Por: Cesar Sanson | 07 Julho 2015
O professor Alexandre Antônio de Oliveira Tavares, 46, é o típico caso de profissional da educação básica que é obrigado a lecionar em mais de uma escola, em três turnos diários, para sobreviver.
A reportagem é de Silvio Andrade e publicado por Novo Jornal, 06-07-2015.
Docente das séries iniciais (ensino básico), Alexandre Antônio de Oliveira Tavares há 20 anos se dedica à educação. Formado em pedagogia, começou a carreira estudando e trabalhando ao mesmo tempo na rede estadual de ensino. “É uma loucura”, define ele, que tem três vínculos de trabalho.
Vinte e quatro horas é um período curto para o dia do professor. De manhã ele sai de casa em Candelária, na Zona Sul, dá aulas na Escola Joaquim Osório, no Alecrim (Zona Leste); à tarde vai para a Escola Municipal São Francisco de Assis, em Lagoa Nova (Zona Oeste); e à noite termina em uma escola estadual e em faculdades particulares. Neste último caso, a jornada se estende até o final de semana, conta ele, assumidamente um arrimo de família.
“Nenhum professor que vive nesta jornada se sente bem”, desabafa. Alexandre de Oliveira Tavares diz estar na idade de descansar, usufruir dos anos de profissão, mas não é possível parar porque se deixar alguma das atividades, não terá como manter o padrão de vida que tem hoje. Quem trabalha com educação, afirma, tem que comprar livros, estudar sempre, fazer cursos de aperfeiçoamento, viajar para congressos e o orçamento de uma única escola não cobre as despesas mensais.
Situação é ainda pior para a mulher
Com 32 anos de magistério, Marta Gomes das Neves, 55, por muito tempo exerceu a jornada tripla em escolas e quando chegava em casa, à noite, ainda tinha que exercer o quarto turno na função de dona de casa.
Marta Gomes das Neves começou a carreira em 1983, como professora do Estado. Mas, segundo ela, os governos de José Agripino (1983-1986/1991-1994) e Geraldo Melo (1987-1991) “destruíram” a autoestima dos professores e, por isso, pediu demissão após quatorze anos de serviços. Ela fez concurso para a rede municipal de ensino, melhor que o Estado, avalia. Mesmo assim, durante oito anos teve de se desdobrar.
Hoje, a professora tem só um vínculo na rede municipal onde cumpre 20 horas, das quais 16 horas em sala de aula e o restante no planejamento pedagógico. Muito diferente de um tempo atrás quando era professora em dois horários da Fundação Bradesco e o terceiro expediente era na rede municipal.
De março de 2013 a março de 2014 foi professora seletiva do Município no contrato temporário de dois anos. Hoje, com apenas um vínculo, ela ainda acha que a categoria não tem o reconhecimento financeiro que merece. Como Marta no passado, a maioria de seus colegas de profissão é obrigada a ter atividades extras para complementar a renda.
“Isso prejudica o trabalho dos professores. Eu chegava em casa morta de cansada e tinha que preparar a aula para o dia seguinte”, afirma. Mesmo com as quatro horas para planejar as aulas, Marta ainda acha esse tempo insuficiente porque os professores terminam trabalhando muito mais na preparação das aulas e participação de atividades extras como o Programa Nacional de Albabetização na Idade Certa (PNAIC).
O PNAIC foi criado pelo governo federal para garantir alfabetização plena de todas as crianças até os oito anos de idade. É um curso presencial de formação continuada de professores alfabetizadores com duração de dois anos. As aulas, explica Marta, são ministradas à noite, fora do turno regular.
“Muitos amigos trabalham nestas condições. É quase todo mundo. Dificilmente se encontra alguém que só trabalhe um horário”, complementa. Segundo a professora, a situação do município é melhor porque tem plano de carreira do magistério e, se forem cumpridas as promessas de implantação das promoções verticais e horizontais, será dado um passo a mais.
RN lidera ranking de educadores que trabalham fora do sistema educacional
No Brasil, 41% dos professores da rede básica de ensino desenvolvem atividades dentro e fora do sistema educacional para sobreviver. No país, 16 estados superam a média nacional e o RN é o líder com 55%, seguido de Roraima com 54%.
A complementação de renda é menor entre os professores do Distrito Federal (12,7%) e do Tocantins (22,6%). No estado mais rico do país, São Paulo, esse índice chega a 41%.
Os dados foram tabulados pela organização Todos pela Educação, a pedido do jornal Folha de São Paulo, que publicou matéria sobre o assunto terça-feira passada.
Segundo os dados, quatro em cada dez docentes brasileiros da rede básica têm atividades nas escolas e fora delas para complementar a renda. Pelo menos 10% dos docentes têm atividades fora do sistema educacional oficial.
Os dados tabulados são de questionários do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), do Ministério da Educação, preenchidos por 225 mil professores da rede pública do 5º e 9º anodo ensino fundamental. O país tem 1,4 milhão de professores do fundamental.
Pelo levantamento divulgado na Folha de São Paulo, 30% dos professores das escolas que trabalham 40 horas ou mais por semana também arranjam tempo para complementar a renda em outras atividades.
Um estudo de 2012 da ONU, Banco Mundial e Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) mostrou que os docentes brasileiros do Ensino Fundamental estão entre os de pior remuneração no mundo. E muitos municípios e estados ainda não cumprem a Lei do Piso Nacional do Magistério sancionada em 2008.
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No Rio Grande do Norte, professor faz até jornada tripla de trabalho - Instituto Humanitas Unisinos - IHU