19 Mai 2015
“Travestis me dão nojo.” “A homossexualidade masculina é uma perversão.” Essas afirmações, entre outras 15 com as quais os alunos da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) deveriam concordar ou não, foram base de uma pesquisa que investigou o preconceito contra a diversidade sexual e de gênero na instituição. O resultado: 87% dos alunos têm algum grau de preconceito. Publicado neste mês na revista científica Sexuality Research and Social Policy, o estudo do Instituto de Psicologia é o primeiro, em larga escala, que mapeia este tipo de postura em uma universidade brasileira.
A reportagem é de Luíza Martins, publicada por Zero Hora, 18-05-2015.
– A homofobia e a transfobia devem começar a ser combatidas “dentro de casa” – explica o autor principal do artigo, Ângelo Brandelli Costa, sobre a motivação para realizar a pesquisa.
Dos 8.184 alunos que preencheram o questionário de forma anônima e voluntária – 30% do total de matriculados na UFRGS –, apenas 12,17% apresentaram nível mínimo de preconceito. De acordo com Brandelli, qualquer grau acima disso é preocupante, uma vez que a escala utilizada na pesquisa avalia o preconceito explícito a partir de afirmativas de extrema (in)sensibilidade, como as destacadas no início desta reportagem.
O nível de preconceito variou de acordo com o curso e com o perfil do aluno: homens, heterossexuais, pessoas que declaram ter religião, acadêmicos das faculdades de ciências exatas e aqueles que vêm de cidades com menos de 100 mil habitantes responderam de forma mais intolerante aos itens propostos.
– Isso é inaceitável para uma universidade que foi eleita três vezes a melhor do país. Outro resultado bem surpreendente é que não há correlação entre o tempo de permanência na universidade e o nível de preconceito. Isso escancara que a instituição não está ajudando na formação cidadã desses alunos – avalia o doutorando em Psicologia, que estuda o preconceito contra orientações não heterossexuais no Brasil desde o mestrado, iniciado em 2010.
Debate institucional sobre a diversidade
Por meio de sua assessoria de imprensa, a UFRGS informou que faz ações para mitigar preconceitos, cumprindo seu papel na sociedade. Em dezembro, ressaltou, foi uma das primeiras universidades do país a criar a Política de Uso de Nome Social para Pessoas Travestis e Transexuais. Em agosto de 2013, na pós-graduação em Educação, formou-se a primeira mestre transexual da UFRGS. “São realizações que demonstram a vontade da universidade em promover a discussão sobre o problema”, diz o texto.
A UFRGS destacou ainda que mantém o Núcleo de Pesquisa em Antropologia do Corpo e da Saúde (Nupacs), do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, o Núcleo de Pesquisa em Sexualidade e Relações de Gênero (NUPSEX), do Instituto de Psicologia, e o Grupo de Estudos de Educação e Relações de Gênero (GEERGE), da Faculdade de Educação, que também promove o Cinidhebate – ciclo de cinema que aborda Direitos Humanos.
Além disso, há iniciativas da comunidade acadêmica que são incentivadas pela universidade, como a Semana da Diversidade Sexual e de Gênero, promovida pelos estudantes da Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação (Fabico).
Brandelli reconhece as iniciativas, como a garantia ao uso do nome social – quando o nome de registro civil não está de acordo com a identidade de gênero do aluno – nos registros acadêmicos. Existe também o grupo G8-Generalizando, vinculado ao Serviço de Assessoria Jurídica Universitária da UFRGS, que presta assistência judicial às vítimas de violência, de homofobia e de violências cotidianas, principalmente lésbicas, gays, bissexuais e trans.
Ainda assim, os pesquisadores afirmam que uma formação ampla em direitos humanos, que contemple todos os cursos (o estudo aponta que cerca de 68% dos alunos nunca tiveram qualquer aula sobre o tema), poderia reduzir os índices de preconceito. No Brasil, os dados são alarmantes: segundo levantamento realizado em todo o país pelo Grupo Gay da Bahia em 2014, ocorre um homicídio causado por homo ou transfobia a cada 28 horas.
– Não temos marco legal nem políticas de combate à discriminação motivada por identidade de gênero e orientação sexual no país. O Plano Nacional de Educação saiu sem nenhuma menção a essa questão, deixando o Brasil, durante toda a próxima década, sem diretrizes para esta temática – diz Brandelli.
Doutora em Educação e presidente da ONG Reprolatina, que incentiva a educação sexual no ensino em toda a América Latina, Margarita Diaz não se surpreendeu com os resultados da pesquisa do Instituto de Psicologia da UFRGS.
Segundo a educadora, tanto nas escolas quanto nas universidades, a temática sexual costuma ser abordada apenas do ponto de vista biológico.
– O papel de uma universidade não é apenas oferecer conhecimentos técnicos e cognitivos, mas formar seres humanos que convivam saudavelmente com a diversidade.
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Preconceito no campus - Instituto Humanitas Unisinos - IHU