14 Outubro 2015
O Sínodo sobre a família começou há uma semana e, em alguns aspectos, parece docilmente intencionado a executar a partitura confeccionada nos meses de pré-tática pelos "lobistas das agendas". Percebem-se as manobras mais ou menos dissimuladas de quem entrou no Sínodo com a intenção de fazer dele uma disputa de política eclesiástica. Enquanto isso, muitos parecem concentrados em se posicionar em relação à rede dos mantras e dos códigos dialéticos oferecidos como dote através dos meios de comunicação ("É preciso conjugar misericórdia e verdade", "A doutrina não pode mudar", "É preciso curar as feridas", "Valorizemos o papel de mulher", "Os africanos vão rejeitar a colonização da ideologia de gênero").
A reportagem é do vaticanista italiano Gianni Valente, publicada no sítio Il Sismografo, 10-10-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Assim, ninguém pisca um olho quando, na Aula ou nos textos sinodais, esculpem-se afirmações inexoráveis e convicções peremptórias, que também parecem estar muito longe da dinâmica nova que entrou no mundo com o Evangelho, que a Igreja sugere com a sua pregação há 2.000 anos.
Um desses axiomas na mecânica típica das cláusulas contratuais encontra-se, por exemplo, na Relatio do cardeal Peter Erdö. Naquele texto, lido na abertura do Sínodo, o purpurado húngaro cita o parágrafo 41 do Instrumentum laboris sinodal, onde, justamente sobre os encontros evangélicos de Jesus com a samaritana e a adúltera, diz-se literalmente que, nesses episódios Jesus, "mediante uma atitude de amor pela pessoa pecadora, leva ao arrependimento e à conversão ('vai e não voltes a pecar!'), condição para o perdão".
Ora, no ponto em que se coloca a conversão como condição prévia do perdão, o Instrumentum laboris sinodal parece quase inverter o dinamismo próprio da experiência cristã, em que no mínimo é o perdão de Cristo que torna possível reconhecer realmente e até o fim o próprio pecado, sentir dor por causa dele, chorar por causa dele e converter-se. Esse é o evento inédito de salvação que São Paulo descreve na Carta aos Romanos: "Quando ainda éramos pecadores, Cristo, no momento oportuno, morreu pelos ímpios. Dificilmente se encontra alguém disposto a morrer em favor de um justo; talvez haja alguém que tenha coragem de morrer por um homem de bem. Mas Deus demonstra seu amor para conosco porque Cristo morreu por nós quando ainda éramos pecadores. Assim, tornados justos pelo sangue de Cristo, com maior razão seremos salvos da ira por meio dele. Se quando éramos inimigos fomos reconciliados com Deus por meio da morte do seu Filho, muito mais agora, já reconciliados, seremos salvos por sua vida" (Rm 5, 6-10).
O Evangelho de Lucas, quando conta o encontro de Jesus com a pecadora perdoada e as reações dos fariseus (Lc 7, 36-52), relata as palavras do Senhor, que perdoa os pecados dele não diante de uma declaração de prévia conversão, mas pelos gestos de amor que ela tivera em relação a ele, beijando-o, regando-lhe os pés com as suas lágrimas, espalhando óleo perfumado sobre ele: "Foram-lhe perdoados os seus muitos pecados", diz Jesus a Simão, o fariseu, "porque muito amou. Aquele a quem foi perdoado pouco, ama pouco". E, depois, acrescenta, dirigindo-se a ela: "Seus pecados estão perdoados". Então, os comensais começaram a dizer entre si: "Quem é esse homem que até perdoa pecados?". Mas ele disse à mulher: "Sua fé salvou você. Vá em paz!".
A mesma dinâmica contada por São Paulo e descrita por São Lucas se encontra em encontros e palavras que atravessam todo o Evangelho. É a dinâmica nova, incomparável aos modelos das doutrinas religiosas e dos códigos morais nascidos da humanidade ao longo da história, que a Igreja conta aos homens e às mulheres há 2.000 anos, no seu caminho na história.
Também dizia isso o então cardeal Joseph Ratzinger, quando o Jubileu do ano 2000 já tinha começado, para explicar o que levava a Igreja, naquele tempo jubilar, a pedir perdão pelas culpas do passado: "É a certeza do perdão que permite a franqueza da confissão. Se não há perdão, o que resta? Até mesmo o pecado não tem mais uma explicação e talvez podemos encontrar refúgio na psicanálise para restaurar paz à nossa alma abatida. Parece-me, ao contrário, que só o perdão, o fato do perdão, permite a franqueza de reconhecer o pecado".
É o perdão saboreado ou ao menos pressentido como promessa nas nossas vidas que faz florescer também o dom gratuito da dor pelos pecados e, portanto, da conversão. Que, na experiência cristã, também é sempre uma graça a ser acolhida com alegria e gratidão, e não o efeito de um esforço próprio de coerência com uma disciplina, ou – pior – de autopurificação, como deveria experimentar qualquer um que se aproxima do confessionário. A fonte da conversão é o gesto gratuito do Senhor nas nossas vidas, e não um suposto e ancestral "senso do pecado", do qual seria preciso reativar a todo o custo o mecanismo culpabilizante, no mundo confuso e empapado em que nos encontramos.
Na experiência cristã, a própria percepção dos próprios pecados se desperta perante o amor gratuito de Cristo, quando nos damos conta de que O traímos, e não como um senso de falta de sintonia em relação a alguma concepção antropológica qualquer ou a um código moral qualquer. Como aconteceu a Pedro, que chorou lágrimas de purificação só quando se cruzou com o olhar misericordioso de Jesus, no pátio da casa do sumo sacerdote.
No Sínodo também, a única chance para relativizar as operações dos conventículos organizados e a coleção de afirmações e posicionamentos abstratos, é olhar com um olhar cristão elementar para as dinâmicas do agir moral que configuram a vida familiar. Tal olhar sempre reconheceu que, na condição histórica concreta, marcada pelo pecado original, todos os homens são feridos in naturalibus, nas próprias faculdades naturais. E, portanto, em longo prazo e na vivência concreta, com todos os seus condicionamentos, também pode se ofuscar – e, de fato, se ofusca – o reconhecimento daquilo que seria naturalmente evidente.
Tal olhar, realista e cheio de esperança nos dons da graça, ajudaria a enfrentar de forma diferente também a lista das "questões quentes", começando pela admissão aos sacramentos dos divorciados recasados. E limparia o campo também do simulacro ideológico da "família católica perfeita", comprazida com a própria robustez alimentada a doses de teologia do matrimônio, a se consumir no fronte das "guerras culturais" antirrelativistas. Um simulacro evocado por aqueles que mostram intolerância pela imagem de "Igreja hospital de campanha", que se inclina para "tratar as feridas", e, ao contrário, diz que é preciso pensar nos sãos, não apenas nos doentes.
Pois bem: um olhar cristão para a vocação e para a missão da família, em vez de dividir o mundo entre "sãos e doentes", poderia valorizar a experiência cotidiana na qual nós, mortais, não somos capazes jamais de manifestar plenamente a fidelidade de Deus, que é fiel mesmo que o povo seja sempre infiel. Um olhar cristão poderia valorizar a experiência de tantos casamentos "sãos" e "bem-sucedidos", nos quais se toca com a mão, todos os dias, que a fidelidade por toda a vida, de fato, é impossível sem a ajuda da graça de Deus. E, quando isso acontece, só podemos agradecer ao Senhor de joelhos, chorando de alegria, por um grande dom (per-dono) que não merecemos.
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E se Jesus entrasse no Sínodo? - Instituto Humanitas Unisinos - IHU