09 Dezembro 2015
"Não está claro quais tipos de grandes gestos misericordiosos Francisco está planejando para o Jubileu. Com certeza, há inúmeros católicos – tanto entre os fiéis batizados quanto entre os ministros ordenados – que aguardam uma decisão misericordiosa por parte do papa e que vá ajudá-los a reparar relacionamentos rompidos em suas comunidades de fé", escreve Robert Mickens, editor-chefe da revista Global Pulse, em artigo publicado por Commonweal, 02-12-2015. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
Eis o artigo.
Quando o Papa Francisco fala, as pessoas escutam. E abençoados são os que podem compreendê-lo sem a necessidade de uma tradução de terceiros. Isso ficou claro semana passada durante a sua visita de seis dias ao Quênia, Uganda e à República Centro-Africana.
Mas, antes de dar exemplos, é importante admitir que gerar boas traduções simultâneas pode ser um tanto desafiador, especialmente em se tratando deste papa. Os sacerdotes funcionários do Vaticano que trabalham com isso acertam praticamente todas as vezes. Mas nem sempre. E em certos casos, bastante raros, é de se perguntar se os problemas acontecem porque eles entendem equivocadamente as palavras originais de Francisco ou se eles estão, de fato, tentando (conscientemente ou não) tornar tais palavras mais “vaticanamente corretas”.
Um caso perfeito disso são as referências do papa a si mesmo quando compartilha uma anedota ou quando postula uma pergunta retórica
“Padre, pero…” começou ele dizendo em seu espanhol nativo a certa altura de seu discurso de improviso aos jovens em Nairóbi. Por algum motivo, o monsenhor que estava traduzindo para o inglês naquele dia sentiu a necessidade de verter assim: “Mas Santo Padre...”. Santo Padre? Francisco nunca refere a si mesmo como Santo Padre – a menos que esteja lendo uma fala que alguém escreveu para ele. Ele usa simplesmente “Padre”.
Infelizmente, o incidente acima mencionado não é um caso isolado. Ele faz parte de um padrão regular. Felizmente, a Secretaria de Estado do Vaticano tem sido mais cuidadosa em não “limpar” ou corrigir as observações livres do papa – ao mesmo tempo evitando o pecado horrível da transliteração – nas transcrições que ela fornece após os eventos.
Embora os escribas no Vaticano tenderam a fazer isto no começo do pontificado, desde então eles vêm sendo mais fiéis à rejeição, ao estilo Pacto das Catacumbas, do papa para com “nomes e títulos que expressam proeminência e poder”.
Isso, porém, não significa que nós temos de alijar o termo “Santo Padre”. Absolutamente não. Conforme ouvimos em várias orações eucarísticas usadas na missa, esta é, na verdade, a forma como nos dirigimos à primeira pessoa da abençoada trindade.
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O julgamento de cinco pessoas do chamado Vatileaks II, todas ligadas ao vazamento e publicação de documentos sigilosos do Vaticano, não chegou a uma resolução tão rapidamente quanto o Papa Francisco esperava.
“Eu gostaria que acabasse antes do início do Jubileu da Misericórdia [8 de dezembro]”, disse ele aos jornalistas na última segunda-feira (30 de nov.) enquanto voava da África de volta a Roma. Ele, todavia, reconheceu que isso não foi possível, visto que, pelo menos, um dos acusados substituiu os seus advogados e pediu mais tempo para preparar a defesa.
“Quero que todos os advogados tenham tempo de fazer a defesa”, disse Francisco. E quando lhe perguntaram o que pretendia fazer para deter futuros casos de corrupção no Vaticano, ele respondeu: “Bem, eu agradeço a Deus que não existe mais a Lucrécia Bórgia!”
Mas existe alguém, um ex-funcionário vaticano, que está causando alguns estragos. Francesca Immacolata Chaouqui é uma das três pessoas que estão sendo processadas por conspiração por “furtar” os documentos que passá-los aos dois jornalistas que o Vaticano levou, de forma bizarra, a julgamento.
O mais destacado do esquema conspiratório é o Mons. Lucio Vallejo Balda. Balda, que é espanhol, é um dos 4 mil clérigos de todo o mundo que pertencem à Sociedade Sacerdotal da Santa Cruz, mantida pelo Opus Dei.
Ele foi chamado a Roma em setembro de 2011 para ser o secretário-geral na Prefeitura dos Assuntos Econômicos da Santa Sé. E por causa deste cargo ele foi nomeado para uma comissão que o Papa Francisco instituiu em 2013 para assessorá-lo nas reformas financeiras vaticanas.
O papa contou aos jornalistas no avião que acredita que o Mons. Vallejo era um dos que recomendaram a Srta. Chaouqui para ocupar o cargo que ocupava na mesma comissão. Nos últimos dias, mais documentos vazados e declarações furiosas surgiram na internet, trazendo cenas chocantes desta relação entre eles.
Não está claro como os magistrados civis da Cidade do Estado do Vaticano irão proceder contra o sacerdote. Mas a publicação das acusações originais dá a entender que os leigos que presidem este tribunal civil podem estar um pouquinho infectados com o tipo de clericalismo que se pode detectar tanto em certos membros não ordenados da Igreja como naqueles que vestem colarinhos.
Entre as várias acusações, os magistrados vaticanos dizem que os dois jornalistas sob julgamento “solicitaram e exerceram pressão, sobretudo contra Vallejo Balda, no intuito de obter documentos e informações confidenciais”. Não há o que falar. Será que estes homens apontaram uma arma para a cabeça do monsenhor? Será que eles o ameaçaram com chantagem, caso ele não lhes passasse as informações? Eles bem poderiam ter dito: “Este sacerdote era um menino travesso, mas estes jornalistas coniventes o levaram a fazer o que ele fez”. A inferência depois destas acusações escritas é que, diferentemente de Vallejo, Chaouqui participou voluntariamente – tal como a sua ancestral o fez no Jardim do Éden.
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Doze grandes gestos para demonstrar a misericórdia de Deus. É isso o que o Papa Francisco está planejando para o Ano Jubilar, que ele pré-lançou na segunda-feira passada quando abriu a Porta Santa da catedral de Bangui, na República Centro-Africana.
“Haverá muitos gestos, mas uma sexta-feira de cada mês farei um gesto diferente”, declarou ele em uma breve entrevista publicada quarta-feira (2 de dez.) na Credere, revista semanal oficial do jubileu em italiano.
O papa irá oficialmente iniciar o Ano Santo da Misericórdia na próxima terça-feira quando, da mesma forma como fez na África, ele abrirá a Santa Porta da Basílica de São Pedro.
O papa igualmente irá celebrar uma missa ao ar livre nesse mesmo dia, quando será a Festa da Imaculada Conceição e o quinquagésimo aniversário de encerramento do Concílio Vaticano II (1962-1965).
Não está claro quais tipos de grandes gestos misericordiosos Francisco está planejando para o Jubileu. Com certeza, há inúmeros católicos – tanto entre os fiéis batizados quanto entre os ministros ordenados – que aguardam uma decisão misericordiosa por parte do papa e que vá ajudá-los a reparar relacionamentos rompidos em suas comunidades de fé.
Aqui estão incluídas pessoas em “situações matrimoniais irregulares” (termo canônico que o papa odeia) e sacerdotes que abandonaram o ministério por diversos motivos. Será que Francisco está querendo encontrar uma maneira de aplicar a misericórdia divina de forma que se possa curar esta e outras situações?
Sem dúvida, qualquer tentativa de assim proceder encontrará oposição de alguns membros da Igreja. Estes incluem – como ele notou no final do Sínodo dos Bispos – os bispos com “corações fechados que, frequentemente, se escondem mesmo por detrás dos ensinamentos da Igreja ou das boas intenções para se sentar na cátedra de Moisés e julgar, às vezes com superioridade e superficialidade, os casos difíceis e as famílias ferida”.
Eles também incluem os “fundamentalistas” católicos, conforme o papa os descreveu em seu retorno da África. “O fundamentalismo é uma doença que existe em todas as religiões”, contou ele aos jornalistas.
“Nós católicos também alguns – alguns não, muitos –, que se julgam donos da verdade absoluta e andam por aí a sujar os outros com a calúnia, a difamação…”, completou.
Tomara que o Ano da Misericórdia preserve a todos nós de tornarmo-nos vítimas das tendências fundamentalistas. Conforme Francisco falou em sua entrevista à Credere: Cada um de nós deveria dizer: “Sou um infeliz, mas Deus me ama como sou; então, eu devo amar os outros do mesmo modo”.
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