. Não com o superior. Já não é a sociedade aristocrática. Também conquistar diferenciação. Porque a moda é um mecanismo de integração e diferenciação. Ao se vestir, você quer estar como todos, para não destoar, mas, ao mesmo tempo e de maneira contraditória, quer ter algo diferente, que o distinga. Por isso, quando se é turista, coloca-se qualquer coisa, não importa, pois não se é conhecido.
Liberta-se...
Claro, liberta-se da pertença ao grupo. Outra coisa importantíssima é que há uma forte carga erótica na escolha da vestido, a sedução.
O que acontece com as modelos muito magras? No livro, você argumenta que esse padrão está em decadência.
Teve o momento culminante, e agora tem que aparecer a contra-tendência. Faz parte da cultura de massas. A cultura de massas, que tem seu pontapé inicial nos anos 1960, tinha estratégias, uma é a homogeneização, padronizar. Tudo isto levado ao corpo, as formas são homogeneizadas. Não somente as formas de vestir, jeans para todos, mas também os corpos se homogeneizaram. Porque um corpo com alguns quilos a mais, além de parecer maior, significa diferenciação. Quando você tem quilos a mais, você é você, ao passo que se é muito magra, [fica como] são todos os corpos, esqueléticos, iguais, as mulheres até se parecem. De alguma forma, os quilos dão identidade para você. Estamos lentamente saindo da cultura de massas e entrando em um respeito pelo biótipo de cada um. Chegou-se a um extremo com a bulimia e a aneroxia, que nos apontava que essa tendência já morria.
Porém, leva tempo.
Não menos do que uma geração, mas já se desatualiza, já não tem sentido.
E como o avanço dos direitos conseguidos pelas pessoas trans e do coletivo LGBT influenciou no vestir?
Isto é muito recente. Porém, os gays ou as pessoas trans ainda estão na matriz heterossexual ao se vestirem. O que buscam? Ser uma mulher mais mulher, por isso enfatizam os caracteres, o sexual da mulher: o animal print, o ajuste, quando o ideal seria não ficar na matriz heterossexual. É muito recente.
Roupa e política
Você estudou o luto da Presidente [Cristina Kirchner]. O que encontrou?
Comecei a estudar a razão de Cristina usar o luto em uma época em que o mesmo é algo totalmente rejeitado, porque a morte não se celebra. Perguntei-me o motivo, o que buscava com o seu luto. É claro, ferramenta política. Foi o que eu disse sobre Evo Morales e Eva Perón. A roupa é uma ferramenta política, foi usada em diferentes épocas da história. Pareceu-me que, como Néstor e Cristina foram o casal político por excelência, ao permanecer em seu luto e não abandoná-lo, não era o pranto por Néstor, mas, sim, a restauração do casal político.
Como continuar a tê-lo ao seu lado.
Sim. A lembrança de um casal político. É a lembrança para os demais e para ela própria. Isso por três anos, até ficar suficientemente forte para dizer: posso ficar sem o andador do casal político. Ao mesmo tempo, quase diria, deixou de falar de Néstor. Agora é ela, quanto a Néstor não menciona tanto. Não necessita mencioná-lo tanto para estar forte. Porque ela precisou disso. Foi terrível o que lhe aconteceu. Rapidamente ficar sem seu companheiro de toda a vida, saiu-se bem em três anos, com o luto. Deu visibilidade ao casal político. Foi muito inteligente essa decisão.
E como foi o caso de Evo?
Um orgulho que em um país como Bolívia, dividido pela metade, Evo assuma o poder. Eu tomei o traje que ele usou para a posse. Primeiro faz sua cerimônia com o traje dos aymara tradicional frente à comunidade aborígene. Quando, pela primeira vez, percorre o mundo com seu suéter foi absolutamente criticado. Evo é muito inteligente e se deu conta que precisava apresentar outra aparência. Então, construiu a aparência da sua posse a partir de uma conjunção entre um traje de alpaca negro brutal, feito por uma mulher que era designer da classe alta, mas com expressões têxtis antigas, da comunidade boliviana. Com isso, ele conjuga essas duas irreconciliáveis posições humanas em seu traje. O elegantíssimo traje. Ele queria continuar sendo igual, mas perdia poder com esse suéter. Não quer dizer que já não o tenha. Certamente, continua tendo-o, mas para sua casa. As aparências são ferramentas de poder.
E o de Eva Perón?
Também estabeleci a diferença entre a Eva glamorosa, a atriz que era vestida por Paquito Jamandreu, e a Eva após conhecer as socialistas italianas, em sua viagem. Aí, muda e faz esse penteado maravilhoso e começa com os tailleurs, em um despojamento da Eva atriz. Então, Eva Perón se transforma em Evita e tem uma consciência social. Deixa de ser a que se vestia para as pessoas de classe alta, para adotar a aparência da reformadora social. E, ao final, para Perón não convinha uma Eva reformadora social, mas, sim, a Eva Perón de Dior, do luxo. Então, quando ela morre não lhe coloca o tailleur preto discreto – foi o que me contaram em uma casa de modas, Henriette -, mas, sim, pega o vestido que era para o dia 9 de julho, antes de morrer, uma roupa divina criada por Jacques Fath. Asunta, que a vestiu durante toda a vida, foi chamada por Perón, que pediu para que a vestisse, então ela cortou a cauda do vestido e lhe fez a mortalha. Caso Eva fosse consultada, teria preferido seu traje preto de reformadora social.
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“O novo luxo é ter uma roupa eticamente boa”, afirma socióloga da moda - Instituto Humanitas Unisinos - IHU