18 Mai 2015
A recusa da Cátedra “Michel Foucault e a filosofia do presente” na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) "contradiz a deontologia universitaria assim como seu fundamento. A Universidade seria sua primeira vítima. Para além dos professores, estudantes e pesquisadores, é a opinião pública brasileira que com isso se sente afetada. Fomos testemunhas de seus protestos", afirma a petição internacaional "Sim à Cátedra “Michel Foucault e a filosofia do presente” na PUC-SP", publicada em várias línguas.
A petição lembra que "em Paris, quando os arquivos Foucault corriam o risco de serem enviados ao exterior, os dominicanos da Biblioteca du Saulchoir acolheram tais arquivos, permitindo que eles permanecessem na França, no local em que Foucault tinha o hábito de trabalhar por horas a fio. Essa biblioteca, herdeira da tradição católica a mais incontestável e não menos aberta a todos os intelectuais parisienses ou de passagem por Paris, acolhe regularmente apresentações e discussões de livros".
Eis a petição
O Cardeal de São Paulo, D. Odilo Scherer, e os bispos de sua Arquidiocese, anunciaram recentemente que não autorizam a criação, prevista há quatro anos, da Cátedra “Michel Foucault e a filosofia do presente” na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Essa decisão surpreende profundamente todas e todos aqueles, provenientes de vários países, que desde o início sustentaram essa criação, mas igualmente todas e todos que, na mesma Universidade, trabalharam vigorosamente nesse sentido.
Por ocasião do 7. Colóquio Internacional Michel Foucault, em outubro de 2011, que reuniu na PUC-SP dezenas de especialistas na obra desse pensador e centenas de interessados, foi assinada uma carta de apoio a essa iniciativa. A lista dos signatários incluía membros do Collège International de Philosophie (Paris), da Université Paris VIII, da Université Bordeaux Montaigne, da Universidade Nova de Lisboa, da Universidade Complutense de Madrid, da École Normal Supérieure de Paris, da Universidad San Martin na Argentina, da Universidad de los Andes na Venezuela e da Universidad de Valparaiso no Chile. A iniciativa também teve o apoio ativo do Consulado Geral da França em São Paulo. No mesmo ano, a PUC-SP obteve uma cópia dos arquivos em áudio das aulas de Foucault, fornecidos pelo Collège de France, tornando-se assim a única instituição fora da França habilitada a lhes dar acesso público. Sessões de estudo, seminários, debates sobre livros foram organizados a seguir como trabalho preparatório para a criação da Cátedra, suscitando expectativas e um entusiasmo crescente.
A recusa emitida pelo Conselho Superior da Fundação São Paulo desautoriza as instâncias científicas, filosóficas e pedagógicas que aprovaram a iniciativa. A “liberdade acadêmica”, que está no fundamento da vida universitária, foi atropelada.Contudo, sabe-se que o interesse pela obra de Foucault em todo mundo vai bem além das crenças religiosas, e que numerosos pensadores católicos escreveram sobre ele e nele se inspiraram.
Assim, em Paris, quando os arquivos Foucault corriam o risco de serem enviados ao exterior, os dominicanos da Biblioteca du Saulchoir acolheram tais arquivos, permitindo que eles permanecessem na França, no local em que Foucault tinha o hábito de trabalhar por horas a fio. Essa biblioteca, herdeira da tradição católica a mais incontestável e não menos aberta a todos os intelectuais parisienses ou de passagem por Paris, acolhe regularmente apresentações e discussões de livros. Além disso, numerosas pesquisas atuais se debruçam sobre a contribuição de Foucault aos estudos sobre o primeiro cristianismo e seu enraizamento na cultura antiga, em especial o estoicismo. Eis aí uma lucidez histórica, complementar aos estudos do historiador anglo-saxão Peter Brown, da qual todos os estudantes e professores que trabalham sobre os primeiros séculos de nossa era tiraram proveito e continuarão a fazê-lo. Nota-se igualmente que a obra de Foucault, depois de As palavras e as coisas, foi fortemente inspirada por um princípio de compaixão e dedicada à governamentalidade, uma questão que transformaria a modalidade das relações humanas e sua conexão íntima com o Direito. São razões a mais para expressar nossa surpresa diante dessa decisão.
Essa Cátedra, que leva o nome de Michel Foucault, não é dedicada à leitura de seus escritos – que hoje já são parte da cultura clássica. Ela está voltada, sob o impulso não exclusivo de seus trabalhos, como o diz seu título, para uma livre análise, informação e debate sobre questões de filosofia e de vida civil contemporâneas. A recusa de uma tal Cátedra, aberta à atualidade, contradiz a deontologia universitaria assim como seu fundamento. A Universidade seria sua primeira vítima. Para além dos professores, estudantes e pesquisadores, é a opinião pública brasileira que com isso se sente afetada. Fomos testemunhas de seus protestos.
Entretanto, todos mantêm a esperança de que o Conselho de bispos renunciará em exercer essa forma de censura e reconsiderará sua recusa. A direção acadêmica da PUC-SP recorreu da decisão. Doravante, cabe à comunidade internacional mostrar que também ela apoia a criação da Cátedra “Michel Foucault e a filosofia do presente”. É o que já faziam os signatários da carta de apoio de outubro de 2011, que convidavam todas e todos que estão comprometidos com o livre exercício do pensamento a juntar-se a eles.
Nota de IHU On-Line: Para assinar a petição, clique aqui.
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Sim à Cátedra “Michel Foucault e a filosofia do presente” na PUC-SP - Instituto Humanitas Unisinos - IHU