Por: Jonas | 08 Abril 2016
Com uma extensa equipe de contadores, advogados, investigadores e economistas pelo mundo, Tax Justice Network (TJN) é a principal ONG dedicada a investigar a utilização abusiva das guaridas fiscais. “Se um argentino abre uma sociedade nas Bahamas, o mais provável é que o faça para evadir o pagamento de impostos”, apontou o diretor da organização, John Christensen (foto), ao jornal Página/12. O economista que trabalhou na multinacional de serviços Deloitte e, durante onze anos, assessorou as autoridades de Jersey, uma pequena ilha localizada no Canal da Mancha, que faz parte da rede de paraísos fiscais britânicos, considerou que “qualquer político ou personalidade pública precisa ser transparente sobre seus assuntos, e Mauricio Macri deve explicar publicamente qual é sua participação na companhia radicada nas Bahamas e demonstrar que é legítima”.
Fonte: http://goo.gl/RXigvC |
A ilha de Jersey, onde nasceu Christensen, ocupa o posto 16 entre mais de 100 jurisdições ordenadas de acordo com o segredo financeiro que são oferecidas às multinacionais na busca por manobras de evasão fiscal e para indivíduos ricos ávidos em ocultar suas fortunas. As Bahamas, o arquipélago caribenho onde a família Macri radicou a empresa Fleg Trading Ltda., com a ajuda dos especialistas da Mossack Fonseca, estão no posto 25.
Diferente das binárias “listas negras”, o indicador elaborado por TJN oferece uma abordagem integral do mundo offshore utilizado pela família Macri. Analisa as regulamentações, leis e tratados das diferentes jurisdições para elaborar o índice de secretismo que, depois, é ponderado de acordo com o tamanho da guarida e sua relevância para os mercados financeiros globais. Com esses parâmetros, Suíça, Hong Kong, Estados Unidos, Singapura e Ilhas Cayman lideram o ranking.
A reportagem-entrevista é de Tomás Lukin, publicada por Página/12, 07-04-2016. A tradução é do Cepat.
Quais são os principais atrativos dessa guarida fiscal caribenha? – perguntou Página/12 a Christensen.
As Bahamas é uma das jurisdições com maior grau de secretismo no planeta. Essas ilhas obtiveram um resultado surpreendente pobre, de 79 em 100, no índice FSI que foi divulgado em novembro. O modelo de negócios das Bahamas está baseado na venda de secretismo financeiro e legal que facilita uma enorme variedade de crimes de colarinho branco. Não só canalizam manobras de evasão fiscal, como também outros tipos de operações vinculadas ao abuso de informação privilegiada no setor privado, malversação, corrupção e fraude.
Por que um argentino abriria uma sociedade em Bahamas, para realizar um investimento no Brasil?
Quase certamente para evadir o pagamento de impostos na Argentina e Brasil. É algo que os especialistas denominam dupla não-tributação. A maioria das famílias ricas e grandes empresas que criam estruturas offshore agem desse modo para evadir e se esquivar do pagamento de impostos sobre os lucros de capital, herança, rendimentos e outros tributos como selos e às propriedades. Gostam de utilizar nomes sofisticados como “administração patrimonial” (wealth management, em inglês), mas no fim das contas costuma se reduzir à evasão fiscal.
O presidente Mauricio Macri figura como diretor de uma companhia offshore nesse território britânico de ultramar, criada por Mossack Fonseca, que, segundo afirmou o governo argentino, manteve-se inutilizada durante dez anos.
Não acompanhei a história em detalhes, mas qualquer político ou personalidade pública precisa ser transparente sobre seus assuntos. E Macri deve explicar publicamente qual é sua participação com a companhia radicada nas Bahamas e demonstrar se é legítima.
É factível que uma empresa se mantenha aberta por uma década sem registrar nenhuma operação?
Na maioria dos casos, os diretores das empresas não as mantém inativas durante uma década, razão pela qual deveríamos receber com ceticismo essas afirmações. O mais provável é que uma companhia desse tipo seja utilizada para administrar ativos offshore por motivos de evasão fiscal.
Qual seria uma resposta apropriada para um chefe de Estado?
A transparência e a integridade. Utilizar companhias offshore secretas carece dessas duas qualidades.
Urbi et orbi
A empresa Mossack Fonseca é um ator relevante mundialmente e o vazamento de 11,5 milhões de documentos, revelados através do Consórcio Internacional de Jornalismo Investigativo, permite identificar algumas das extensas práticas abusivas mais difundidas. No entanto, a dimensão dos paraísos fiscais é muito maior. “Os fluxos financeiros ilícitos e a evasão de impostos que atingem os processos de desenvolvimento de muitos países no mundo são o resultado de uma enorme falha na arquitetura financeira global”, advertiu Christensen durante uma entrevista realizada com este jornal, em novembro. “Apesar de alguns avanços observados ao longo dos últimos anos, os paraísos fiscais continuam travando as mudanças necessárias para tornar públicos os registros de informação sobre os fideicomissos e companhias offshore. Nada disso seria possível sem a cumplicidade dos Estados Unidos e Inglaterra”, destacou, então, o diretor de TJN.
Os Panama Papers não são o primeiro vazamento de dados vinculados ao uso abusivo das guaridas fiscais. A lista de clientes do HSBC Private Bank de Genebra e os chamados LuxLeaks são dois casos recentes. Como espera que os diferentes governos e foros internacionais reajam?
O G-20 prometeu que promoverá maiores níveis de transparência e, especificamente, transparência na estrutura de propriedade das companhias offshore. Até o momento, os países membros não cumpriram completamente suas promessas. No entanto, à luz dos Panama Papers, não podem demorar mais.
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Argentina e os 'Panamá Papers'. “Macri deveria demonstrar que a empresa Fleg é legítima” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU