30 Setembro 2015
"Na 21ª Assembléia do Cimi, Dom Erwin, completou seus 18 anos de serviço inestimável aos povos indígenas, como presidente do Cimi. Tempos de muita luta, utopia e esperança. Tempo de agradecer ao Deus da Vida por esse incansável lutador, que certamente continuará conosco nessa causa por muito tempo", escreve Egon Heck, do secretariado nacional do Conselho Indigenista Missionário – CIMI, ao enviar o artigo que publicamos a seguir.
Eis o artigo.
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Foto: Arquivo Cimi |
Nós que acompanhamos seu trabalho frente à presidência do Cimi, enquanto membros da diretoria da entidade, bem sabemos a abnegação com que ele se dedicou à causa indígena. Sabe dar sabor à luta, partilhando momentos de lazer e cantorias.
Ameaçado de morte, mas não intimidado.
Sua firme opção e fé, o fazem não arredar pé. Nem nos momentos mais difíceis e duros desses 18 anos. Sofreu tentativa de assassinato e enfrentou com galhardia todas as investidas anti-indígenas, principalmente por ocasião da Constituinte e da Comissão Mista Parlamentar de Inquérito (CPMI), em 1987, e a virulenta campanha contra o Cimi, veiculada por uma semana em grandes jornais como o Estadão, Correio Braziliense e A Crítica, de Manaus.
Lembro-me daqueles fatídicos dias de calúnia e difamação, quando o colega secretário Antônio Brand (em memória e gratidão) ia cedo à banca de jornal para saber qual era a bomba do dia. Imediatamente entrava em contato com Dom Erwin que nos tranquilizava e dava total liberdade e apoio para agirmos diante de tamanha ignomínia.
Em abril de 1987, em audiência pública, externaste, em nome do Cimi que “a Constituinte no alvorecer do século 21 deve ser o marco decisivo na história das nossas relações com os povos indígenas”. Mais tarde expressavas a emoção e grandeza resultante dessa luta: “É inesquecível a presença de quase 200 índios no Congresso quando, em 1º de junho de 1988, o plenário aprovou a redação do capítulo específico sobre os seus direitos”.
Dom Erwin dispensa palavras
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Foto: Arquivo Cimi |
Gostaria de não precisar de palavras carregadas de sentimentos, mas absolutamente pequenas demais para dar conta da grandeza de seu testemunho. Com Dom Pedro Casaldáliga e Dom Tomás Balduíno constituíram o trio contundente e radical em defesa dos povos originários e da vida.
No dia 22 de abril, na Assembleia da CNBB, em Aparecida, Dom Erwin se dirigiu aos bispos pela última vez como presidente do Cimi:
“Hoje é a última vez que, como presidente do Cimi, me dirijo aos bispos do Brasil porque no próximo setembro termina o meu derradeiro mandato. Agradeço de coração as notas da CNBB ao longo de todos estes mais de 30 anos em favor dos direitos e da dignidade dos povos indígenas. Obrigado por tantos apertos de mão e abraços que recebi em solidariedade para com essa causa. O apoio direto, o compromisso com o Evangelho da Vida e a intransigente postura profética da CNBB foram e continuam a ser “Boa Notícia” para os povos indígenas. A Igreja do Brasil nunca os abandonou nem os deixou sozinhos.
Recebam, assim, meu cordial e mais sincero “Deus lhes pague”. Obrigado por todos os sinais de justiça e colegialidade que foram “razão da esperança” dos povos indígenas. Agora os seguranças que há nove anos me vigiam dia e noite no Xingu podem relaxar. Nossa vigilância, porém, para o bem comum e em defesa da causa dos povos indígenas continua. Não foi e nunca será em vão: “Se Deus é por nós, quem será contra nós?” “Quem nos separará do amor de Cristo?” (Rm 8,31.35). Aparecida, 22 de abril de 2015.
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Foto: Arquivo Cimi |
No dia 17 de setembro, na 21ª Assembleia do Cimi, Dom Erwin deixou a presidência do Cimi:
“Depois de quatro mandatos (1983 – 1991, 2007 – 2015) e um mandato tampão (2006) como presidente do Cimi apresento pela última vez o Relatório da Presidência por ocasião de nossa Assembleia Geral. Guardadas as devidas proporções lembro neste momento a palavra de São Paulo a seu discípulo Timóteo: ‘Combati o bom combate, terminei minha corrida, guardei a fé’ (2 Tim 4,7). Não se trata de despedida, pois mesmo voltando a ser ‘soldado raso’, enquanto Deus me der a vida, jamais deixarei de lutar pela nobre causa dos povos indígenas e pela Amazônia.
Digo apenas a cada irmã, a cada irmão do Cimi, às lideranças dos povos indígenas e a cada indígena neste país um cordial e sincero ‘Deus lhe pague’. Obrigado, de coração, à Irmã Emília e ao Cleber que comigo integraram a presidência durante os anos passados, obrigado a vocês todas e todos pela fraterna e sororal amizade e comunhão que nos une hoje e unirá também nos anos vindouros”. (Luziânia, GO, 17 de setembro de 2015).
Dom Ervim, guerreiro e lutador, temos a certeza de que, mesmo passando a responsabilidade pela presidência do Cimi a Dom Roque Paloshi, continuarás conosco, na família do Cimi e no compromisso da luta pelos direitos dos povos indígenas.
Dom Roque, bispo de Roraima, assumiu a presidência do Cimi dia 17 de setembro e no dia seguinte foi aprovada a CPI contra o Cimi, na Assembleia Legislativa do Mato Grosso do Sul. “Estamos aí para o que der e vier”, assegurou Dom Roque, mostrando seu compromisso com os povos indígenas no país.