22 Julho 2015
"A universidade não pensa o País, não apresenta roteiro para superar o atraso e o subdesenvolvimento. Depois desses autores a situação piorou. O jovem professor ingressa brochildo e desvitalizado na carreira dando por finda e anacrônica a incumbência de que a universidade deve refletir sobre o saber necessário. Não há nação, não há povo e muito menos universidade nacional. Assim prevalece o cinismo, o que vale é o empreguinho, o cargo, o salário do nada", afirma Gilberto Felisberto Vasconcellos, jornalista, sociólogo e escritor, em artigo publicado pela Revista Caros Amigos, edição de julho de 2015.
Segundo ele, "um dos deploráveis signos da decadência do professor universitário é cada um zelar pela sua bibliotequinha particular em casa com a patroa e os filhos, e não frequentar a biblioteca da universidade".
"O mais ignóbil nesta miséria mental - conclui o sociólogo - é de cunho onomástico, porquanto deram o nome Lattes a essa geringonça, depois que o cientista César Lattes havia morrido. Eu o conheci em Campinas, apresentado pelos cineastas Glauber Rocha e Roberto Pires. Tenho certeza de que César Lattes iria identificar essa safada homenagem póstuma com tormento e tortura".35
Eis o artigo.
O homolattes passa o tempo contando pontinhos, abomina a razão e o estilo.
Até Lenin na história do marxismo foi acusado de não escrever obra teórica, e sim panfleto, plaquete e propaganda. Lembrar que o livro Un Coup de Dés Jamais N’Abolira Le Hasard, de Stéphane Mallarmé, foi publicado em plaquete. Dezenas de plaquetes foram escritas pelo nosso Luís da Câmara Cascudo. Na atual moldura burocrática da escrita é absolutamente necessário colocar, sem nenhuma ideia própria, notas ao calcanhar da página. A miséria universitária foi escarafunchada por Álvaro Vieira Pinho, Darcy Ribeiro, Nelson Wernek Sodré e Maurício Tragtemberg.
A universidade não pensa o País, não apresenta roteiro para superar o atraso e o subdesenvolvimento. Depois desses autores a situação piorou. O jovem professor ingressa brochildo e desvitalizado na carreira dando por finda e anacrônica a incumbência de que a universidade deve refletir sobre o saber necessário. Não há nação, não há povo e muito menos universidade nacional. Assim prevalece o cinismo, o que vale é o empreguinho, o cargo, o salário do nada.
É repugnante verificar que os cursos de pós-graduação seguem a receita do Banco Mundial. Este indica os assuntos e os autores do triunfalismo capitalista.
O candidato que quer pós-graduar-se, ao dar uma olhada na bibliografia do curso, por pragmatismo não vai querer contrariar o Banco Mundial; se o fizer, leva ferro, não passa, toma pau.
Na bibliografia não consta nenhum autor marxista, também está banido autor latino-americano. Loucura é ouvir falar que a universidade é um viveiro adubado de marxismo; ao contrário, Marx não é lido pelos professores universitários. Se porventura um dia se fizer a sociologia dos departamentos na universidade, cuja utilidade é nula, a melancólica constatação é que cada professor se vê a si mesmo e ao colega como um picareta, um falsário, um enganador, inclusive achando que não ganha mal pelo que faz. Por isso a tendência psicológica irrefreável é os professores se devorarem, cada um tritura o outro na estratégia da derrubação, por isso o convívio entre eles dificilmente gera amizade. Em trinta anos de convivência nos frívolos e impolidos departamentos, ninguém torna-se amigo de ninguém, diferente do que sucede na cadeia e no leito moribundo de hospital.
Ludibriados, os alunos supõem que existe conversa inteligente entre os professores. Todavia, diálogo é coisa rara de acontecer. Todo mundo está a fim de rapar fora do campus, ninguém se interessa pelo que o outro está lendo ou estudando.
Um dos deploráveis signos da decadência do professor universitário é cada um zelar pela sua bibliotequinha particular em casa com a patroa e os filhos, e não frequentar a biblioteca da universidade.
É difícil deparar com alguma obra significativa produzida no meio universitário, porque a reflexão aí é suspeita e a linguagem menosprezada. Por isso fala-se mal e escreve-se pior ainda com o léxico burocralépitopi.
A juventude é enganada quando ouve falar da palavra imperialismo, a qual sumiu do mapa acadêmico. Acontece que o capitalismo brasileiro não tem uma história própria. Sua história é a do capitalismo como um todo mundial.
Ponho minha mão no fogo se esse tal Curriculum Lattes não nasceu de algum encontro do Soros com o senador Cristóvão Buarque. Lá de Pernambuco também veio o deputado Roberto Freire morrendo de ódio da palavra comunismo e aí fundou o derivativo pepsi-cola da coca-cola chamado PPS. Ambos os pernambucanos querem humanizar o capitalismo, querem mostrar a face humana do capital. Ambos são retóricos, superficiais e politicamente levianos. Para eles a razão de ser do capital é satisfazer a necessidade das pessoas, e não expandir-se sem limites.
Todo mundo sabe, pelo menos deveria saber, o que Leonel Brizola pensava a respeito da atuação de Buarque e Freire. Luiz Inácio Lula passou a mão na cabeça dos dois, não apenas por ser ele pernambucano também. É aquilo que Goethe falava, não apenas da paixão amorosa. Goethe falava em afinidades eletivas.
O homolattes abomina a razão e o estilo. O seu passatempo lúdico é contar os pontinhos tal qual menino fazendo embaixadinha com a bola, a fim de virar star Neymar Júnior. Resulta daí o progressivo desaparecimento da função pública do intelectual, isto é, aquele intelectual que mete o bico em tudo quanto é assunto da tribo. Isso acabou, entre outros motivos por causa da caça ao Curriculum Lattes, essa medonha competição mercantil obtida com artigos ligeiros publicados sob critério quantitativo e com uma excelência enigmática e inescrutável.
“Publish or perish”, publique ou morra. Se porventura o artigo sair em revista “indexada” e empatotada, o que significa conformismo e espírito chapa branca, o valor é infinitamente superior ao do livro, assim como nada vale na apreciação acadêmica publicar em Caros Amigos ou Revista da Academia Brasileira de Letras.
O atual ministro da cultura, Janine Ribeiro, tarimbado professor de filosofia, certamente está inteirado do infortúnio cognitivo que enseja a moeda Lattes. Sem dúvida ocupará lugar de destaque na história da educação como Anísio Teixeira, se porventura ele tiver a audácia de faxinar o legado tucano de Paulo Renato.
O mais ignóbil nesta miséria mental é de cunho onomástico, porquanto deram o nome Lattes a essa geringonça, depois que o cientista César Lattes havia morrido. Eu o conheci em Campinas, apresentado pelos cineastas Glauber Rocha e Roberto Pires. Tenho certeza de que César Lattes iria identificar essa safada homenagem póstuma com tormento e tortura.
Curriculum Lattes é a puta que pariu!
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