15 Novembro 2010
Quatro anos depois da tragédia ambiental que abalou o Vale dos Sinos, mais de 10 mil peixes apareceram mortos no Rio dos Sinos esta semana, segundo informações do Comando Ambiental da Brigada Militar. Ainda sem resultados concretos das investigações sobre o que pode ter provocado esta nova mortandade, a IHU On-Line ouviu, por telefone, a opinião de Silvio Klein, que é presidente do Comitê da Bacia do Rio dos Sinos. Para ele, é importante pensar na evolução que se pode ter a partir disso tudo. “Talvez as análises não sejam conclusivas. É preciso pensar que, caso o produto causador de tudo isso não seja identificado, que caminhos temos pela frente. Temos a necessidade de criar ferramentas que possam monitorar mais permanentemente e mais proximamente os arroios. Hoje está visível que não podemos deixar que uma pessoa, uma entidade, uma empresa possa levar a toda essa insegurança que um acidente desses gera”. Na visão de Klein, “as empresas, sabendo que há um monitoramento, passam a ficar mais atentas, pois sabem que mais facilmente serão identificadas”. Desta forma, os municípios deveriam buscar ações de monitoramento dos arroios, que são os formadores do Rio. “São nos arroios que as coisas acontecem, pois são eles que passam por dentro das cidades”.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – O que está havendo com o Rio dos Sinos? Parecia que tudo ia bem e, quatro anos depois, estamos diante de uma nova crise...
Silvio Klein – Temos que ter clareza do que é diferente neste momento comparando ao episódio de 2006. A Secretaria do Meio Ambiente do Rio Grande do Sul emite frequentemente relatórios sobre a qualidade da água de todas as bacias. E lá está demonstrado que há diversos pontos críticos, inclusive o Arroio Portão, que estão melhores do que a situação em que estavam em 2006, o que não impediu este episódio trágico desta mortandade. Está melhor a situação porque já há ações sendo feitas pelos órgãos competentes para fiscalizar as empresas, além do surgimento de algumas obras envolvendo os esgotos, como é o caso de São Leopoldo, que já aumentou de 20% para 50% seu tratamento de esgoto. Porém, houve um momento de algum vazamento que gerou esta mortandade. Alguém, de forma irresponsável, fez um lançamento que ainda não se sabe qual foi, que não foi identificado, e provocou esse vazamento. Estamos em uma sociedade onde há inúmeras atividades, que podem ser de qualquer natureza e alguém pode ter aproveitado o momento da chuva para largar alguma substância, pensando que não iria ser percebido. Foi isso o que aconteceu neste momento e que faz com que busquemos criar novas ferramentas de gestão que possam avançar na inibição de que alguém, isoladamente, possa fazer uma ação que chegue nesse ponto agudo.
IHU On-Line – Já saiu o resultado da análise da água azul?
Silvio Klein – Não. Inclusive é preciso ressaltar que pode não ter sido a água azul que provocou tudo isso. Essa água azul já estava no Arroio e, consequentemente, no Rio antes desse momento da mortandade. Em segundo lugar, algumas dessas análises são mais complexas e os órgãos que as estão encaminhando ainda não emitiram resultados. Mas parece que algumas delas, que podem gerar resultados mais importantes, devem demorar alguns dias, talvez uma semana ainda.
IHU On-Line – Se essa água azul já estava lá antes da mortandade, do que se trata esse produto?
Silvio Klein – Não sabemos. Na verdade, sei que já foi identificado o lançamento da água azul, mas outros lançamentos podem ter levado a isso. Temos que ter cuidado de que essa água azul já era notícia nos jornais antes da mortandade. Coincidentemente, na sequência, houve a mortandade. Só que ainda não está absolutamente certo que o produto causador veio do Arroio Luiz Rau. Então, a água azul está sendo analisada e os peixes estão sendo analisados, para saber o que os levou à morte. Só que depois do peixe morto e o organismo já do jeito que estava, as análises não são tão imediatas. A dificuldade é de identificar o produto que levou a essa mortandade e daí associar se pode ter sido essa água azul e, se não foi, o que seria. O que eu gostaria de colocar é que precisamos pensar que evolução se pode ter a partir disso tudo. Talvez as análises não sejam conclusivas. É preciso pensar que, caso o produto causador de tudo isso não seja identificado, que caminhos temos pela frente. Temos a necessidade de criar ferramentas que possam monitorar mais permanentemente e mais proximamente os arroios. Hoje está visível que não podemos deixar que uma pessoa, uma entidade, uma empresa possa levar a toda essa insegurança que um acidente desses gera.
IHU On-Line – O senhor pode nos informar quais as empresas que estão envolvidas nessa nova mortandade?
Silvio Klein – Não. Não existe até o momento nenhuma empresa relacionada ou identificada como envolvida na mortandade. Existe uma investigação muito séria dos órgãos envolvidos, como a Fepam e as Secretarias do Meio Ambiente de dois municípios no mínimo (no caso, São Leopoldo e Novo Hamburgo), que estão desenvolvendo um trabalho de campo muito aprofundado, fazendo buscas bastante intensas para tentar ver que outras questões podem ter contribuído ou até serem autoras do episódio. Mas não existe nada, até o momento, de conclusivo. O trabalho de campo segue, na medida em que todas as empresas ou atividades que podem estar relacionadas não são descartadas.
IHU On-Line – Hoje o senhor participou de uma reunião sobre o fato. O que foi discutido sobre o problema?
Silvio Klein – Participei desta reunião para explicar à Fepam o que Novo Hamburgo está fazendo em termos de esgotamento sanitário. A reunião entre a Fepam e o secretário do meio ambiente foi no sentido de alinhar e coordenar ações, para não chegar os dois na mesma empresa e não perder esforços, mas somar informações que cada um tem e definir estratégias de ampliar e qualificar ainda mais esse processo.
IHU On-Line – E qual a situação da empresa Utresa hoje?
Silvio Klein – Temos informações de que, na outra oportunidade, de fato, a empresa tinha responsabilidade no lançamento de efluentes e sabemos que houve um investimento elevado de melhorias na situação das valas. Parece que hoje ela só trabalha com valas cobertas. E foi reconhecida pela Fepam que ela está dentro dos padrões de atendimento que deveria estar em 2006 e não estava. Então, aparentemente, segundo a Fepam, a empresa atingiu um outro estágio, que não o de lançamento direto de efluentes.
IHU On-Line – Quais as diferenças entre essa mortandade e a de 2006?
Silvio Klein – A de 2006 tinha a Utresa, que se soma a uma grande quantidade de contribuições de diversos tipos de empresas da região, num ponto altamente crítico do Rio, e não se viu que estava em condições piores a partir de dois arroios em especial, que eram o Arroio Portão e o Arroio Luiz Rau. Segundo os próprios relatórios da Secretaria do Meio Ambiente sobre a qualidade do Rio, os dois pontos piores eram esses dois. E de 2008 para cá passaram a melhorar muito. Isso porque a própria Fepam intensificou a fiscalização em empresas e algumas atividades, e, segundo, porque houve um aumento do tratamento de esgoto. Muitas empresas passaram a ter ações em termos de diminuição dos seus resíduos. Talvez hoje as mudanças sejam essas e sejam relativamente pequenas, mas o mais importante é saber que a cada dois anos teremos um acréscimo no tratamento de esgoto. Só que esse acidente não foi de esgoto doméstico. Ele foi provocado por um lançamento criminoso, de algum produto que não se sabe qual é. O Rio poderia estar com uma ótima qualidade e ter acontecido a mesma mortandade. No caso de 2006 o Rio estava mais estressado, num momento mais crítico.
IHU On-Line – Quais são os principais problemas na fiscalização das empresas que largam seus dejetos no Rio dos Sinos?
Silvio Klein – Não temos nenhum órgão fiscalizador permanente, que não consegue ter a informação de uma forma continuada. Ela é obtida por visitas de inspeção. Como são milhares de empresas na bacia, é difícil impedir que uma empresa eventualmente faça algum lançamento inadequado. O monitoramento que está sendo feito em 35 pontos do Arroio Portão depois da mortandade de 2006 mostra que houve uma melhora. Isso evidencia que as empresas, sabendo que há um monitoramento, passam a ficar mais atentas, pois sabem que mais facilmente serão identificadas. Esse aprendizado faz com que a gente sugira e proponha que os municípios busquem ações de monitoramento dos arroios, que são os formadores do Rio. São nos arroios que as coisas acontecem, pois são eles que passam por dentro das cidades. Por maior que sejam as estruturas da Fepam e das secretarias do meio ambiente elas nunca serão contínuas, mas por inspeção, que agora, no caso desse episódio, são intensificadas para tentar achar a empresa com lançamentos irregulares. Mas não se consegue fazer isso de forma permanente e diária. Então, o monitoramento dos arroios deve progredir.
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"O monitoramento dos arroios deve progredir". Entrevista especial com Silvio Klein - Instituto Humanitas Unisinos - IHU