20 Fevereiro 2014
Quando o Verbo se fez carne, toda a criação foi levada ao abraço divino.
A análise é de Elizabeth A. Johnson, religiosa, professora de teologia da Fordham University, de Nova York, e uma representante qualificada da teologia católica norte-americana. É autora de Colei che è. Il mistero di Dio nel discorso teologico femminista (Ed. Queriniana, 1999) e Vera nostra sorella. Una teologia di Maria nella comunione dei santi (Ed. Queriniana, 2005).
O artigo, publicado originalmente na revista U.S. Catholic de abril de 2010, foi republicado no blog Teologi@Internet, da Editora Queriniana, 17-02-2014. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
Em nossos dias, as preocupações com a ecologia estão aumentando. Mudanças climáticas, poluição e extinção de espécies vegetais e animais nos fazem questionar o prejudicial tratamento humano ao mundo natural.
Uma resposta religiosa tem sido a de se concentrar na doutrina da criação. Desde que o mundo inteiro foi criado por Deus, que viu que era "muito bom" (Gn 1, 31), a natureza – céu, mar, terra e as criaturas que neles habitam – tem grande valor aos olhos de Deus. Os seres humanos, criados à imagem e semelhança divina, fazem parte dessa comunidade de vida. Somos postos no jardim para cultivar e cuidar dele (Gn 2, 15), e não para destruí-lo.
Para os cristãos, Jesus Cristo é o centro da fé, o fundamento da crença e da prática da Igreja vivida no seu Espírito. Se o amor por Ele pode se conectar com o amor pela natureza, um forte impulso ao cuidado ecológico irá surgir, além da doutrina da criação. Jesus tem algo a ver com o cosmos? Explorar a Sua encarnação, ministério, morte e ressurreição com essa pergunta em mente produz algumas respostas inspiradoras e desafiadoras.
No centro da fé cristã está a verdade de que, em Jesus Cristo, Deus se tornou um ser humano para redimir o mundo. O evangelho do dia do Natal proclama isso de forma muito bonita: "O Verbo se fez carne e habitou entre nós" (Jo 1, 14). O Verbo é a própria autocomunicação de Deus, proferida por toda a eternidade. "Carne" significa o que é material, perecível, vulnerável, finito, exatamente o oposto do que é divino.
Aqui está uma declaração mais radical: Deus se tornou material. O Natal celebra um presente radical: o Deus todo-santo pessoalmente se uniu ao nosso mundo de pecado e sofrimento para salvar. Essa é conhecida como a doutrina da encarnação, do latim, "in carne".
As descobertas científicas deixaram claro que a carne humana faz parte da rede evolutiva da vida neste planeta, que, por sua vez, é uma parte do sistema solar, que, por sua vez, surgiu como uma parte de uma longa história cósmica. Essa tomada de consciência da nossa história natural proporciona uma nova intuição sobre o significado cósmico da "carne" que o Verbo se fez. (...)
A partir do Big Bang, as estrelas; a partir da poeira das estrelas, a Terra; a partir da matéria da Terra, a vida. A partir da vida e da morte de criaturas unicelulares, uma maré em avanço: trilobites, peixes, anfíbios, insetos, flores, pássaros, répteis e mamíferos, entre os quais emergiram os seres humanos – mamíferos com cérebros tão complexos que nós experimentamos a inteligência e a liberdade autoconscientes.
De acordo com essa história científica, tudo está conectado com todo o restante. O cientista e teólogo britânico Arthur Peacocke explica: "Cada átomo de ferro no nosso sangue não estaria ali se não tivesse sido produzido em alguma explosão galáctica há bilhões de anos e se finalmente não tivesse se condensado para formar o ferro na crosta da Terra a partir da qual emergimos".
Bastante literalmente, os seres humanos são feitos de poeira das estrelas. (...)
Compreender a espécie humana como uma parte intrínseca da matéria planetária e cósmica tem implicações de longo alcance para o sentido da encarnação. Nessa perspectiva, a carne humana que o Verbo se fez, faz parte do vasto corpo do cosmos.
Essa forma "profunda" de refletir sobre a encarnação fornece uma intuição importante. Ao se tornar carne, o Verbo de Deus confere bênção sobre toda a realidade terrena em sua dimensão material e, além disso, sobre o cosmos em que a Terra existe.
Em vez de ser uma barreira que nos distancia do divino, este mundo material se torna um sacramento que pode revelar a presença divina. No lugar do desprezo espiritual pelo mundo, nós nos aliamos ao Deus vivo amando todo o mundo natural, parte da carne que o Verbo se fez.
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''Porque Deus tanto amou o cosmos''. Artigo de Elizabeth A. Johnson - Instituto Humanitas Unisinos - IHU