Por: Cesar Sanson | 02 Fevereiro 2016
“A partir de gabinetes refrigerados, parte da sociedade civil brasileira e mundial, especialmente vinculada a iniciativas empresariais, busca opinar sobre reformas do ensino sem sequer conhecer o chão das escolas, as demandas dos estudantes, as reais condições de trabalho dos professores, os desafios da gestão pública ou enfrentar – de fato – debates com parlamentares e membros do Poder Executivo. Fica aqui a lição do Prêmio Nobel da Paz: é preciso agir”. O comentário é de Daniel Cara em artigo publicado por Uol Educação, 28-01-2016.
Eis o artigo.
O Prêmio Nobel da Paz de 2014, Kailash Satyarthi, está em visita ao Brasil. Sua primeira atividade foi a Aula Pública organizada pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação, no dia 26 de janeiro, no Senac Lapa Scipião, em São Paulo .
A ideia desta atividade foi promover o encontro entre a luta pelo direito à educação no Brasil com os desafios dos direitos educacionais ao redor do mundo. Kailash é um dos idealizadores, fundador e principal ativista da coalizão mundial Campanha Global pela Educação, à qual é ligada a Campanha Nacional pelo Direito à Educação. Ambas foram fundadas em 1999.
Como membro dessa articulação mundial, o ativista indiano conhece e apoia as iniciativas da rede brasileira, como as bem-sucedidas lutas pelo Fundeb, a criação do Custo Aluno-Qualidade Inicial, a destinação das receitas do petróleo para a educação e a aprovação e implementação do Plano Nacional de Educação 2014-2024. Mas o laureado com o Prêmio Nobel da Paz não conhecia a história das ocupações em São Paulo.
A Campanha Nacional pelo Direito à Educação acertou ao promover o encontro entre Kailash Satyarthi e os estudantes da EE Fernão Dias Paes, uma das mais 200 unidades que foram ocupadas contra a tentativa fracassada de reorganização do ensino paulista.
Antes de ouvir os estudantes, Kailash já tinha dito que “a escravidão humana e o analfabetismo são dois lados da mesma moeda”, para demonstrar os tristes vínculos entre o trabalho escravo, especialmente o infantil, e a não realização do direito à educação.
A história de Kailash não é a da burocracia emergente na sociedade civil mundial – e também na brasileira. Ele organizou missões de resgate para libertar pessoas em situação de escravidão, mobilizou marchas mundiais contra o trabalho infantil, questionou o sistema de participação da Organização das Nações Unidas, visitou autoridades, fez greves de fome e pressionou governantes. Ninguém ganha o Prêmio Nobel da Paz sem sacrifícios em nome de uma causa. E embora seja um excelente orador, Kailash Satyarthi é antes de tudo um homem da boa ação política.
Muitos falam, opinam e escrevem sobre o direito à educação pelo Brasil e no mundo. Contudo, poucos conhecem as injustiças que se perpetuam pela inobservância dos direitos educacionais. E ainda há menos pessoas que lutam, de fato, pela realização desse direito.
A partir de gabinetes refrigerados, parte da sociedade civil brasileira e mundial, especialmente vinculada a iniciativas empresariais, busca opinar sobre reformas do ensino sem sequer conhecer o chão das escolas, as demandas dos estudantes, as reais condições de trabalho dos professores, os desafios da gestão pública ou enfrentar – de fato – debates com parlamentares e membros do Poder Executivo. Fica aqui a lição do Prêmio Nobel da Paz: é preciso agir.
Após os estudantes contarem sua experiência e o porquê de se mobilizarem contra a reorganização do ensino em São Paulo, Kailash sorriu. Para logo em seguida falar: “quando eu tinha 13 anos, fui preso pela polícia porque tentava ir contra [a entrada do idioma] o inglês no currículo escolar [indiano]. Fui preso e apanhei como vocês. Mas se pudesse, faria tudo de novo. Os jovens têm que ocupar não só as escolas, mas o mundo todo''.
O tempo passa e a consagração do direito humano à educação permanece sendo uma quimera. Para mudar essa realidade é preciso de mais trabalho e menos opiniões vazias. É preciso também dar voz aos estudantes, familiares e educadores. Em complementação à mensagem de Kailash Satyarthi, a educadora estadounidense Diane Ravitch vaticina que “a educação é importante demais para entregá-la às variações do mercado e às boas intenções de amadores.” E ela tem toda razão.
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A mensagem de Kailash Satyarthi – Prêmio Nobel da Paz de 2014 - Instituto Humanitas Unisinos - IHU