Por: André | 24 Agosto 2015
“Eu sei que a solução não é realista. É uma autêntica utopia. Mas também é verdade que, em situações limítrofes, só quem tem coragem e audácia para empreender seriamente caminhos de utopia, está em condições de nos oferecer uma palavra de esperança com futuro.”
A reflexão é do teólogo José María Castillo e publicada por Religión Digital, 20-08-2015. A tradução é de André Langer.
Eis o artigo.
O conhecido empresário multimilionário Warren Buffet disse, seguro de si mesmo: “Durante os últimos 20 anos houve uma guerra de classes e minha classe venceu”. Este milionário apregoava o triunfo dos empresários desde a sua sólida instalação naquilo que o Nobel de Economia, Paul Krugman, qualificou como “o moderno conservadorismo (que) se entrega à ideia de que as chaves da prosperidade são os mercados sem restrições e a busca irrefreada do benefício econômico e pessoal”.
É isto o que importa. E é isto o que manda, atualmente, mesmo na economia e na política mundiais. Senão, perguntem aos milhões de desempregados, de deslocados, de imigrantes e de pessoas que diariamente morrem de fome e de desespero, como vemos e escutamos nos noticiários que nos dizem o que realmente está acontecendo neste momento.
Por isso, esta manhã, lendo o Evangelho, encontrei um texto genial que me fez pensar. Refiro-me à parábola do proprietário que buscava trabalhadores para a sua vinha (Mt 20, 1-16). Não entro nas questões discutidas e analisadas pelos especialistas no estudo do Novo Testamento. Independente disso, eu encontro na parábola três coisas que – segundo creio – estão muito claras:
1) O empresário da vinha passou o dia procurando desempregados para dar-lhes trabalho.
2) O empresário da vinha apostou na igualdade de todos na hora de pagar a diária.
3) O empresário da vinha começou pelos últimos (Mt 20, 8) e privilegiou os últimos (Mt 20, 16), aqueles que, tendo trabalhado menos, ganharam o mesmo que aqueles que trabalharam mais. É evidente, portanto, que o importante, para este estranho empresário, não era o lucro, mas remediar o desemprego, acabar com as desigualdades e, caso queiramos privilegiar alguém, os primeiros que temos que privilegiar são aqueles que estão mais abaixo, os últimos deste mundo.
Isto realmente é possível? Um empresário do nosso tempo e que tenha os pés no chão, pode realmente assumir, com todas as suas consequências, o projeto de empresário que esta parábola nos apresenta? E, sobretudo, pode-se aplicar aos empresários uma parábola que, na realidade, falava de Deus e não de nenhum empresário deste mundo?
Evidentemente, a interpretação tradicional da parábola nos fala do comportamento que Deus tem com os mortais, não das relações dos empresários com seus trabalhadores. Mas, quem somos nós para colocar limites ao Evangelho, em sua força e em suas possibilidades, para nos dizer, a nós hoje, uma palavra eloquente e exigente para a situação que estamos vivendo?
Eu compreendo que é mais cômodo colocar o “empresário” no céu e nós, dessa maneira, ficarmos com as mãos livres aqui na terra, para organizar as coisas como nos interessa ou nos convém. Mas, por favor!, sejamos honestos e não coloquemos limites ao Evangelho. Já nos chamou a atenção o grande exegeta, que é Ulrich Luz, que, desde Orígenes até os nossos dias, as tentativas de aplicar esta parábola a situações atuais indicam as “novas potencialidades de sentido que o velho texto tem”. E assim costumam fazê-lo não poucos professores e pregadores quando explicam as parábolas.
Em todo o caso, o mais sério e urgente que temos que enfrentar neste momento é que a economia e a política atuais, do jeito como vêm funcionando, até este momento conseguiram criar uma brecha tão grande entre ricos e pobres, que já é (e será) insuperável por décadas e quem sabe séculos.
Isso tem solução? Está visto que nem a economia nem a política, assim como funcionam atualmente, são capazes de resolver, nem sequer deter, o assombroso desastre. Isto terá solução apenas na medida em que surgem pessoas que, com um espírito grande e à margem de quanto nos dizem os economistas e políticos, sejam capazes de empreender com firmeza um novo caminho. O caminho que marcado pelo Evangelho dos empresários.
Eu sei que a solução não é realista. É uma autêntica utopia. Mas também é verdade que, em situações limítrofes, só quem tem coragem e audácia para empreender seriamente caminhos de utopia, está em condições de nos oferecer uma palavra de esperança com futuro.
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O Evangelho dos empresários, segundo José María Castillo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU