24 Junho 2011
Poucas empresas no Rio Grande do Sul conhecem suas emissões, é o que diz Eduardo Baltar na entrevista que concedeu à IHU On-Line, por telefone. No entanto, ele ressalta que isso acontece porque falta incentivo do governo para que isso aconteça de forma efetiva por todas as empresas. "Existe também a questão regulatória que no Brasil ainda é muito superficial. Há uma política nacional de mudança climática, que foi aprovada em 2009, uma política gaúcha de mudança climática, aprovada em dezembro de 2010, mas são muito recentes. Isso também faz com que poucas empresas no estado conheçam suas emissões e trabalhem para diminuir seus impactos no meio ambiente", apontou.
Eduardo Baltar é diretor da Enerbio Consultoria, responsável por diversos projetos de créditos de carbono e estratégias empresariais de combate à mudança do clima. Criador do Programa Emissão Zero de Carbono, participou da COP-15 e da COP-16 pela delegação brasileira.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – Porque o número de empresas que não conhece o nível de suas emissões no RS é tão grande?
Eduardo Baltar – Os temas emissão de gases de efeito estufa e mudanças climáticas ainda estão entrando na pauta das empresas. Algumas grandes empresas já estão acompanhando discussões internacionais em torno desses assuntos, já se antecipando às regulações que devem vir. Com isso, inclusive, essas empresas se antecipam na demanda de mercado e acabam desenvolvendo ações de combate às mudanças do clima e codificando suas emissões de gases de efeito estufa.
De toda forma, este tema ainda é muito incipiente. É por isso que muitas empresas ainda não desenvolvem inventários de emissões e não conhecem suas próprias emissões. O próprio mercado consumidor ainda não demanda informações sobre a emissão destes gases pelas empresas. No momento em que este mercado e os consumidores estiverem mais conscientes as empresas vão buscar conhecer mais suas emissões de gases de efeito estufa.
Existe também a questão regulatória que no Brasil ainda é muito superficial. Há uma política nacional de mudança climática, que foi aprovada em 2009, uma política gaúcha de mudança climática, aprovada em dezembro de 2010, mas são muito recentes. Isso também faz com que poucas empresas no estado conheçam suas emissões e trabalhem para diminuir seus impactos no meio ambiente.
IHU On-Line – Qual é a média dessas emissões que hoje são contabilizadas?
Eduardo Baltar – A quantidade varia de empresa a empresa, de setor a setor, não tem como fazer uma média de emissões de gases de efeito estufa contabilizado. Por exemplo, uma empresa do setor elétrico vai ter um determinado nível de emissões baseado na sua matriz de geração de energia. Já uma indústria de polietileno vai ter em seu processo industrial um nível de emissões diferente, provavelmente maior. Um escritório tem um nível de emissões mais baixo, baseado no consumo de energia, na emissão de ar condicionado... Varia muito de setor para setor.
IHU On-Line – Quais são os setores que mais contabilizam o seu impacto?
Eduardo Baltar – Setores de destaque são o de papel e celulose, energético e petroquímico. Estes três setores são os que mais têm empresas desenvolvendo inventários, o que demonstra que elas conhecem suas emissões.
IHU On-Line – E quais os setores que menos contabilizam?
Eduardo Baltar – Alguns setores ainda estão em fase inicial, ou seja, começaram há muito pouco tempo a procurar detalhar suas emissões. O setor de alojamento e alimentação ainda tem poucas empresas desenvolvendo inventários sobre emissões de gases de efeito estufa. O setor de indústria de transformação tem empresas construindo esses relatórios, mas, ao mesmo tempo, diante da sua representatividade, o número de empresas ainda é pequeno. O setor de logística, por exemplo, apesar de codificar a emissão veicular, é um setor que tem poucas empresas desenvolvendo seus inventários de emissões também.
IHU On-Line – O que há por trás dessa não contabilização?
Eduardo Baltar – Alguns fatores que fazem com que as empresas não contabilizem são:
- o fato do tema ser incipiente
- a demanda regulatória no Brasil praticamente não exige isto das empresas
- o consumidor ainda não está maduro o suficiente para requerer que as empresas divulguem estas informações e divulguem seus inventários de emissões.
IHU On-Line – O que pode ser feito a partir da quantificação desse impacto de emissões?
Eduardo Baltar – A quantificação é o passo inicial para a empresa desenvolver uma estratégia empresarial climática. A partir disso ela consegue identificar onde está o problema, onde pode reduzir e quais são os custos e as oportunidades financeiras que podem existir neste negócio, quais são as tecnologias que podem auxiliar a empresa em uma ação de redução de emissões.
O inventário é o ponto de partida para o desenvolvimento de ações. Vários tipos de ações podem ser realizadas: A ação da eficiência na logística dos produtos e das matérias-primas é uma atividade que proporciona a redução de emissão. Também existe a análise do produto, o reaproveitamento de fluente, a geração de energia renovável, a substituição de combustíveis fósseis no processo industrial. Todes esses planos podem e devem ser aplicados pelas empresas para diminuir seus impactos.
Além disso, existem ações tecnológicas e de mudança do processo de produção da empresa, a partir de ações gerenciais, como, por exemplo, colocar incentivos na remuneração variável de gestores e funcionários ligados à objetivos de redução de emissão de gases de efeito estufa, premiar sugestões de funcionários que tragam idéias de projetos que podem reduzir a emissão, adotar metas de redução de emissão dentro do próprio negócio. São várias ações que podem ser desenvolvidas para reduzir as emissões. O importante é fazer o inventário, conhecer a emissão e, então, desenvolver ações de redução de impacto.
IHU On-Line – No país, o setor logístico tem importante participação nas emissões de gases do efeito estufa. Como mudar isso?
Eduardo Baltar - Apesar do Brasil, no setor de transportes, ter um papel pioneiro com o uso de etanol – o que beneficia nossa matriz de transporte –, nós ainda temos muitos caminhões que utilizam diesel. Isso faz com que o setor logístico tenha um papel importante nas emissões. A redução de emissão passa pela mudança da matriz de logística do Brasil. A navegação marítima e a logística ferroviária são alternativas para se buscar a redução de emissão, mas isso precisa de investimentos em infraestrutura.
IHU On-Line – Como o governo pode influenciar nessa porcentagem de quem contabiliza e quem não contabiliza?
Eduardo Baltar – O governo pode influenciar de várias formas. Uma delas é fornecendo incentivos, premiando quem faz os inventários e aplicando multas às empresas que não produzem essa pesquisa. O governo tem que trabalhar para incentivar as ações de quantificação de emissões e de redução de emissão, buscando algum instrumento de divulgação das empresas que fazem seu inventário. Pode-se pensar em incentivos fiscais ou benefícios econômicos para projetos que reduzem ou quantifiquem emissões.
No entanto, antes disto, é importante buscar ações de conscientização junto à população e para que o número de empresas que desenvolvam inventários voluntariamente, sem a necessidade das regulações, aumente. Para efeito de redução de emissão, o papel do governo é fundamental na promoção de atrativos econômicos. A formação de um mercado de redução de emissão e o desenvolvimento de infraestrutura para que esta redução aconteça são necessários e é dever do governo promovê-los.
IHU On-Line – Em 2010, o governo federal lançou um plano para incentivar a redução de emissões de CO2 na agricultura. Como o senhor vê esse projeto?
Eduardo Baltar – Os planos elaborados nesse sentido são bem positivos. O da agricultura guia ações dos setores econômicos para a redução de gases de efeito estufa. Porém, este é o papel que o estado tem que exercer, ou seja, ele precisa dar o caminho para que os setores econômicos se adaptem à economia de baixo carbono.
Eu vejo com bons olhos o plano e acredito que ele vai ser replicado para outros setores econômicos, para que todos tenham limites de emissão de gases de efeito estufa, como existe na Europa.
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Da incipiência á negligência. A redução dos gases de efeito estufa pelas empresas. Entrevista especial com Eduardo Baltar - Instituto Humanitas Unisinos - IHU