07 Julho 2015
A seis séculos da morte na fogueira de Jan Hus, uma nação inteira – a Boêmia – reflete sobre um passado dramático, pede a reabilitação desse seu célebre filho, inunda o país de recordações, comemorações, congressos para manter viva a memória de um dos pais da identidade tcheca.
A reportagem é de Luigi Sandri, publicada no jornal Trentino, 06-07-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
No dia 6 de julho de 1415, em Constança, por ordem de um Concílio que se realizava naquela cidade na fronteira entre a Alemanha e a Suíça, o teólogo boêmio Jan Hus foi queimado vivo.
A sua culpa? Ele tinha denunciado a cobiça da Corte papal e proposto teses ousadas para reformar com bases evangélicas o ministério petrino em um período sombrio no qual nada menos do que três papas (o romano, o pisano e o avignonense), ao mesmo tempo, se proclamavam sucessores de Pedro e rotulavam como "antipapas" os outros dois concorrentes.
Para resolver essa situação sem precedentes, o imperador Sigismundo tinha pressionado para que se reunisse, justamente, a assembleia conciliar com o propósito específico de pôr fim ao Grande Cisma do Ocidente.
É no pano de fundo desses eventos, que iniciaram em 1378, que, em Praga, Jan Hus sacudia as multidões, pregando em tcheco para que todos entendessem as suas denúncias ao poder eclesiástico corrupto, porque – defendia ele –, com Constantino, o poder civil ainda no século IV tinha se intrometido na Igreja, contagiando-a com uma lepra que atravessaria os séculos.
Chegando em Constança com um salvo-conduto imperial, Hus caiu em uma armadilha e foi preso. Recusou abjurar aqueles que os seus adversários consideravam como "erros" imperdoáveis. E, assim, no dia 6 de julho de 1415, foi mandado para a fogueira.
Na véspera da óbvia decisão do Concílio, Hus escreveu aos seus seguidores: "Meus fiéis, amem a Deus, abençoem a Sua Palavra, cumpram-na na alegria. Escrevo para vocês estando na prisão e em correntes, esperando amanhã a minha condenação à morte, mas com plena confiança em Deus. Não renuncio à Sua Verdade e não julgo os erros que falsas testemunhas cometem contra mim".
Os seus discípulos – os hussitas – também tiveram que sofrer muito e, no fim, foram dispersados; só em tempos mais recentes, na Boêmia e arredores, constituíram-se igrejas que, em parte, se referem ao ensinamento de Jan.
O tempo, no entanto, sedou muitas dificuldades, e, da própria Roma papal, finalmente chegaram palavras esperadas em vão pelos boêmios durante séculos. No dia 17 de dezembro de 1999, às vésperas da abertura do Grande Jubileu do ano 2000, João Paulo II chamou Hus de "uma figura memorável", elogiou "a sua coragem moral diante das adversidades e da morte", e expressou "profundo pesar pela cruel morte infligida a ele".
E o Papa Francisco nomeou o ex-arcebispo de Praga, cardeal Miloslav Vlk, como seu enviado especial para as celebrações (5 e 6 de julho) para o sexto centenário da morte de Hus.
E aqui, em Praga, nestes dias, o visitante é imerso em uma atmosfera onde tudo fala do mártir, do patriota, do teólogo, em uma festa do povo que, em seu nome, se une com orgulho. De vez em quando, talvez, a história é mestra de vida.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
A seis séculos da fogueira de Jan Hus - Instituto Humanitas Unisinos - IHU