Por: André | 05 Novembro 2015
Uma “publicação repleta de grande quantidade de informações diversas, em grande parte relacionadas com uma fase do trabalho que já foi superado” (e impulsionado, além disso, pelo próprio Papa Francisco no começo do Pontificado), com a finalidade de dar a impressão “de um reino permanente de confusão”, não faz justiça à reforma da cúria que está em andamento nem ao compromisso da Santa Sé para chegar à transparência.
A reportagem é de Iacopo Scaramuzzi e publicada por Vatican Insider, 04-11-2015. A tradução é de André Langer.
O porta-voz vaticano, Federico Lombardi, refletiu sobre os documentos vaticanos reservados e o vazamento de notícias (Vatileaks) que alimentaram dois livros que chegam às livrarias italianas por estes dias: Via Crucis, de Gianluigi Nuzzi, e Avareza, de Emiliano Fittipaldi. As investigações, disse Lombardi, continuam para averiguar as declarações dos dois indagados – mons. Lucio Ángel Vallejo Balda e Francesca Chaouqui –, mas, indicou Lombardi, no momento não há mais indagados. O Papa “segue em frente sereno”, apesar das dificuldades.
Após ter insistido em que os documentos foram parar nestas duas publicações mediante uma “atividade ilícita” e que vem sendo investigada pela Justiça vaticana, “agora nos interessa – afirmou Lombardi em sua reflexão publicada pela Rádio Vaticano – refletir sobre o conteúdo das divulgações. Pode-se dizer que em boa medida trata-se de informações já conhecidas, embora muitas vezes com menos amplitude e detalhes, mas, sobretudo, devemos notar que a documentação publicada está relacionada a um notável empenho de coleta de dados e de informações posto em marcha pelo próprio Santo Padre, para fazer um estudo e uma reflexão para a reforma e a melhoria da situação administrativa do Vaticano e da Santa Sé”.
“A COSEA (Comissão Referente ao Estudo e Orientação sobre a Organização das Estruturas Econômico-Administrativas da Santa Sé) – prossegue Lombardi –, de cujo arquivo provém boa parte das informações publicadas, foi, efetivamente, instituída pelo Papa no dia 18 de julho de 2013 com este objetivo, e depois foi dissolvida após cumprir seu papel. Não se trata, pois, de informações obtidas originalmente contra a vontade do Papa ou dos responsáveis das diferentes instituições, mas, de modo geral, de informações obtidas ou oferecidas com a colaboração destas mesmas instituições, para contribuir com o objetivo positivo comum. Naturalmente, uma grande quantidade de informações deste tipo deve ser estudada, compreendida e interpretada com cuidado, equilíbrio e atenção. Muitas vezes, são possíveis diferentes leituras partindo dos mesmos dados”.
Lombardi responde sobre uma série de questões contidas nos dois livros, desde o “buraco” do fundo de aposentadoria, sobre o qual, recordou, a Sala de Imprensa vaticana já ofereceu uma “leitura tranquilizadora”, até os bens da Igreja, “na realidade destinados a manter atividades de serviço de cuja gestão se ocupam a Santa Sé ou instituições a ela conexas”, passando pelo Óbulo de São Pedro, cujos recursos são, de acordo com os seus estatutos, “diferentes, inclusive conforme as situações, a critério do Santo Padre”.
Com o passar do tempo, declarou Lombardi, “estas temáticas voltam periodicamente, mas são sempre ocasião de curiosidade e de polêmica. Seria preciso ter seriedade para aprofundar as situações e os problemas específicos, para saber reconhecer tudo (muito mais do que se diz geralmente e sistematicamente ignorado pelo gênero de publicações de que estamos falando) o que está completamente justificado e que foi bem administrado (inclusive o pagamento dos impostos devidos), e distinguir onde se encontram os inconvenientes que devem ser corrigidos, obscuridades que devem ser esclarecidas, verdadeiras impropriedades ou ilegalidades que devem ser eliminadas. Justamente para este objetivo orienta-se o cansativo e complexo trabalho que começou pelo empenho do Papa com a constituição da COSEA, que já fez seu trabalho, e com as decisões e iniciativas que ainda devem ser desdobradas e postas em marcha (e que pelo menos em parte foram obtidos graças, justamente, às recomendações da própria COSEA ao final de seu trabalho).”
“A reorganização dos dicastérios econômicos, a nomeação do auditor-geral, o funcionamento regular das instituições competentes para a vigilância das atividades econômicas e financeiras, etc., são uma realidade objetiva e incontrovertível. Uma publicação repleta de grande quantidade de informações diferentes, em grande parte relacionadas a uma determinada fase do trabalho, já superada, sem a necessária possibilidade de um aprofundamento e avaliação objetiva chega ao resultado (infelizmente em boa parte buscado) de dar a impressão contrária, de um reino permanente de confusão, de não-transparência ou inclusive da busca de interesses particulares ou incorretos. A via da boa administração procede sem incertezas.”
“Naturalmente, isto não faz justiça de maneira alguma à coragem nem ao compromisso com que o Papa e seus colaboradores enfrentaram e continuam enfrentando o desafio de uma melhoria no uso dos bens temporais a serviço dos bens espirituais. Isto, ao contrário, é o que deveria ser mais apreciado e encorajado em um trabalho correto de informação para responder adequadamente às expectativas do público e às exigências da verdade. A via da boa administração, da retidão e da transparência segue e procede sem incertezas. Esta é, evidentemente, a vontade do Papa Francisco e não faltam aqueles que, no Vaticano, colaboram com plena lealdade e com todas as suas forças”.
Lombardi confirmou também uma notícia dada na terça-feira à tarde pela agência Reuteus, em relação ao perigo da lavagem de dinheiro e de “insider trading” na Apsa (Administração do Patrimônio da Sé Apostólica). “O Escritório do Promotor de Justiça no Tribunal do Estado da Cidade do Vaticano, após e elaboração de um relatório da Autoridade de Informação Financeira, no mês de fevereiro de 2015, deu andamento às investigações relacionadas a operações de compra-venda de títulos e de transações que podem ser relacionadas ao senhor Gianpietro Nattino. O mesmo escritório pediu a colaboração das Autoridades Financeiras italiana e suíça mediante cartas rogatórias enviadas por vias diplomáticas em 7 de agosto de 2015”.
Em relação às investigações no Vaticano, disse Lombardi respondendo aos jornalistas, seguem seu curso as averiguações para verificar as declarações dos dois indagados por vazamento de documentos reservados. O Papa “é uma pessoa serena, apesar das dificuldades”, continuou: “ele conhece muito bem a situação, sabe o que deve ser feito e como proceder”. “O fato de que as notícias não belas não devem ser fonte de alegria é tão óbvio que não merece um comunicado, mas não quer dizer que esteja desconsolado, continua muito sereno”. E é “absolutamente surreal”, declarou, pensar que o Vaticano vai decidir o que fazer, em relação à reforma econômica e administrativa, com base nos “livros de Nuzzi ou Fittipaldi”.
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Vaticano. Vatileaks superados pela reforma do Papa, compromisso com a transparência - Instituto Humanitas Unisinos - IHU