16 Mai 2007
A nanotecnologia descobre que as propriedades de um determinado material, o ouro, por exemplo, podem mudar apenas com a variação de seu tamanho. Ao dividir uma partícula de ouro em partes muito pequenas, podem variar sua cor e sua capacidade catalítica, afirma Pablo Arnal, químico e pesquisador do Instituto Max Planck, da Alemanha, em artigo para Página/12, 12-5-2007. A tradução é do Cepat.
A palavra "nanotecnologia" é ouvida cada vez mais freqüentemente. Ao escutar esta palavra, de modo geral, imaginamos algo distante de nossas vidas. No melhor dos casos, a lembrança agradável de algum filme futurista ou de algum livro de ficção científica presente em algum rincão de nossa memória. No entanto, esta sensação contrasta com o fato de que vivemos numa sociedade moldada, ao menos em parte, pelos frutos da nanotecnologia.
Ao observar a palavra, vemos o prefixo "nano" na frente de uma palavra que nos é um pouco mais familiar, e nos perguntamos como esse prefixo restringe o significado da palavra tecnologia. Uma resposta simples, mas útil, é que o prefixo "nano" assinala aquelas tecnologias onde intervêm porções de matéria de tamanho muito pequeno. Tão pequenas que seus contornos seriam impossíveis de serem vistos com os nossos olhos, nem sequer com o microscópio óptico mais potente que se possa construir. Até aqui nos movemos no terreno das definições. Mudemos o rumo para tentar entender melhor de que estamos falando.
Mais do que aprofundar em definições, ganharemos claridade perguntando-nos porquê interessa trabalhar com porções muito pequenas de matéria. A resposta é simples: em muitos casos, as propriedades de um material podem mudar apenas com a variação de seu tamanho. Em outras palavras, uma substância com uma composição química definida pode variar suas propriedades, quando se reduz suficientemente seu tamanho. Esta afirmação, que atenta contra o senso comum, a entenderemos com um exemplo que se refere a um material conhecido: o ouro.
O ouro é o material com o qual se prepara a maioria dos anéis de casamento. A única conseqüência que poderia advir do fato de cortar um destes anéis em dois, três ou dez porções é a ira compreensível do outro membro do casal, mas as propriedades do metal como tal permanecem invariáveis. Também não variariam se o cortássemos em 40.000.000 de partes iguais, uma para cada habitante da Argentina. Nem sequer conseguiríamos um tamanho suficientemente pequeno se o repartíssemos de maneira eqüitativa entre todas as pessoas que vivem no mundo (5.000.000.000). Se bem que o número de partes em que o anel teria que ser dividido para observar uma mudança nas propriedades do ouro é enorme, esse número é conhecido com bastante exatidão: um anel feito com um grão de ouro teria que ser dividido em ao menos 10.000.000.000.000.000 de partes iguais.
Para além do qual fosse o número de porções em que deveríamos que dividir o anel e do procedimento que se usasse para fazê-lo, dissemos que quando esse número é suficientemente grande suas propriedades mudam. Que propriedades? A cor, por exemplo: o ouro pode passar do amarelo ao vermelho ou azul. A cor vermelha dos vitrais de muitas igrejas medievais européias é um dos muitos exemplos. Nestes vidros, porções muito pequenas de ouro que se encontram mescladas em seu interior são responsáveis pela cor vermelho rubi característico.
A cor é uma das muitas propriedades que o ouro possui. Outra propriedade interessante, que nos leva de volta à importância atual da nanotecnologia, é a propriedade catalítica deste metal, isto é, a capacidade que ele tem de auxiliar para que certas substâncias químicas se transformem em outras. Um dos grandes problemas que se enfrenta no uso de porções muito pequenas de metais como o ouro é a tendência que elas apresentam de se reunir para formar porções maiores. Mas as grandes porções não servem como catalisador, só as pequenas. O que fazer?
Uma solução que propusemos recentemente consiste em fechar cada uma das pequenas porções de ouro em "jaulas" esféricas com buracos. Os buracos na jaula são suficientemente pequenos para evitar que a partícula escape, mas suficientemente grandes para que as substâncias que se deseja transformar entrem e as substâncias transformadas saiam. Esta idéia aprece nova, mas não é. Na vida cotidiana encontraremos exemplos similares. Imaginemos um leão em sua jaula no zoológico: as barras de ferro estão suficientemente próximas para evitar que o animal fuja, mas suficientemente separadas para que entre o oxigênio que deve respirar e saia o dióxido de carbono que exala. Ao manter cada uma das porções do ouro encerrada na jaula esférica se evita a formação de porções maiores e assim se consegue aproveitar a propriedade catalítica do metal nobre. Este mesmo conceito poderia se estender a outros materiais distintos do ouro, cujo uso prático está dificultado ou impedido pela tendência do metal em incrementar o tamanho das porções quando estas são muito pequenas.
O encapsulamento de porções muito pequenas de metais em jaulas com tamanhos dezenas ou centenas de vezes menores que um dos tantos glóbulos vermelhos que percorrem o nosso corpo é um dos muitos desafios enfrentados por grupos de pesquisa científica. A informação obtida nos laboratórios cristaliza em forma de teoria (o conhecimento científico) que nos dão uma imagem do mundo em que vivemos. Este conhecimento é multifacetado.
Deixemos de lado por um instante os igualmente importantes aspectos filosóficos, morais e religiosos que este conhecimento traz, e enfoquemos a nossa atenção no que nos permite fazer com a matéria: nos permite estimar as propriedades da mesma. Desta maneira, o conhecimento orienta aqueles que trabalham nas diversas áreas da nanotecnologia na busca de novos materiais (alimentos, medicamentos, próteses, roupas etc.) que podem melhorar a nossa qualidade de vida.
Atualmente, nos campos da nanotecnologia mundial joga-se um campeonato, cujos resultados teriam que importar a todos em nosso país. Na Argentina, a nanotecnologia sai a campo com arquibancadas praticamente vazias. As equipes locais têm orçamentos tão limitados, que às vezes até os treinos mais elementares ficam prejudicados. Manter-se em forma para as grandes competições exige, em muitos casos, realizar esforços sobre-humanos. Há muitos jogadores que já trabalham aqui, há muitos jogadores que estão voltando do exterior e outros que desejariam fazê-lo. As equipes que eles formam e os resultados dos jogos que disputam deveriam importar a todos.
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Os "mistérios" da nanotecnologia - Instituto Humanitas Unisinos - IHU