02 Setembro 2015
A distância de cinco séculos parece conter a mesma ferocidade do Isis islâmico, se não até mais. De uma prestação de contas da época: “Agora ocorre dizer como hoje em boa hora se começou a fazer a horrenda justiça destes Luteranos, que só em pensar já é apavorante: e assim são estes tais como uma morte de castrados; os quais estavam todos encerrados numa casa, e vinha o algoz e os pegava um por um, e lhes atava uma venda nos olhos, e depois os levava a um lugar espaçoso pouco distante daquela casa, e os fazia ajoelhar, e com uma faca lhes cortava o pescoço e os deixava assim: depois pegava aquela venda tão ensanguentada, e com a faca ensanguentada retornava para pegar o outro, e fazia o mesmo. Seguiu esta ordem até o número de 88. Cujo espetáculo, quão compassivo tenha sido, deixo a vós pensar e considerar”.
A reportagem é de Fabrizio D'Esposito, publicada pelo jornal Il Fatto Quotidiano, 31-08-2015. A tradução é de Benno Dischinger.
Fica-se sem fôlego diante desta crônica nua e fiel. Aconteceu aos 11 de junho de 1561 (ainda uma data com o 11 na história dos massacres religiosos) em Montalto, na Calábria, no Cosentino. Os 88 cadáveres degolados foram depois empalados. Mas, o pior ocorreu em Guardia Piemontese, sempre no Consentino e sempre em junho, onde em onze dias foram massacrados dois mil valdenses e o sangue escorria pelos becos sem parar, a ponto de a porta da aldeia ter sido denominada “Porta do Sangue”. São estes os primeiros massacres ordenados pela Igreja do Concílio de Trento contra os hereges “reformados” italianos. Entre os quais estavam, precisamente, os seguidores do pregador Valdo, o “pobre de Lion” do século XII, os quais depois aderiram ás teses luteranas de 1517. A crueldade daquele excídio explica também a tépida acolhida que tiveram as palavras do Papa no Sínodo das igrejas metodistas e valdenses que se desenrolou por cinco dias, na semana passada, em Torre Pellice, no Piemonte, histórico berço dos protestantes italianos. Francisco pediu “perdão” e a solicitação foi aprovada pelos 180 “deputados” do Sínodo, com seis abstenções. Em todo caso, o Sínodo precisou: “Esta nova situação não nos autoriza, todavia, a substituir-nos a quantos pagaram com o sangue ou com outros sofrimentos seu testemunho da é evangélica e perdoar em lugar deles”.
Não só. Além do perdão franciscano, é assinalado que o guia daqueles massacres ainda hoje é um santo para a Igreja. Ou seja, são Pio V passou à história como “o campeão da cristandade contra o Islã” pela batalha de Lepanto. Em 1561, o dominicano Michele Ghislieri, conhecido como o cardeal Alessandrino pelas suas origens piemontesas (ele era de Bosco Marengo), era o “inflexível perfeito da santa Inquisição e foi ele que recebeu os “alarmes” da Calábria e desinfetou” a região da heresia importada da Provença. Para a Igreja é ainda um santo, assim como os terroristas do Isis são “mártires” para o Islã radical. Há diferença?
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Pio V para a Igreja é um santo, mas foi ele que fez degolar os valdenses - Instituto Humanitas Unisinos - IHU