01 Abril 2014
Quanto mais contamos com sinais externos de conversão, mais distraídos nos tornamos do cerne da questão - a cura e o poder salvador do amor de Deus. Deus não quer homens e mulheres espiritualmente "machos", mas sim aqueles com um coração humilde e contrito.
A nota é do sítio Jesuit Restoration 1814, 26-03-2014. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
No centro da disputa entre os jansenistas e os jesuítas, estava a questão da salvação. Os princípios teológicos de Cornelius Jansen (1585-1638) enfatizavam a predestinação, negavam o livre-arbítrio e sustentavam que a natureza humana era incapaz de qualquer obra boa.
Jansen foi influenciado por uma leitura particularmente rigorosa de Santo Agostinho, que enfatiza a predestinação e a graça eficaz de Deus. Essa graça seria dispensada a alguns por Deus, levando-os à sua salvação e condenando outros devido à falta dessa graça. Esse rigorismo tinha ecos estranhos do calvinismo e da doutrina protestante da justificação somente pela fé.
Por outro lado, os jesuítas - e a própria Igreja - ensinavam a importância do livre-arbítrio em matéria de salvação. Havia menos ênfase nos efeitos da "queda" e sim em uma visão da humanidade que não era irremediavelmente corrupta, mas que, ao contrário, buscava e afirmava a bondade residual do homem.
Muitos teólogos jesuítas tinham sido encarregados por Lainez, o superior-geral em 1558, de encontrar uma teologia que fosse adequada às necessidades dos tempos. O jesuíta espanhol Luis Molina fez exatamente isso: ao invés de predestinação, ele falou da presciência divina, na qual Deus previa os méritos e deméritos que nós livremente optamos por nossas ações. Em sintonia com o espírito crescente do humanismo renascentista, Molina e os jesuítas eram muito mais otimistas sobre a natureza humana. Esta abordagem ficou conhecida como molinismo. Assim, os confessores jesuítas não insistiam que seus penitentes mostrassem uma conversão radical, mas sim uma conformidade de suas vidas aos Dez Mandamentos e aos preceitos da Igreja.
Nesse contexto, um lado acusava o outro de frouxidão moral, enquanto o outro condenava o primeiro pela abordagem rigorosa e excessiva. É interessante notar que, em sua autobiografia, Santo Inácio, fundador dos jesuítas, havia enfatizado os erros que, quando jovem, tinha cometido por ser excessivamente rigoroso em suas penitências e práticas autoimpostas.
Inácio, que havia prejudicado a si mesmo fisicamente por esses excessos, insistiu em uma moderação prudente para seus sucessores. Ele percebeu que seus excessos não eram o que Deus estava querendo, mas tinham mais a ver com ele mesmo, na tentativa de ser perfeito para Deus. Quanto mais contamos com sinais externos de conversão, mais distraídos nos tornamos do cerne da questão - a cura e o poder salvador do amor de Deus. Deus não quer homens e mulheres espiritualmente "machos", mas simplesmente aqueles com um coração humilde e contrito.
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Uma reflexão sobre compaixão e rigor na vida religiosa - Instituto Humanitas Unisinos - IHU