28 Julho 2016
Às vésperas dos Jogos, o Rio vive no terror do Terror. Mas este não é o aspecto mais negativo da situação.
“Apesar dos cuidados e da cooperação internacional entre agências de inteligência, o sentimento de medo apossou-se da maioria dos cariocas que estão, como revelam levantamentos, descontentes com a escolha de sua capital como sede dos Jogos. Para se ter uma ideia do pavor reinante, nesta semana, no bairro do Leblon, uma mala com roupas sujas e velhas deixada na calçada causou grande agitação, parou o trânsito e fez muitas pessoas deixarem às pressas as suas residências, por temor da explosão de uma bomba”, atesta Wálter Maierovitch, jurista e professor, foi desembargador no TJ-SP, em artigo publicado por CartaCapital, 28-07-2016.
Eis o artigo.
Nos Jogos Olímpicos de 1972, realizados em Munique, um comando terrorista pertencente ao grupo conhecido por Setembro Negro, ingressou na Vila Olímpica, sequestrou atletas judeus e exigiu, para liberá-los, a imediata soltura de 200 palestinos presos em cárceres israelenses. Não houve tempo para refletir sobre a proposta de troca, a polícia alemã reagiu rapidamente e morreram 11 atletas israelenses, um policial germânico e cinco terroristas palestinos.
Com a aproximação dos Jogos Olímpicos, um clima de medo paira sobre a Cidade Maravilhosa. Não convém esquecer que o terrorismo ao tempo de Munique era outro: o atual é bem pior. Para começar, o Setembro Negro era uma organização laica, de ideologia socialista e inimigo único.
Hoje, o terrorismo preocupante é o de matriz religiosa fundamentalista wahabita, que se autoproclama Estado Islâmico do Iraque e do Levante e ficou internacionalmente conhecido pelos acrônimos EI ou Daesh. Seus inimigos são os que não professam a sua fé e impedem a formação de um califado voltado a purificar os infiéis: no Iraque e na Síria promove atentados para matar xiitas e sunitas não wahabitas.
O Estado Islâmico repete a comum atitude das organizações terroristas transnacionais, ou seja, privilegia ações simbólicas pela difusão planetária do medo. Como ressaltou Ayman al-Zawahiri, quando era o segundo na hierarquia alqaedista, em certos lugares e ocasiões o ataque confere mídia espontânea. A propósito de ataques seletivos e simbólicos, a Al-Qaeda selecionou as Torres Gêmeas de Nova York e o Pentágono, enquanto o Estado Islâmico, na sua última ação, em 14 de julho, voltou a atacar a França, em Nice, quando do aniversário da Tomada da Bastilha, em 1789.
Os especialistas europeus na matéria alertam que no Ocidente as células do terror, para se implantar e desenvolver, ou, por vezes, permanecer dormentes à espera de ocasião propícia, necessitam infiltrar-se e esconder-se em comunidades ou guetos formados por imigrantes de mesma origem.
Em comunidades islâmicas da Bélgica formou-se a célula terrorista ligada ao EI que, em 2015, se deslocou para atacar em Paris e Saint Denis. Da sul-americana Tríplice Fronteira, em 1992 e 1994, e a aproveitar a presença da numerosa comunidade árabe, partiu o grupo terrorista responsável pelos ataques em Buenos Aires à embaixada de Israel e da associação judaica de assistência Amia.
No Rio não existe uma comunidade islâmica fanatizada e permeável à acomodação de uma célula do EI. Ao contrário, existe uma perfeita e salutar integração dos imigrantes e seus descendentes. Por isso as autoridades nacionais apontam como baixa a possibilidade de ações terroristas durante a Rio 2016. O problema a enfrentar diz respeito ao ciberterror.
Um dos legados nefastos de Osama bin Laden foi difundir pelas redes sociais a chamada do “faça você mesmo a sua parte na luta armada contra o Ocidente, independente do apoio da Al-Qaeda”. Assim, informados pelas redes sociais, proliferaram os “lobos solitários”. No Brasil, as autoridades de polícia e de inteligência descobriram uma página de propaganda do grupo Ansar al Khilafah, que seria de brasileiros com perfil filo-EI.
A propaganda via ciberterror incentiva ações escoteiras. Por outro lado, são baixas as chances de envio ao Rio de brasileiros treinados nos campos de adestramento do EI, se é que eles existem. De todo modo, apesar dos cuidados e da cooperação internacional entre agências de inteligência, o sentimento de medo apossou-se da maioria dos cariocas que estão, como revelam levantamentos, descontentes com a escolha de sua capital como sede dos Jogos. Para se ter uma ideia do pavor reinante, nesta semana, no bairro do Leblon, uma mala com roupas sujas e velhas deixada na calçada causou grande agitação, parou o trânsito e fez muitas pessoas deixarem às pressas as suas residências, por temor da explosão de uma bomba.
A penúria do estado e a situação trágica nos hospitais públicos cariocas contribuem para o clima de pessimismo, abatimento e medo. Não bastasse isso, a violência cresce e está sendo abandonado, por falta de recursos materiais e humanos, o certeiro projeto idealizado pelo secretário de Segurança Pública, José Mariano Beltrame. Na sua execução, foram reprimidas as organizações criminosas, houve recuperação de territórios governados pela bandidagem e, também, a retomada do controle social pelo Estado. No momento, tudo está indo água abaixo.
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Medo olímpico - Instituto Humanitas Unisinos - IHU