02 Março 2015
Diante de quem está em dificuldade, usamos a vara da rigidez e das categorias estabelecidas ou o abraço da misericórdia? Essa foi a última pergunta deixada para a meditação dos presentes pelo padre Bruno Secondin, na tarde dessa quarta-feira, 25 de fevereiro, na conclusão do dia dos exercícios espirituais quaresmais, em Ariccia, para o papa e a Cúria Romana.
A reportagem é do jornal L'Osservatore Romano, 26-02-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
No âmbito da reflexão sobre o tema do "deixar-se surpreender por Deus", o carmelita deteve-se sobre a leitura do trecho bíblico de Elias e da viúva de Sarepta (1Reis 17, 2-24), aproximado àquele paralelo, em que Eliseu faz ressurgir o filho da sunamita (2Reis 4, 25-37).
Um contexto que levou o pregador a enfatizar um aspecto fundamental na vida de fé, ou seja, o fato de que "os pobres nos evangelizam".
A viúva pobre que, embora tendo apenas "um pouco de farinha numa vasilha e um pouco de azeite na jarra", hospeda Elias torna-se uma ocasião propícia de crescimento interior para o profeta.
Elias, salientou o padre Secondin, "era mal-humorado, agressivo". Os próprios padres da Igreja, ao comentar essas passagens bíblicas, sugerem que "Deus tenta endireitar Elias para que se amanse". E o profeta, assim, é enviado para Sarepta, onde recebe uma primeira lição da mulher: a pobreza e a morte enfrentadas com dignidade.
Inicialmente, o profeta, através do milagre do alimento que não acaba, se apresenta em vestes poderosas, taumatúrgicas. Mas depois a morte do filho da viúva o obriga a outra dimensão: sente-se impotente e só pode invocar a Deus, "confiar-se a Deus em nudez", reconhecer que só ele tem o poder "de gritar a sua dúvida e de implorar".
E é então, diante dos seus gestos ternos e da admissão da sua fraqueza, que a viúva reconhece uma outra face de Deus: o "Deus de compaixão", o "Deus de misericórdia", o "Deus que abraça, que carrega, na sua identidade, a nossa ferida".
É uma história que provoca perguntas para a história pessoal de cada um: "Somos capazes de encontrar os pobres para chegar a encontrar a verdade? Ou temos medo de perder a face?". Sabemos reconhecer e abraçar aqueles que têm "um 'bebê morto' no seu coração: violências, traumas de infância, divisões, horrores..."? A nossa palavra é aquela pedante do taumaturgo ou "a palavra que implora"? Diante de situações de dor, "mandamos na frente o canonista", usamos "a vara" ou nos estendemos "os braços para abraçar"?
Escolhas concretas, atitudes claras, como as sugeridas também pela primeira meditação da quinta-feira, 26, na qual o padre Secondin se deteve sobre o tema da justiça. Tema central, porque, destacou o pregador, "o compromisso com a justiça é parte integrante do nosso seguimento de Cristo, porque os pobres são os privilegiados do Evangelho: não é uma mania populista".
Outro episódio da vida de Elias narrado no primeiro livro dos Reis (21, 1-29) forneceu o impulso para a reflexão. O rei Acab quer comprar a vinha do humilde Nabot, mas o agricultor rejeita, porque não quer desperdiçar a herança recebida dos seus pais.
Então, a ímpia rainha Jezabel organiza uma assembleia ritual com os representantes do povo na qual, graças a duas falsas testemunhas, acusa Nabot de blasfêmia e o faz matar, permitindo, assim, que Acab obtenha o seu "brinquedo".
Elias, então, pronuncia a condenação divina contra Acab, que se arrepende, obtendo de Deus uma atenuação da pena.
Um texto longo, em que as psicologias dos vários personagens – Acab, o frustrado, Jezebel, a poderosa sem escrúpulos, Nabot, o piedoso, os representantes do povo privados de consciência e subjugados por dinâmicas de marca mafiosa – também podem revelar muitos aspectos das nossas vidas.
Um texto que ofereceu a oportunidade para que o pregador carmelita fizesse muitas provocações.
Quantas vezes, por exemplo, "elementos sagrados são usados como cobertura de procedimentos iníquos"? Verdadeiros "abismos de violência são abertos em nome de Deus", e "também entre nós, cristãos" se encontra "o sono da consciência".
Mas, observou o padre Secondin, "quanto deverão gritar os pobres e os oprimidos?". E, pensando nas violências que se cometem na África e no Oriente Médio, perguntou-se: "A consciência dos europeus não tem nada a se criticar?". O apelo que vem das Escrituras é forte: "Devemos estar do lado de todos os Nabots da terra, defender os direitos, acolher as vítimas, estimular as consciências, promover estruturas, porque a terra é Deus, é um dom para a vida de todos e não para os caprichos de alguns".
Mas a Escritura, disse o pregador, também propõe uma "pedagogia dos pequenos gestos". Isto é, é preciso "começar por nós mesmos", converter o próprio estilo de vida, rever o consumo ("quanto desperdício de alimentos..."), ter transparência no agir, fazer o próprio dever com honestidade, não exercer a autoridade como poder e como fonte de privilégios. E ainda: "Despedaçar a espiral do silêncio, os encobrimentos, os abusos".
O padre Secondin, assim, voltou a considerar dinâmicas e problemas de interesse planetário: diante de violências como as da poluição, da grilagem das terras férteis e das águas em detrimento dos povos locais, ou como as violências financeiras, nas quais, sem escrúpulos, com um simples "clique", fazem pessoas morrer, devemos recuperar a força do canto do Magnificat e "ter a coragem de denunciar". Porque "Deus não suporta os prepotentes".
Eis, então, a pergunta que concluiu a meditação: "Sabemos nos familiarizar publicamente com os humilhados, com os descartados pela violência, ou temos medo de perder a face para o Evangelho"?
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Exercícios espirituais da Cúria Romana: sem medo de perder a face - Instituto Humanitas Unisinos - IHU