Por: Jonas | 18 Junho 2014
Antes da sentença da Corte estadunidense, a Argentina conseguiu o apoio da cúpula do G-77+China, que repudiou a ação “altamente especulativa” dos capitais financeiros. Também se obteve a adesão à reivindicação pelas Malvinas.
A reportagem é de Sebastian Abrevaya, publicada por Página/12, 16-06-2014. A tradução é do Cepat.
Um dia antes que a Corte Suprema dos Estados Unidos tornasse conhecida sua sentença na causa dos fundos abutres, a Argentina conseguiu o respaldo do G-77+China, que expressou seu repúdio à atitude “altamente especulativa” desses capitais internacionais e advertiu sobre o “perigo” que representam para futuros processos de reestruturação da dívida soberana, tanto para países em desenvolvimento, como para os desenvolvidos.
Ao participar da cúpula em Santa Cruz da Serra, a presidente Cristina Fernández expôs suas críticas ao “anarcocapitalismo” e chamou aos quase trinta chefes de Estado e mais de cem representantes de países de todo o mundo a abordar “um novo sistema de normativas globais”. “É muito importante que este grupo se pronuncie contra estas práticas financeiras, mas fundamentalmente contra um modelo que já se tornou sistêmico no mundo, como espoliação”, afirmou a Presidente. Além disso, no documento assinado pelos membros do G-77+China, expressou-se o apoio à posição argentina na reivindicação da soberania sobre as ilhas Malvinas.
Após o início oficial do sábado à noite, a cúpula arrancou ontem, perto das 9h00s, com a foto protocolar dos representantes dos 133 países integrantes deste grupo de nações em desenvolvimento. Cristina Fernández chegou ao centro de convenções Fexpocruz pouco antes do meio-dia, razão pela qual quem participou da saudação habitual foi o chanceler Héctor Timerman. Antes de retornar à Argentina, a Presidente manteve uma reunião bilateral com seu par cubano, Raúl Castro, e saudou ao secretário geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon; ao presidente venezuelano, Nicolás Maduro, e ao diplomata chileno Juan Somavía.
Durante as deliberações, o anfitrião e presidente da Bolívia, Evo Morales, deu a palavra a cada um dos oradores, entre os quais estavam os presidentes latino-americanos de Cuba, Venezuela, Uruguai, El Salvador, Paraguai, Peru e Argentina, além do vice-presidente da Assembleia Popular da China, Chen Zhu, e diplomatas de quase todos os países da África, entre outros.
Depois de uma breve referência à “fragilidade absoluta da ordem mundial, baseada em poderes hegemônicos”, Cristina Fernández centrou seu discurso na questão da dívida externa, crise financeira internacional e o que denominou “anarcocapitalismo”.
“Porque naquele capitalismo podíamos encontrar a categoria da exploração, da mais-valia, mas neste anarcocapitalismo que vive o mundo pelos capitais financeiros, não mais pelos capitais que produzem bens e serviços, temos uma nova categoria que não é a da exploração, mas, sim, da exclusão”, sustentou CFK, que detalhou a evolução da dívida nos últimos anos.
“Desde 2003, tivemos que nos tornar responsáveis das dívidas geradas por outros governos. Tivemos que resolver o maior default da história. Realizamos uma troca de dívida na qual entramos em acordo com 76% dos credores; depois, em uma segunda etapa, fechamos com 93%. Acabamos de assinar um acordo com o Clube de Paris. Só resta 1%, que são os representados pelos fundos abutres”, repassou a mandatária.
Nesse contexto, a Presidente afirmou que “este pequeno grupo de fundos abutres coloca em risco não só a Argentina”, mas também o conjunto do “sistema econômico internacional”.
Em linha com a postura argentina sobre a importância para todos os países com altos níveis de dívida externa, o G-77+China expressou em sua declaração que a gestão da dívida soberana foi “uma questão crucial” para os Estados em desenvolvimento. “Nos últimos tempos, surgiu uma nova preocupação relacionada com as atividades dos fundos abutres. Alguns exemplos recentes das ações dos fundos abutres nos tribunais internacionais puseram em manifesto seu caráter altamente especulativo. Reiteramos a importância de não permitir que os fundos abutres paralisem as atividades de reestruturação da dívida dos países em desenvolvimento, nem privem aos Estados de seu direito de proteger seu povo conforme ao direito internacional”, conclui a declaração.
A Presidente também fez referência à necessidade de modificar as regras de funcionamento global. “Não pode ser possível que o destino de nossas economias fique nas mãos de agências de risco. Estes organismos tomam decisões e geram crises que colocam em risco o trabalho e a produção”, fundamenta CFK, que recordou a crise financeira de 2008, com a queda do banco Lehman Brothers. “Foi gerada por organizações especulativas que provocaram desemprego nos países centrais, e agora seus governos querem transferi-las para nossas nações emergentes”, completou.
Com um tom menos crítico do que alguns de seus pares latino-americanos, ratificou a necessidade de reformar o Conselho de Segurança das Nações Unidas e de terminar com o “unilateralismo”. “Não pode ser, em princípio, que a segurança do mundo dependa apenas de um punhado. E ainda mais, quando esse punhado não está de acordo com o que será feito, também não pode atuar unilateralmente. Rejeitamos a unilateralidade na tomada de decisões, porque é a forma mais rápida de se equivocar”, explicou CFK, demonstrando um questionamento aos Estados Unidos.
A mandatária argentina rejeitou o “fundamentalismo” que “pisa sobre as necessidades dos povos submetidos”, que carecem de educação, saúde e moradia e provoca posições extremas. “Se não se entende esta lógica, cada vez estaremos pior e já não poderemos viver nem melhor, nem bem”, disse a Presidente, em alusão ao lema da cúpula: “Por uma nova ordem mundial para viver bem”. E para encerrar, advertiu que se essas modificações não chegarem a tempo, se chegará a convocar uma nova reunião que diga: “por uma nova ordem mundial para poder continuar vivendo”.
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As críticas de Cristina Kirchner ao ‘anarcocapitalismo’ - Instituto Humanitas Unisinos - IHU