04 Março 2015
Em uma cidade dos arredores de Turim uma menina de 13 anos foi estuprada durante meses por um grupo de coetâneos – nenhum dos quais com mais de 14 anos – e forçada ao silêncio, sob a ameaça de que fotos e vídeos da violência seriam enviadas aos pais. Quando a menina não aguentou mais e se rebelou, a ameaça foi implementada, mas a mãe da vítima deu início às investigações, e agora oito menores estão sendo investigados.
A reportagem é de Chiara Santomiero, publicada no sítio Aleteia, 02-03-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
O episódio foi relatado no dia 26 de fevereiro pelo blog do Centre for Child Protection (CCP), o centro para a prevenção dos abusos sexuais de menores e de pessoas vulneráveis situado dentro da Pontifícia Universidade Gregoriana.
O blog ressalta que "um dos aspectos mais inquietantes dessa notícia é que muitos sabiam e não falavam, e que a própria vítima tinha medo de avisar sobre o que estava acontecendo".
De fato: "Todos, no bairro, sabiam dessa história", contou um estudante da escola frequentada pela menina e pelos seus estupradores. "Parecia uma coisa normal – acrescentou –, não tínhamos entendido que eles tinham feito vídeos e a estavam chantageando" (jornal Avvenire, 21 de fevereiro).
O objetivo do Centre for Child Protection, que depois de uma fase experimental em Munique de três anos, recentemente, se transferiu para Roma, segundo o post sobre os acontecimentos de Turim, "criar no mundo uma rede capaz de sensibilizar sobre o tema dos abusos de menores", porque um mundo mais seguro é aquele em que se sabe "que não estamos sozinhos e que alguém está pronto para ajudar e pode entender".
Com esse objetivo, o centro oferece um programa de ensino a distância para agentes de pastoral, que ajude a captar os sinais de um possível abuso, as modalidades mais adequadas de reação, relatórios sobre as leis em vigor no país e na Igreja e, do lado da prevenção, relatos sobre o que se pode fazer para criar um ambiente seguro para os menores, ou seja, crianças, adolescentes e pessoas vulneráveis.
Um fenômeno de dimensões assustadoras
A sensibilização é cada vez mais necessária, porque, como observou o presidente do centro, o jesuíta Hans Zollner, entrevistado por Aleteia por ocasião da apresentação à imprensa dos novos objetivos de compromisso, "o problema do abuso sexual de menores é global".
"O governo indiano, há oito anos – continuou Zollner –, publicou uma estatística assustadora, que entre as páginas evidencia que 52% de toda a população menor de idade na Índia, de acordo com uma projeção do próprio governo, é abusada sexualmente. Cinquenta e dois por cento da população menor de idade daquele país significa cerca de 200 milhões de pessoas! Um dado que não é facilmente recebido, porque se trata de dimensões incríveis".
E mais: "Um representante do governo australiano, há alguns meses, me disse que, segundo as estatísticas da Royal Commission que investiga o assunto, na Austrália, 95% de todos os casos de abuso são cometidos não no âmbito das instituições, mas nas famílias".
Isso significa que, "quando falamos dos abusos cometidos na Igreja Católica, na protestante, nas associações esportivas ou nos grupos escoteiros, falamos apenas da ponta do iceberg. O problema é verdadeiramente de dimensões mundiais, e as estimativas mais baixas sobre o abuso de menores na sociedade em geral variam de um mínimo de 8% a 25%. E são as estimativas mais baixas".
Para Zollner, é necessário "falar sobre a formação das crianças nas escolas e nas famílias, e como ajudá-los a enfrentar o problema. A Igreja Católica certamente é um dos muitos campos para se trabalhar, mas também devemos educar os futuros responsáveis da Igreja – sacerdotes, seminaristas, religiosos, religiosas – para que possam monitorar não só a si mesmos, mas também ajudar a construir um mundo mais seguro para crianças, adolescentes e pessoas vulneráveis".
Pedofilia e culturas
O objetivo do programa de e-learning do centro é ajudar a enfrentar o problema, levando em conta as diferentes culturas e legislações. "Em alguns países da África ou da Ásia – explicou Zollner – prescreve-se a idade de 18 anos para poder contrair matrimônio, mas, de fato, essas regras não são respeitadas. Os jovens se casam aos 13, 14 ou 15 anos, como é normal para a sua cultura. Estamos diante de algo que nós, do Ocidente, devemos compreender melhor antes de julgar: sempre se trata de abuso? Como é percebido o abuso pela pessoa, como no caso do sacerdote, que goza de grande estima entre as famílias? Como pode ser conjugada a proteção dos menores com uma certa franqueza e liberdade no relacionamento normal com os jovens?
O arcebispo de Manila, o cardeal Tagle, descreve a cultura filipina como uma 'cultura do toque', em que não ter um contato físico significa ser frios, distantes, quase inimigos. Nesses casos, é preciso trabalhar muito sobre o conceito das fronteiras, dos limites: como podemos sensibilizar as pessoas sobre o fato de que nem todo toque é bom, especialmente quando há uma intenção de exploração dos menores por parte dos adultos? É preciso responder a essas perguntas para abordar a relação entre vítimas e abusadores, e para evitar que o fenômeno".
O papel dos meios de comunicação
O papel dos meios de comunicação na denúncia e na prevenção dos abusos pode ser de grande ajuda, mas deve ser exercido de modo responsável.
"Talvez nem todos assinem embaixo disso – afirmou Zollner –, mas os meios de comunicação têm um papel importante e continuam a tê-lo na criação de atenção para o tema e para a necessidade de fazer justiça às vítimas, fazendo também que esses fatos não se repitam mais. O que eu peço é que eles mantenham viva a atenção de modo constante, mesmo quando o assunto desaparece dos holofotes".
"Algumas vítimas de abuso – disse o padre jesuíta – disseram-me que, todas as vezes em que a informação é desencadeada, isso as leva a reviver o trauma do abuso, e a ferida se reabre." Quando os holofotes se apagam sobre as notícias, no entanto: "Quem se ocupa deles? Quem os ajuda a enfrentar a dor, a solidão, a raiva?".
Teologia e abusos
O Centre for Child Protection está envolvido na atualização do curso a distância para torná-lo mais apto às exigências práticas dos agentes de pastoral, "menos acadêmico, muito mais interativo, simples no uso das palavras e estimulante em nível de visualização".
Entre os outros programas, também novos congressos depois do simpósio de 2012 na Universidade Gregoriana "Rumo à cura e à renovação", que deu início às atividades do centro.
Um dos congressos será dedicado à relação entre teologia e abusos, um tema que, sublinhou o jesuíta, "estranhamente, nos últimos 30 anos, desde que se fala na Igreja desses terríveis fatos, foi ignorado".
"O que Deus diz – concluiu Zollner – diante dessa chaga do corpo da Igreja? Diante da dor das vítimas, da negligência de alguns bispos ou superiores provinciais de congregações religiosas e diante da desumanização dos próprios comportamentos a que chegam os abusadores? Será preciso refletir e falar sobre isso."
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Contra os abusos, a coragem de falar: o trabalho dos jesuítas - Instituto Humanitas Unisinos - IHU