26 Junho 2015
"O capitalismo inclusivo oferece a oportunidade para que o potencial das pessoas se realizem, ao mesmo tempo incentivando também a criatividade em todos os níveis", escreve Justin Welby, arcebispo de Canterbury, em artigo publicado por The Telegraph, 25-06-2015. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
Eis a entrevista.
Há alguns anos, enquanto eu ainda trabalhava fora de Londres, conheci um homem que havia estado desempregado por 18 meses. Ele fora despedido durante uma crise de recessão, mas estava altamente motivado e ansioso para participar plenamente do sustento de sua família. Como havia um bom nível de demanda em sua área de atuação comercial, ele quis montar a sua própria empresa de pequeno porte.
No entanto, ele levou não menos de 18 meses para conseguir o capital necessário e comprar ferramentas e equipamentos para, então, voltar à ativa por conta própria. No final, recebeu um empréstimo de uma empresa social de microfinanciamento, que ele reembolsou quase que instantaneamente. E na época em que o conheci, ele tinha uma carteira de encomendas de cinco meses e estava, realmente, trabalhando muito: estava absolutamente encantado com a direção que a sua vida estava tomando. O empréstimo, que lhe permitiu instalar o seu negócio e fazê-lo funcionar, foi de 200 libras esterlinas.
O capitalismo que não consegue encontrar 200 libras para um indivíduo altamente motivado, com boas habilidades, simplesmente não é adequado para a tarefa de criar uma sociedade estável.
Este trabalhador, um alguém com iniciativa, estará em meus pensamentos amanhã (26), quando eu participar no Congresso sobre o Capitalismo Inclusivo, em Londres. Este evento reúne as principais figuras do mundo dos negócios, das finanças e de políticas públicas comprometidas em criar sistemas econômicos que incentivem uma prosperidade a longo prazo e que seja amplamente partilhada. Estou certo de que vou aprender muito. Espero, também, poder contribuir com o debate, trazendo uma perspectiva informada tanto a partir da economia quanto da teologia.
Uma compreensão cristã do capitalismo inclusivo começa com a natureza de Deus, que em Jesus Cristo estendeu a mão para incluir toda a humanidade na salvação. O Novo Testamento nos ensina que nada disso acontece porque somos bons – na verdade, diz São Paulo em sua carta aos Romanos que Cristo morreu por nós quando ainda éramos inimigos de Deus. Isso acontece porque Deus procurou incluir todos os seres humanos em seu amor e propósito por eles, caso aceitassem o convite.
Assim, qualquer estrutura humana que se diga moral deve procurar incluir qualquer pessoa que queira ser incluída, independentemente se é considerada merecedora ou não. Os benefícios para a sociedade são enormes. Ouvimos muita coisa sobre a desigualdade e a aspiração. O capitalismo inclusivo oferece a oportunidade para que o potencial das pessoas se realizem, ao mesmo tempo incentivando também a criatividade em todos os níveis. Ele chama para a responsabilidade os ricos e poderosos, não apenas através da redistribuição e, certamente, não só através da filantropia e da caridade, mas por meio de uma abertura que supera essas barreiras que os seres humanos tão facilmente estabelecem.
Por exemplo, a tendência de os empregadores em contratar pessoal com fundo cultural de classe média, como indicado em um relatório recente publicado por uma comissão que estudou a pobreza infantil e a mobilidade social. Este fato deveria ser superado por uma abertura a enxergar, como igual, o potencial de qualquer pessoa. Para que isso aconteça, é necessário que haja uma liderança, especialmente entre os empregadores e o governo.
Há alguns anos, fui convidado para ser o patrono de um projeto em Darlington criado para combater o desemprego entre os jovens. O projeto visava criar 1 mil estágios e outras experiências de primeiro emprego em 12 meses; na prática, ele criou 1.800. Estava claro que os empregadores na área não tinham uma atitude de dependência; eles queriam apenas ser supridos com pessoas prontas para o trabalho. Mas, em vez disso, contrataram aqueles que encontravam e foram generosos o suficiente para treiná-los e desenvolvê-los. Os resultados para os empregadores foram tão bons quanto o foram para os seus novos contratados.
O capitalismo inclusivo não vai acontecer por acaso. Adam Smith foi perfeitamente claro sobre a natureza egoísta do capitalismo. Ele só será inclusivo, para usar uma frase cunhada pelo Papa Bento XVI em sua encíclica Caritas in Veritate, quando houver um aspecto forte da gratuidade.
Em lugar de apenas buscar um retorno sobre o investimento, tem que haver uma generosidade que estende a mão. Se nós nos baseássemos unicamente no interesse próprio, as nossas sociedades entrariam em colapso. O altruísmo, a imitação do Deus que age no amor que não busca retorno, é parte crucial de uma sociedade estável e funcional. Há também uma responsabilidade por parte dos governos: estes devem criar as condições e a cultura que incentivam altruísmo. Obrigações morais são sentidas mais intensamente quando o sistema fiscal, o processo de educação e o clima econômico incentivam a gratuidade.
Gratuidade não é o mesmo que caridade ou filantropia. Ela vai muito mais além e alcança o bem comum – não apenas no interesse geral da sociedade. Ela diz que um sistema de capitalismo inclusivo nem sempre busca a maximização da recompensa, mas sim a maximização do florescimento humano. Uma sociedade assim é uma sociedade em que, verdadeiramente, vale a pena viver.
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O capitalismo inclusivo começa com a natureza de Deus. Artigo de Justin Welby - Instituto Humanitas Unisinos - IHU