Por: André | 25 Mai 2015
Para o jornalista britânico Austen Ivereigh, autor da mais recente biografia do Papa Francisco – O Grande Reformador –, a próxima encíclica, que se encontra na fase de revisão e que deverá ser publicada em junho, será um apelo à ação para fazer frente à mudança climática. Por isso, garante que a data da sua publicação não é casual, já que com ela o Papa busca influir na Conferência sobre o Clima que será realizará em Paris no final do ano.
Nesta entrevista, o também fundador do movimento Vozes Católicas e ex-assessor do cardeal britânico Cormac Murphy-O’Connor, analisa os alcances do esperado documento do Papa Francisco.
A entrevista é de Juan Paulo Iglesias e publicada por La Tercera, 22-05-2015. A tradução é de André Langer.
Austen Ivereigh é autor de uma importante biografia do Papa Francisco intitulada. The Great Reformer. The making of a radical pope (Henry Holt, 445 p). Na página do IHU podem ser lidas várias resenhas do livro.
Eis a entrevista.
Por que acredita que o Papa decidiu dedicar sua primeira encíclica ao tema da mudança climática?
Desde o primeiro momento, ou seja, desde o dia seguinte à sua eleição, quando explicou aos jornalistas por que havia escolhido o nome Francisco (de Assis), referiu-se ao tema, e em seus dois anos de pontificado não faltaram referências à necessidade urgente de ação para prevenir o dano ecológico. Parece uma preocupação relativamente recente em sua vida: nos últimos anos de seu tempo como cardeal arcebispo começou a interessar-se pelo tema, comovido com o que lhe testemunharam os bispos da Amazônia. Para Francisco, o tema está intimamente ligado ao funcionamento da economia global que, segundo ele, deve estar destinada mais ao benefício da humanidade inteira e não tanto aos interesses consumistas de uma minoria rica.
Para Francisco, o aquecimento global é o sinal desse mau funcionamento, e quer despertar o mundo endinheirado para que aja. Disse que um sistema econômico enfocado no deus do dinheiro necessita explorar impiedosamente a natureza para manter o ritmo frenético do consumismo atual. E que só uma reorientação ética da economia – orientando-a para o desenvolvimento integral da humanidade, o que significa frear os hábitos consumistas – pode salvar o planeta.
O que podemos esperar desse texto?
O que se pode esperar da encíclica é um apelo à ação, sobretudo buscando influir na conferência das Nações Unidas sobre a mudança climática de dezembro, quando se espera que as nações ricas tomem decisões decisivas para prevenir o aquecimento global. A encíclica tomará uma posição sobre a ciência do aquecimento global, afirmando que é real e tem causas humanas. Referir-se-á à ecologia integral, ou seja, um chamado ao respeito da gramática divina tanto no planeta como em temas como a família. E pedirá aos católicos uma mudança de comportamento, como membros de paróquias, como cidadãos de países e como habitantes do planeta.
Que papel tiveram economistas como Jeffrey Sachs na elaboração do texto?
O Pontifício Conselho Justiça e Paz, que fez o primeiro rascunho, consultou muitos especialistas, além de teólogos como Leonardo Boff que se especializaram no tema. Tomou muito cuidado para se certificar de que a ciência sobre a qual se baseia a encíclica reflita um consenso. A Congregação para a Doutrina da Fé também revisou o texto. Para o rascunho final, o Papa encarregou o Arcebispo Manuel ‘Tucho’ Fernández, reitor da Universidade Católica Argentina, um velho colaborador desde os tempos da reunião do CELAM, em Aparecida, em 2007.
Que efeito a encíclica pode ter, em especial nos Estados Unidos, onde há um setor importante que ainda duvida do fator humano na mudança climática?
Não há dúvida de que um setor da opinião pública dos Estados Unidos recusará a encíclica, porque não quer que se questione o modelo norte-americano de crescimento econômico, e dirão que a encíclica é escrava de teorias desacreditadas. Há católicos que já estão dizendo isso, que devemos ler com respeito o que o Papa tem para nos dizer, mas não é necessário ‘obedecer’ ao que não é propriamente doutrinário. Mas creio que a maioria dos norte-americanos, católicos e não católicos, vai prestar muita atenção. Creio que a encíclica terá um impacto muito grande, em parte pela popularidade e a credibilidade do Papa, e em parte porque vai dizer o que todos sabemos: que o meio ambiente é uma questão moral.
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“Creio que a próxima encíclica terá um impacto muito grande”. Entrevista com Austen Ivereigh - Instituto Humanitas Unisinos - IHU